sexta-feira, 20 de junho de 2025

Um mundo com mais guerras e Trump - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Tempos são de mais nacionalismo econômico, rearmamento e potências desembestadas

Guerra no Oriente Médio suscita discussões estereotipadas a respeito do preço do petróleo, além de especulações sobre a "escalada do conflito", hipótese debatida, no entanto, sob a perspectiva do impacto econômico. É fácil perceber que uma carestia grande e persistente de combustíveis causa dano econômico imediato.

É mais difícil discutir esta situação mundial em que há muito menos meios de contenção do risco de novas guerras muito perigosas —e logo. Torna-se frequente a menção ao uso de armamento nuclear, como voltou a fazer a Rússia, a respeito das consequências de um ataque americano contra o Irã. Trump agrava um estado de coisas degradado faz década e meia.

Pelo menos no núcleo ideológico ou na propaganda, o trumpismo e o MAGA seriam "isolacionistas". Isto é, a favor do corte do financiamento militar de aliados, enxugamento de bases militares no exterior e indiferença a guerras que não envolvam o interesse direto dos EUA.

O "isolacionismo", porém, não é empecilho para novos tipos de intervenções americanas (a anexação da Groenlândia apenas parece piada).

Isto posto, em menos de uma semana de guerra, Trump passou a insinuar que poderia atacar o Irã e matar o dito "líder supremo", Ali Khamenei. Nesta quinta, disse que pensaria melhor no assunto.

Boa parte do trumpismo continua a se opor a um ataque. Segundo pesquisa YouGov/Economist, 60% dos americanos e 53% dos republicanos também.

Um conflito descontrolado pode colocar (mais) areia na economia americana e na popularidade presidencial. São esses os riscos ponderados por Trump? De fora, vemos apenas o "reality show" a serviço do projeto de tirania e nenhuma estratégia de estabilização política do mundo —ao contrário.

O que sabemos faz mais tempo é que os limites do jogo de poder internacional se esfarelaram. Trump espalha essa farofa de maneira mais assustadora.

O conflito sino-americano intensificou o uso de armas econômicas na política: nacionalismo e política industrial nos EUA, restrições a exportações e a investimentos na China e outras sanções, o que não é novo, mas foi escancarado sob Trump. A China ataca e contra-ataca nos mesmos termos. Mais: nos comunicados em que relata negociações comerciais com os EUA, manda que não se metam em Taiwan.

A epidemia havia suscitado reações autárquicas (segurança de abastecimento e produção de bens ditos essenciais ou estratégicos). O ataque da Rússia contra Ucrânia reforçou a preocupação com segurança energética, mas não só (vide o medo brasileiro com o risco de ficar sem fertilizantes).

A Europa começa a se rearmar. O confisco das reservas russas pelo dito Ocidente (entre outras sanções) colocou mais barbas de molho. Para dar um exemplo rápido, a China passou a diminuir as reservas que mantém nos EUA.

Trump arruinou o sistema de regulação comercial mundial, que já vinha sendo detonado desde Barack Obama. Ameaça países recalcitrantes de boicotes econômicos e militares.

O salve-se quem puder na economia tem sido radicalizado (nunca deixou de ser assim). A ideia de ter mais autonomia militar ou de se juntar a um bloco bem armado é assunto forte outra vez. O rearmamento agrava problemas fiscais e, pois, prejudica crescimento e políticas sociais.

Dizer que as instituições multilaterais foram à breca é pouco. Não há concerto de países poderosos, acordo para colocar ordem no mundo, nem segundo os interesses deles.

 

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