Defensores da manutenção do euro vão poder construir um discurso equilibrando austeridade e crescimento
E os mercados voltaram a empurrar a Grécia e a Europa para o precipício da ruptura financeira. Para muitos investidores e analistas, isso já aconteceu e o enterro final tem data marcada: as eleições parlamentares na Grécia em junho.
Depois de alguns meses de tranquilidade, comprada à custa de € 1 trilhão emprestados pelo Banco Central Europeu, a especulação voltou a dominar os mercados pelo mundo afora. O Brasil não foi exceção, e o índice Bovespa, em dólares, caiu mais de 30% nas últimas semanas.
Os investidores não dão mais a menor importância para dados macroeconômicos favoráveis que continuam a ser divulgados em alguns países importantes e poucos se emocionam com resultados positivos divulgados por empresas nas Bolsas.
A explicação para tal comportamento é simples: segundo os mercados, o capitalismo não tem futuro, e o que nos espera é uma depressão econômica do tipo da que ocorreu na década dos anos 30 do século passado.
Poucos investidores têm ainda coragem de olhar para a frente com otimismo e, aproveitando os preços de hoje, compor uma cesta de ações de qualidade e que garanta um retorno elevado à frente.
Nem mesmo os juros reais negativos nas aplicações mais seguras -que, em passado recente, estimularam o investimento em ações- funcionam como antídoto ao pessimismo deletério que tomou conta de todos. Um dos poucos investidores que têm confrontado os pessimistas é o octogenário e carismático Warren Buffett.
Um dos principais acionistas de uma empresa de seguros e investimentos americana, além de ser seu comandante em chefe, Buffett acaba de informar à SEC que aumentou de forma significativa sua participação no capital da GM e da Viacon, uma importante empresa americana no setor de comunicações.
Aliás, Buffett ficou famoso por investir em momentos de pânico, quando a maioria dos investidores está vendendo seus investimentos. Não por outra razão, é um dos homens mais ricos do mundo.
Nos próximos meses, vamos saber quem está com a razão: Buffett ou os defensores do caos, como Nouriel Roubini, o economista das trevas, como é conhecido.
Sempre digo a meus interlocutores que estou velho demais para acreditar no colapso do sistema de economias de mercado, como é chamado o capitalismo nos dias de hoje. Acrescento sempre que aprendi -na minha convivência e leituras da história- que os chamados políticos adoram chegar perto do abismo, mas, uma vez lá, acabam por tomar medidas que evitem o pior. E ainda acredito que isso vá acontecer na Europa nos próximos meses.
Comecemos pela Grécia, onde a ambição pelo poder de um político do partido Nova Democracia mergulhou o país em uma eleição que não poderia ser realizada naquele momento. O resultado -previsto então há meses pelas pesquisas de opinião- foi um Parlamento dividido e o aparecimento de um demagogo de extrema esquerda, tão esperto quanto vazio. Ele é hoje considerado o virtual primeiro-ministro grego e o político que vai mergulhar a Grécia e a Europa no caos.
Mas as próximas eleições vão ser disputadas em outras condições. A mais importante delas é que os defensores da manutenção do euro vão poder construir um discurso diferente, equilibrando austeridade e crescimento.
A volta do pânico mexeu também com a chanceler alemã e abriu espaço importante para uma mudança no discurso oficial anterior e introduziu uma bem-vinda preocupação com o crescimento.
Nesse sentido, a vitória de Hollande na França foi uma bênção dos deuses gregos para todos, inclusive nós, brasileiros. Uma nova parceria entre esses dois países, que sempre representaram o eixo central do projeto da Europa unida, pode abrir finalmente um caminho mais auspicioso para se enfrentar as armadilhas estruturais criadas com a implementação errada do euro nos anos que se seguiram à queda do Muro de Berlim.
Espero sinceramente que isso aconteça e, se estiver certo, talvez o enterro do euro tenha de ser adiado mais uma vez...
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 69, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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