Editorial do ‘Washington Post’ alerta governo sobre ações voltadas à Amazônia e a índios
Duas décadas de rodízio no poder entre tucanos e petistas, com mais ou menos os mesmo aliados, fizeram a nação se acostumar com um padrão de comportamento em Brasília. Com a chegada ao Planalto de Jair Bolsonaro, à frente de assumidos direitistas, é necessário recalibrar os instrumentos de aferição do poder.
Pontos fortes e fracos ainda precisam ser mapeados com precisão. Se a equipe econômica tem dado o recado em termos do diagnóstico da crise, há uma esfera do governo — agricultura, meio ambiente, índios, mulheres, educação, saúde — em que o pedigree ideológico do Planalto é bem mais visível. Este conjunto de áreas sensíveis tem ficado em relativo segundo plano, o que não significa que não seja fonte de encrencas sérias para o país.
Um alvo do governo é o “politicamente correto” , e, dentro desta visão, especificamente, a proteção do meio ambiente, dos povos indígenas e similares. Por isso, um foco de tensão, desde a campanha eleitoral, tem sido a possível preponderância da atividade agrícola sobre a preservação ambiental. Tudo isso envelopado por críticas, no estilo Trump, ao Acordo de Paris, e também pela recusa a provas científicas do aquecimento global.
Precisa chamar a atenção dos novos governantes editorial publicado na sexta-feira da semana passada pelo “Washington Post” , sob um título sintomático: “Jair Bolsonaro rasgará as proteções ao meio meio ambiente, colocando em perigo a Amazônia?”
O assunto não é novidade para grandes empresas do agronegócio que atuam no Brasil. Elas já haviam alertado o então futuro presidente Bolsonaro para o risco de barreiras às próprias exportações de grãos e carnes, caso se firme a ideia de que os novos ocupantes do Planalto recuarão no combate ao desmatamento na região, para abrir mais fronteiras à soja e ao gado.
É hora de levar a sério o tema. Deve-se recordar que o ainda presidente eleito recuou na ideia de converter o Ministério do Meio Ambiente numa simples autarquia da Agricultura, depois de ser informado sobre este perigo. É provável que não soubesse da possibilidade de essas exportações — essenciais ao equilíbrio das contas externas brasileiras — serem barradas caso fique provado que se originam de áreas de desmatamento ilegal. E não pode ser esquecida a questão indígena, também de grande capacidade de sensibilizar movimentos bem articulados fora do país. O editorial do “Post” faz, ainda, referência aos índios, supostamente ameaçados pelo presidente: “adaptam-se ou serão varridos”. Um exagero.
O ponto-chave é que o jornal de Jeff Bezos, o homem mais rico do mundo, defende mesmo que consumidores, empresas e governos devem evitar alimentos exportados pelo Brasil, produzidos em regiões desmatadas.
Um dos maiores exportadores de carne e grãos do mundo, o país tem muitos concorrentes à espreita. De nada adiantará a retórica ultranacionalista do Itamaraty, se não houver cuidados em defender mercados conquistados pela eficiência da agropecuária brasileira.
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