• Risco de crise duradoura começa a suscitar sugestões de medidas mais extremas
- Folha de S. Paulo
Um certo Brasil está se desmilinguindo. A demolição se deve em parte às reações aos abusos do governo, na verdade do sistema de poder, sempre uma parceria público-privada. O país se esboroa ainda por outros motivos imediatos:
1. A crise econômica é muito mais séria que a terrível baixa do PIB, grave ao ponto de pipocarem sugestões de que o país precisa de um choque. Não se ousa chamar a coisa pelo seu nome, mas é disso que se trata;
2. Líderes e partidos menos irrelevantes não são capazes de oferecer plano de reconstrução, política e econômica. Capazes em termos de habilidade, discernimento e poder, de organização ou articulação social.
A reação ao abuso transparece nas gritas genéricas contra "corrupções". Nos casos de polícia do empresariado graúdo. Nos processos dos arbítrios de Dilma 1 ("pedaladas", Petrobras, Eletrobras etc.). Na fúria contra o estelionato eleitoral de 2014. No basta ao livre comércio de parlamentares.
PT, PSDB e PMDB, porém, agem com mesquinharia alucinada, com oportunismos contraproducentes de autopreservação, atos de quem saqueia moedas de uma casa em chamas. A política parece um hospício desgovernado por loucos, quando não presídio em rebelião. Está alheia à crise e ao povo bestificado; desconectada de uma sociedade também politicamente desarticulada.
O "governo", sempre nosso bode expiatório preferencial, um saco sem fundo em que se socam todas as insatisfações e demandas, em dias bons é apenas um véu que camufla e amortece conflitos socioeconômicos, de "classe". Não mais.
Esgotou-se a política de combinar gasto social crescente com subsídios ainda maiores à grande empresa, com endividamento sem limite (que privilegia com juros os donos do dinheiro), com reservas de mercado para oligopólios e outras malversações do bem público e da eficiência.
A economia se esboroa em ritmo mais acelerado pela baderna institucional (Lava Jato, Petrolão, governo desmoralizado etc.). Há guinchos para tirar o PIB do atoleiro, mas é improvável que funcionem a contento antes de um ou dois anos. Isto é, demorará a aparecer o impulso da confiança maior, o das exportações e, talvez, o das obras de infraestrutura.
Mais profunda é a crise fiscal, que se pode transformar em colapso e solapar o crescimento por mais anos.
A recessão reduz a receita de impostos, mas mesmo sem crise a arrecadação não voltará a crescer como na década da formalização da economia. O padrão de gastos se tornou ainda mais explosivo. De resto, fez-se dívida pública demais para mimar a grande empresa, comprar empregos insustentáveis e disfarçar ineficiências grossas.
A fim de lidar com tamanha crise, parte da elite pensante passa a sugerir medidas de choque. Isto é, privatizações (de partes de bancos, ativos do BNDES, hidrelétricas) e alta forte de impostos. Junto disso, plano para rever subsídios e o sistema que permite a elevação sistemática de despesa (INSS e vinculações), de modo a tornar crível a ideia de que o novo aumento de receita bastará para domar a dívida. Para completar o básico, desvalorização do real, com o fim de excessos de intervenção no câmbio (reservas demais, swaps).
A isto chegamos.
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