sábado, 27 de dezembro de 2014

Ministério medíocre - O Estado de S. Paulo / Editorial

Dilma Rousseff tem pelo menos três grandes desafios para enfrentar já no início de seu segundo mandato na Presidência da República: corrigir os rumos da economia para recolocar o País na direção do crescimento; administrar o maior escândalo de corrupção da história da República procurando minimizar consequências que poderão ser devastadoras para os partidos que a apoiam, especialmente o PT; e saciar, na medida do possível, o crescente apetite da chamada base aliada por espaço que signifique poder e seus benefícios, num aparelho governamental que já é muito maior do que seria necessário, mas ainda insuficiente para satisfazer a ambição dos pleiteantes.

Diante disso, é fácil de imaginar as dificuldades que a presidente reeleita tem enfrentado para montar o novo Ministério. Mas, pelo que se viu dos 17 titulares do futuro gabinete - serão 39 -, o resultado é medíocre. Desconsiderado o trio desde logo designado para Fazenda, Planejamento e Banco Central - que dependerá do nível de autonomia de que desfrutará para confirmar os prognósticos positivos que saudaram sua escalação -, as indicações até agora confirmadas revelam que Dilma só está sendo capaz - ou talvez não deseje outra coisa - de oferecer ao País uma equipe medíocre, para se dizer o mínimo.

A nova composição do núcleo político do governo parece indicar duas tendências. De um lado, tentar estabelecer uma relação mais estável e produtiva com um Congresso Nacional que foi uma fonte permanente de dissabores para Dilma no primeiro mandato. Mas é mais que sabido que esse tipo de conchavo apenas estimula o apetite fisiológico de políticos que não têm compromissos programáticos - a não ser tirar nacos da coisa pública.

A outra tendência parece ser a de diminuir a influência política do PT no Palácio do Planalto, especialmente da corrente majoritária do partido, a Construindo um novo Brasil (CNB), cuja liderança mais expressiva é o ex-presidente Lula.

No primeiro mandato de Dilma, Lula foi presença forte no governo. Influiu diretamente na nomeação dos ministros mais importantes, inclusive aqueles que foram atingidos pela "faxina" que Dilma tentou promover depois de um ano no exercício do poder. Como influiu também para, algum tempo depois, recompor o mesmo perfil de equipe, se não com os mesmos nomes, com representantes dos mesmos interesses político-partidários. E nos gabinetes fisicamente mais próximos da presidente Lula deixou dois homens de sua absoluta confiança: Gilberto Carvalho na Secretaria-Geral da Presidência e Antonio Palocci no comando da Casa Civil.

A Casa Civil está e vai continuar nas mãos de Aloizio Mercadante, que nunca privou da intimidade de Lula. E a Secretaria-Geral da Presidência terá como titular o gaúcho Miguel Rossetto, integrante da corrente Democracia Socialista (DS), maior rival do grupo de Lula dentro do PT.

Tudo indica, diante dessas novas evidências, que Dilma pretende, no segundo mandato, se descolar tanto quanto possível da onipresença de seu criador. Faz sentido, considerando as características de autossuficiência e voluntarismo que se evidenciam no temperamento da presidente, que agora, reeleita, parece se sentir mais à vontade para andar com as próprias pernas. Resta saber até que ponto o ex-presidente vai se conformar com a novidade.

Candidato óbvio a voltar à Presidência, Lula sabe que dependerá muito de um bom desempenho de Dilma no segundo mandato para aspirar a uma vitória nas urnas em 2018. Mas não é porque sua capacidade de atuar politicamente dentro do governo parece diminuir que ele ficará de braços cruzados. Suas digitais estão claramente impressas na articulação dos movimentos sociais de esquerda que pretendem levar às ruas uma pauta de reivindicações "progressistas", como revelou reportagem do Estado na sexta-feira. É a alternativa que Lula pode ter encontrado para permanecer em evidência. Mas isso diz respeito ao futuro.

O que interessa a curto prazo, e é vital para todos os brasileiros, é a capacidade do futuro Ministério de equacionar e resolver os sérios problemas econômicos que foram agravados nos últimos anos. E tudo indica que tal capacidade não existe. Afinal, continuam no governo as pessoas e os partidos que produziram os males que nos afligem.

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