Por Juliano Basile e Maíra Magro
BRASÍLIA - Ao menos quatro dos onze ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) já se posicionaram publicamente contra o financiamento empresarial de campanhas políticas - e estão inclinados a votar dessa forma hoje, quando a Corte, comandada pelo ministro Joaquim Barbosa, começa a julgar a ação movida pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pedindo o fim de doação de empresas aos candidatos e partidos.
São o presidente e o vice do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), os ministros Marco Aurélio Mello e José Antonio Dias Toffoli, e os dois últimos presidentes daquela Corte, Cármen Lúcia Antunes Rocha e Ricardo Lewandowski. Todos já fizeram declarações públicas criticando o atual sistema de financiamento de campanhas.
Caso essa tendência prevaleça e o STF derrube as doações de empresas privadas para políticos, o tribunal deve entrar em crise com o Congresso. Os ministros da Corte teriam ainda que decidir se o fim das doações valeria já para as eleições de 2014 ou apenas a partir de 2016.
Uma saída para esse impasse já foi levada ao STF por integrantes da OAB. A solução seria o tribunal declarar que as doações de empresas são inconstitucionais, mas dar aos parlamentares um prazo de 24 meses para que eles possam regulamentar a questão. Com isso, o espaço para decidir sobre as contribuições de campanha não seria totalmente retirado dos parlamentares.
A OAB também pediu na ação que os ministros determinem ao Congresso a fixação de um limite para a contribuição de pessoas físicas. Hoje, a doação de pessoas físicas está limitada a 10% da renda. Para o presidente da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coelho, a regra permite que quem tem mais dinheiro influa mais no resultado das eleições. "A lei prevê uma participação censitária das pessoas. Quem tem mais renda participa mais. Isso contraria o princípio democrático básico pelo qual cada cidadão tem direito a um voto", afirmou.
Na ação enviada ao STF, a OAB não sugeriu um teto, mas, em seu projeto de reforma política, propõe um limite de R$ 700 para as doações eleitorais de pessoas físicas. Para o presidente da entidade, o julgamento que começa hoje pode deflagrar a aprovação de uma reforma política no Congresso. "O Brasil vive uma inércia em relação a esse tema. Um julgamento favorável pode quebrar essa inércia", disse.
De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), as doações na última campanha eleitoral, em 2012, ultrapassaram R$ 6 bilhões e foram feitas, em sua maioria, por empresas que costumam fazer contratos com órgãos públicos.
O setor de construção civil liderou a lista de doadores de 2012 com R$ 638,5 milhões em contribuições. Em seguida, está a indústria de transformação, com R$ 329,8 milhões, o comércio, com R$ 311,7 milhões, e os bancos, as empresas de seguros e as demais prestadoras de serviços financeiros, com R$ 109,1 milhões.
Apesar de as maiores doadoras de campanha espalharem as suas contribuições pelos mais diversos partidos políticos, o líder em contribuições é o PT. Primeira empresa na lista do TSE, a Construtora Andrade Gutierrez contribuiu com R$ 81,1 milhões divididos em 19 diretórios nacionais de diversos partidos, além de seis estaduais. A maior cota ficou com o PT: R$ 21,4 milhões. A segunda foi do PMDB, com R$ 15,8 milhões, e a terceira foi do PSDB, R$ 12,8 milhões. A única doação a candidato da construtora foi para o atual prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda (PSB), mas o valor é pífio: R$ 800.
A segunda empresa na lista é a Queiroz Galvão, com R$ 52,1 milhões, e ela também seguiu padrão semelhante ao da Andrade Gutierrez, com 13 doações a diretórios nacionais de diferentes partidos e o PT na liderança, com R$ 15,1 milhões do total.
A Construtora OAS é a terceira, com R$ 44 milhões, espalhados por diversos diretórios nacionais, estaduais e comitês financeiros partidários, entre os quais o PT é novamente o líder, com R$ 8,1 milhões. Além de doar aos diretórios, a OAS contribuiu com diversas candidaturas individuais e o mais beneficiado foi o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, com R$ 1 milhão. O candidato tucano em São Paulo, José Serra, aparece na lista da OAS com R$ 750 mil, depois de Nelson Pellegrino (PT), que foi derrotado em Salvador e obteve R$ 850 mil. A OAS também aparece na lista do TSE com outro CNPJ através do qual doou mais R$ 6,75 milhões. Na divisão desse montante, o PT novamente está na dianteira, com R$ 1,75 milhão em contribuições, seguido do Diretório de São Paulo do PSDB, com R$ 1,55 milhão.
A lista do TSE é feita através do CPF e do CNPJ dos doadores. Algumas empresas trabalham com mais de um CNPJ para efetuar as contribuições. Por CNPJ, a liderança na lista é dos partidos políticos através de contribuições que são chamadas na Justiça Eleitoral de "ocultas", pois permitem às legendas cobrir eventuais rombos nas contas de candidatos. O PT aparece em primeiro, com doações de R$ 214,9 milhões. A segunda maior doação foi do PMDB: R$ 121 milhões. A terceira é do PSDB e totaliza R$ 84,3 milhões. As doações dos partidos foram distribuídas para vários comitês e candidaturas locais. No caso do PT, a maior contribuição do montante de R$ 214,9 milhões foi dada para o Comitê Financeiro Único de São Paulo: R$ 28,6 milhões. A segunda foi para Patrus Ananias, o candidato derrotado à Prefeitura de Belo Horizonte, e equivale a R$ 12 milhões. A terceira foi para a campanha do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), e totalizou R$ 13,7 milhões.
Como os partidos também trabalham com mais de um CNPJ - usando um para o diretório nacional e outros para os comitês locais, as contribuições das legendas são ainda maiores dos que esses três valores iniciais do PT, do PMDB e do PSDB. Além de estar na primeira posição da lista, o PT também está na 16ª, onde, com outro CNPJ, aparece com doação de R$ 26,9 milhões. O PSDB, que está em terceiro com um CNPJ, também aparece em 10º com outro (doação de R$ 34,1 milhões). O PMDB, que está em segundo na lista, também surge em 18º, com contribuição de R$ 24,1 milhões.
A maior doação individual feita na campanha de 2012 é de uma possível "laranja". Segundo a lista feita pelo TSE, Debora Apparecida Medina doou R$ 12 milhões para Claudinei Cardoso, candidato do PCdoB, em Belford Roxo (RJ). O Valor localizou uma professora com esse nome naquela cidade, mas ela negou ser a autora da doação. "Com certeza, isso é um engano. Eu sou professora", afirmou. Questionada se teria sido usada como "laranja", ela se negou a responder, desligando o telefone.
Fonte: Valor Econômico
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