quinta-feira, 30 de março de 2023

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Interesse público deve prevalecer na regulação digital

O Globo

Agência de checagem vinculada ao Estado, como quer o governo, não passa de desperdício de dinheiro

Não passa de desperdício de dinheiro público o lançamento de uma agência oficial de checagem contra desinformação promovido pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom). Em toda democracia que se preze, não cabe ao governo ter a pretensão de determinar que informação é fraudulenta. O site Brasil contra Fake, lançado pela Secom, não passa de instrumento de propaganda para tentar desqualificar informações negativas ao governo. O mais provável é que só dissemine uma interpretação favorável do noticiário.

O combate à desinformação é essencial, necessário e ganhou nova relevância depois do 8 de Janeiro, em particular para nossa democracia, alvo dos ataques violentos. Mas obviamente não passa pela criação de um organismo estatal cuja missão já é exercida com competência pela imprensa profissional. Há iniciativas bem mais importantes se o objetivo é coibir o uso das redes sociais para cometer crimes.

A primeira é a aprovação do Projeto de Lei das Fake News, em debate há anos no Congresso. A última versão do texto, sob a relatoria do deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), busca inspiração na mais moderna legislação europeia. Na essência, deixa de eximir as plataformas digitais de responsabilidade pelo conteúdo que veiculam. Estabelece que elas precisam ter um “dever de cuidado” com o ambiente social em que a informação circula, cria mecanismos transparentes de moderação e exclusão de contas e conteúdos, impondo que, a partir do momento em que são informadas por usuários de algo que viole a lei, passam a ser corresponsáveis pelas consequências.

Outra iniciativa relevante são dois julgamentos no Supremo questionando a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, dispositivo que isenta as plataformas de responsabilidade por conteúdos publicados pelos usuários até que recebam ordem judicial (que pode levar anos). Um, sob relatoria do ministro Dias Toffoli, pede que o Facebook derrube um perfil falso com o nome de um cidadão. O outro, relatado pelo ministro Luiz Fux, pede a remoção de uma comunidade do Orkut, antiga rede social do Google, com críticas a uma professora.

 “Não é possível continuarmos achando que as redes sociais são terra de ninguém”, afirmou o ministro Alexandre de Moraes, do STF, em audiência pública convocada para discutir os processos. As plataformas e seus defensores costumam apelar à ideia de liberdade de expressão para argumentar contra qualquer mudança. Trata-se de um argumento falacioso. “Desinformação, mentira deliberada, discurso de ódio, ataque à democracia e incitação à prática de crimes violam os três fundamentos que justificam a proteção da liberdade de expressão”, disse o ministro Luís Roberto Barroso.

O ministro Gilmar Mendes, também presente à audiência, defendeu, em artigo recente no blog Fumus Boni Iuris, do GLOBO, uma legislação que se preocupe mais em regular os processos por meio dos quais as plataformas lidam com conflitos (como exclusão de contas ou publicações) do que o conteúdo em si — exatamente o contrário do que a Secom faz ao criar uma agência de checagem “chapa-branca”. Não há dúvida de que a regulação atual está ultrapassada. O lobby das gigantes digitais para eximi-las de novas obrigações é incansável, mas as posições dos ministros do STF mostram como fazer o interesse público prevalecer.

Vazamento na Usina de Angra exigia mais transparência das autoridades

O Globo

Embora risco para a população e o ambiente tenha sido afastado, modo como episódio foi conduzido preocupa

A Polícia Federal investiga o vazamento de material radioativo da Usina Angra 1 em 16 de setembro do ano passado, como revelou O GLOBO. Seis meses depois, pairam dúvidas sobre a natureza do incidente — inicialmente omitido das autoridades — e sobre os procedimentos adotados. É algo inaceitável tratando-se de instalação nuclear e dos potenciais riscos para a população e para o meio ambiente.

O Ibama tomou conhecimento do vazamento no fim de setembro por meio de denúncia anônima. O episódio só foi confirmado em 11 de outubro, três semanas depois do ocorrido, em comunicado à Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen) feito pela Eletronuclear, empresa responsável pela usina. O Ibama multou a Eletronuclear em R$ 2 milhões pelo vazamento e em R$ 101 mil pela demora em informá-lo.

A Eletronuclear afirma que “pequeno volume” de material radioativo (90 litros) foi lançado “de forma involuntária” no sistema de águas pluviais e que, por se tratar de um “incidente operacional”, a notificação não era obrigatória. De acordo com a empresa, análises no local não encontraram “nenhum resultado significativo”. A Cnen também informou que o material lançado na Baía de Itaorna, em Angra, não acarreta risco.

Algumas questões, contudo, persistem. Se a notificação não era necessária, por que então foi feita com atraso? “Se vazou um pouco que seja, deveria ter avisado”, disse Ney Zanella dos Santos, presidente da ENBPar, estatal que controla a Eletronuclear. “Se não avisaram, erraram.”

Preocupam também divergências sobre a gravidade do episódio. Segundo a Eletronuclear, ele foi classificado como nível 2 (incidente) na International Nuclear and Radiological Event Scales (Ines), escala usada para avaliar acidentes nucleares. Num relatório de fevereiro, porém, técnicos do Ibama afirmam que as informações da Eletronuclear não deixam claro se foi usada mesmo a Ines. Para a Cnen, o vazamento estava no nível zero, em que “nenhuma mudança na segurança é observada, bem como nenhuma consequência à população geral”.

A julgar pelo que foi informado até agora, as análises não descobriram riscos para os moradores ou para o meio ambiente. Tanto melhor. Mas a forma como a comunicação foi conduzida desperta preocupação. A melhor forma de lidar com incidentes ou acidentes nas usinas nucleares é agir com a máxima transparência, como demonstram diversos episódios ao longo da História, de Three Mile Island a Tchernóbil. Isso lamentavelmente não aconteceu. É fundamental informar imediatamente qualquer evento suspeito às autoridades e à sociedade, que tem o direito de saber o que se passa ao redor, especialmente quando o vizinho é uma usina nuclear.

Tragédias nas escolas

Folha de S. Paulo

Alta nos ataques exige protocolo baseado em evidências, não solução imediatista

Casos de adolescentes que invadem escolas matando estudantes e professores são fenômenos típicos dos EUA, mas dados apontam que tais tragédias vêm se tornando mais comuns no Brasil.

Segundo levantamento de pesquisadores da Unesp e da Unicamp, entre 2002 e julho de 2022 aconteceram 13 ataques perpetrados por alunos ou ex-alunos em escolas do país, causando 28 mortes —em média, pouco mais de um ataque a cada biênio e 1,4 óbito por ano.

A estatística do período já deveria causar preocupação, mas o cenário a partir de agosto de 2022 se mostra muito mais alarmante. Nos último oito meses, foram nove atentados e sete mortes, o que representa escalada abrupta de violência, com cerca de um ataque a cada 30 dias e quase um óbito por mês.

Diferentemente do que se vê nos Estados Unidos, onde se usam pistolas e até metralhadoras, aqui em apenas 12 episódios do período estudado os agressores empregaram armas de fogo —uma evidência a favor da legislação brasileira, que favorece o desarmamento.

Contrariando os fatos, entretanto, correntes conservadoras, bolsonaristas em particular, alegam que a liberação do porte de armas seria uma das soluções para a onda de ataques, além de advogarem redução da maioridade penal.

Criar leis e elevar penas em momentos de comoção, porém, não costuma ser abordagem eficiente para um problema de segurança.

A pesquisa da Unesp e da Unicamp mostrou que jovens agressores têm perfil semelhante: manifestam comportamento machista e violento, cultuam armas, são isolados, apresentam histórico de distúrbio psiquiátrico e convivem com desemprego e violência doméstica no ambiente familiar.

A motivação do crime geralmente têm relação com vingança por ciúmes ou bullying. Jovens com motivações do tipo se encontram em fóruns, redes sociais, jogos online e sites da chamada deep web (internet profunda, onde há atividades ilegais), compartilhando raiva, violência e machismo.

Com base nesse diagnóstico, há protocolos de segurança sugeridos por especialistas.

Entre eles, capacitar professores, funcionários e pais para identificar alterações de comportamentos, além de falar sobre preconceito, agressividade e internet em sala de aula. Uma atuação da inteligência de órgãos de segurança sobre sites e fóruns anônimos da deep web também é cogitada.

Pela ligação com a expansão do ambiente online e um acirramento do embate ideológico, os ataques às escolas são sintomas de um cenário novo e de difícil compreensão. Políticas públicas de longo prazo são mais indicadas do que soluções radicais e imediatistas.

Choque elétrico

Folha de S. Paulo

UE se prepara para abandonar motor a combustão até 2035; Brasil avança pouco

A União Europeia (UE) engatou marcha acelerada para eletrificar sua frota de veículos: em 2035, deixará de fabricar carros movidos a combustíveis fósseis. A medida faz parte da estratégia para zerar, em 2050, as emissões de carbono.

A Alemanha defende exceção para motores que queimem combustíveis sintéticos e não gerem poluição, mas já é certo que os elétricos dominarão o mercado. Hoje, são 21% dos carros novos na UE.

Com 27%, a fatia de vendas na China é mais que o dobro da média mundial de 13%. Lá, 6,2 milhões de veículos eletrificados chegaram às ruas em 2022 —entre os totalmente elétricos com baterias (BEV, na abreviação em inglês) e os híbridos que podem ser ligados na tomada (plug-ins, ou PHEV).

As vendas chinesas no setor cresceram 82% em 2022, enquanto o mercado automotivo geral encolhia 5,3%. No mundo, o avanço verde foi de 55%, ante retração de 0,5% nas vendas totais de veículos, segundo a base de dados EVvolumes.

Os EUA ficam atrás da média global, com 7,2% de elétricos. A campeã é a Noruega, onde BEVs e PHEVs somam 79% das vendas.

Do ângulo da crise climática, pouco adiantará eletrificar a frota se a energia das baterias provier de fontes emissoras de carbono, como usinas alimentadas com carvão mineral, óleo ou gás natural. A matriz elétrica precisa ser toda renovável para fazer diferença contra o aquecimento global.

Nesse quesito, o Brasil ocupa posição ímpar, com 82,9% da eletricidade oriunda de fontes renováveis (hidráulica, eólica, solar e biomassa), contra 28,6% na média do planeta. Some-se a isso a alta produção de etanol e tem-se um enorme potencial para BEVs e PHEVs.

Os números são ínfimos, contudo. Circulam aqui apenas 135,3 mil elétricos e híbridos, menos de 0,1% da frota de veículos leves. As vendas têm aumentado, é fato, com 49,2 mil emplacamentos em 2022, incremento de 41% sobre o ano anterior, de acordo com a Associação Brasileira do Veículo Elétrico.

A maioria dos carros elétricos e híbridos disponíveis no mercado nacional é de modelos pouco acessíveis —e poderão ficar ainda mais caros, se o governo federal ouvir o pleito apresentado em fevereiro pela Anfavea de revogar a isenção do imposto de importação, com retorno da alíquota de 35%.

Ou seja, as montadoras querem garantir uma reserva de mercado. Enquanto a Europa acelera, no Brasil ameaçam puxar o freio de mão.

Comissão de Anistia é política de Estado

O Estado de S. Paulo.

Fruto da lei, a Comissão de Anistia não pode ser desvirtuada pelo Executivo. Com Bolsonaro, colegiado negou direitos constitucionais; sob Lula, inventaram ‘anistia política coletiva’

Está prevista para hoje a primeira sessão da Comissão de Anistia com a nova composição do colegiado, definida pelo governo Lula. O objetivo imediato é fazer a revisão dos processos avaliados nos últimos dois governos, especialmente no de Jair Bolsonaro, quando a grande maioria dos pedidos foi rejeitada. Entre 2019 e 2022, dos 4.285 processos julgados pela Comissão, 4.081 (95%) foram indeferidos, segundo levantamento do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania.

É fundamental realizar esse trabalho de revisão, uma vez que, no governo Bolsonaro, a Comissão de Anistia foi totalmente desvirtuada, com integrantes que rejeitavam a própria finalidade do colegiado. Basta ver que, para Jair Bolsonaro, as atrocidades da ditadura militar não deveriam ser indenizadas, e sim homenageadas.

De fato, o bolsonarismo distorce até mesmo as questões mais básicas. O trabalho da Comissão de Anistia não é a realização de uma política de governo, como se dependesse das idiossincrasias do governante de plantão. O colegiado vem cumprir uma política de Estado, definida na própria Constituição de 1988, que concedeu “anistia aos que, no período de 18 de setembro de 1946 até a data da promulgação da Constituição, foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, institucionais ou complementares” e determinou a correspondente reparação econômica. É dever do Estado, portanto, indenizar todos aqueles que, por razões políticas, foram perseguidos pelo poder estatal.

Durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, foi editada a Medida Provisória (MP) 65/2002, depois convertida pelo Congresso na Lei 10.559/2002, que regulamentou os direitos constitucionais dos anistiados políticos. A Comissão de Anistia, que entre seus membros conta com um representante do Ministério da Defesa e um das pessoas anistiadas, é fruto dessa regulamentação. Assim, quando desvirtua o funcionamento do colegiado, o governo descumpre a Constituição, ao negar efetividade a direitos previstos no texto constitucional.

A vinculação da Comissão de Anistia com a Constituição e com a Lei 10.559/2002 explicita que o trabalho do colegiado não tem natureza política, não devendo depender de orientações político-ideológicas. Trata-se de tarefa técnica, de análise das provas, para comprovar a alegada perseguição política, assessorando o Executivo federal na concessão das indenizações.

Em razão da necessária conformidade com a lei, a Comissão de Anistia não deve fazer criações interpretativas, seja para negar direitos, seja para estendê-los além do que o legislador previu. Por exemplo, o novo Regimento Interno da Comissão de Anistia, publicado em 23 de março, prevê a possibilidade de um requerimento coletivo de anistia política, criando uma “declaração de anistia política coletiva” para “associações, entidades da sociedade civil e sindicatos representantes de trabalhadores, estudantes, camponeses, povos indígenas, população LGBTQIA+, comunidades quilombolas e outros segmentos, grupos ou movimentos sociais que foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, institucionais ou complementares”.

A Constituição e a Lei 10.559/2002 são inequívocas: os anistiados são pessoas físicas. A pretendida ampliação a coletivos, por meio de decreto, desrespeita o que o Congresso estabeleceu. Se o governo federal pretende indenizar associações e entidades, deve antes propor ao Poder Legislativo. A razão para tal exigência é cristalina: a Comissão de Anistia cumpre uma política de Estado, e não de governo. Alterar sua sistemática exige lei.

Outro aspecto que merece ser lembrado, especialmente depois de duas décadas de existência da Comissão de Anistia, é a necessidade de finalizar o trabalho de reparação dos anistiados políticos. O Estado tem o dever de analisar com presteza os casos pendentes, dando o devido encaminhamento. Eternizar essa tarefa, como se não tivesse fim, seria também uma forma de descumprir a Constituição.

A estranha tolerância de Lula

O Estado de S. Paulo.

Sabe-se que o lulopetismo faz o diabo para se manter no poder, mas poderia ao menos demonstrar algum incômodo com um caso tão cristalino de imoralidade como o do ministro Juscelino

Dia sim e outro também, pululam evidências de que o ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil), usa desavergonhadamente dinheiro público para bancar seus luxos privados. Até quando o presidente Lula da Silva manterá uma figura como essa no primeiro escalão do governo em nome da coesão de uma base de apoio no Congresso que, a rigor, ele nem sequer tem?

De acordo com uma nova reportagem do Estadão, que desde o dia 30 de janeiro tem revelado ao País o veio patrimonialista de Juscelino Filho, o ministro empregou o piloto de sua aeronave particular e o gerente de seu haras, localizado no município de Vitorino Freire (MA), como funcionários de seu gabinete na Câmara dos Deputados. Ambos continuam recebendo salários de R$ 10,2 mil e R$ 7,8 mil, respectivamente, pagos pelos contribuintes, mesmo após o ministro ter se licenciado do cargo para ingressar no governo federal. O suplente de Juscelino Filho, deputado Benjamim de Oliveira (União Brasil-MA), não só manteve os dois funcionários do ministro em seu gabinete – embora, segundo consta, não possua aeronave nem cavalos –, como ainda empregou um tio do ministro das Comunicações.

Evidentemente, Juscelino Filho justificou as nomeações afirmando que todas as contratações para seu gabinete estariam “em conformidade com as regras da Câmara”. É improvável, mas, se estão, seria o caso de rever essas regras, pois são totalmente antirrepublicanas. Em nota, o ministro ainda exaltou o “zelo” e o “profissionalismo” com que seus funcionários desempenham as funções. Não há razões para duvidar disso. O piloto do ministro pode ser um ás da aviação. Os cavalos de seu haras podem ser os mais bem tratados do mundo. A questão de fundo é: o que o pobre do contribuinte, que custeia o seu gabinete para o exercício do mandato parlamentar, tem a ver com isso?

Por mais escabroso que seja – e a estupefação só aumenta diante da desfaçatez do ministro em minimizá-lo –, esse é apenas mais um caso a se somar à pilha de suspeitas sobre Juscelino Filho trazidas a público por este jornal desde que ele passou a integrar o Ministério de Lula.

Em apenas dois meses de esforço jornalístico, o Estadão já revelou que, quando deputado, Juscelino Filho usou dinheiro do orçamento secreto para asfaltar uma estrada que passa em frente a fazendas dele e de seus familiares; voou em avião da FAB para cumprir agendas particulares, inclusive com recebimento de diárias (devolvidas após o caso vir a público); escondeu patrimônio da Justiça Eleitoral; informou dados falsos ao Tribunal Superior Eleitoral para justificar o uso indevido de recursos do fundo eleitoral; emplacou funcionário fantasma no Senado; e, como se não bastasse, sobre Juscelino Filho ainda pairam graves suspeitas de ter intermediado a contratação de empresas de amigos e ex-assessores pela Prefeitura de Vitorino Freire – município governado pela irmã do ministro, Luanna Rezende

É essa a folha corrida de Juscelino Filho, tirado por Lula do merecido anonimato, em nome sabe-se lá de quais imperativos políticos. Dos petistas, ferozes críticos dos muitos desvios éticos do governo de Jair Bolsonaro, não se ouviu palavra. Sabe-se que o lulopetismo faz o diabo para chegar ao poder e se manter lá, como provam o mensalão e o petrolão, mas poderiam ao menos demonstrar algum incômodo com um caso tão cristalino de imoralidade – que fosse apenas para manter as aparências de um governo cujo presidente venceu as eleições prometendo restabelecer a democracia e a decência.

Ao que parece, Lula não vê problema em manter em um Ministério que se presta a auxiliá-lo na “união e reconstrução” do Brasil uma pessoa com um passivo desses. O presidente se limitou a exigir que Juscelino Filho “fosse às ruas” e “se explicasse”, como se não fosse dele, como chefe de Estado e de governo, a responsabilidade de zelar pela moralidade de sua própria administração.

Se Lula da Silva não quer que os rolos de Juscelino Filho passem a ser exclusivamente seus, passa da hora de o presidente da República nomear um novo ministro das Comunicações.

Terror e morte na escola

O Estado de S. Paulo.

Ataque em escola de SP impõe a autoridades e educadores desafios em múltiplas dimensões

O ataque de um aluno de 13 anos numa escola da zona oeste de São Paulo chocou o País de muitas maneiras: pelo crime em si, filmado em toda a sua crueza, como já se tornou comum nestes tempos, que vitimou uma professora totalmente indefesa; pela vulnerabilidade de alunos e professores num ambiente presumivelmente de aprendizado, e não de violência homicida; e pela exposição explícita e dolorosa do terrível estado da saúde mental dos estudantes, sobretudo depois da traumática experiência da pandemia de covid-19.

Dadas todas essas dimensões, não se pode tratar esse episódio apenas como mais um crime, mas como expressão dos muitos desafios que se impõem a autoridades públicas e a educadores para reduzir os riscos de que algo dessa natureza volte a acontecer e, pior, que se torne comum.

O primeiro aspecto que salta logo aos olhos é a facilidade com que o estudante entrou armado na escola e atacou a professora e em seguida vários de seus colegas. No entanto, ainda que cause justa indignação, tal circunstância não pode servir de pretexto para soluções que, em vez de mitigar a sensação de insegurança, acrescentariam tensão ao ambiente escolar. O governador Tarcísio de Freitas, por exemplo, indicou a disposição de colocar policiais dentro das escolas. Além disso, alguns políticos sugeriram a instalação de detectores de metal. Tais propostas, ainda que possivelmente evitem crimes, o que é duvidoso, tendem a transformar a escola em teatro de guerra, algo indesejado para a educação das crianças.

O segundo aspecto é o protagonismo das redes sociais. Na véspera do crime, o assassino tinha anunciado o plano em uma dessas redes. Um mês antes, já havia sido denunciado à polícia por postar vídeos em que simulava atos violentos. Não se quer aqui dizer que as redes tenham responsabilidade direta pela violência, mas, ao permitir que crianças as frequentem e ao valorizar conteúdos violentos por seu potencial de engajamento, colaboram decisivamente para que jovens se radicalizem e, confundindo o mundo virtual com o real, sintamse estimulados a praticar a violência que os excita.

Nesse sentido, é urgente que haja alguma forma de monitoramento das redes para que eventuais sinais de desequilíbrio deste ou daquele aluno sejam detectados a tempo. Muitas vezes, os pais não dão conta das múltiplas possibilidades de interação virtual a que seus filhos são expostos, razão pela qual é preciso que a escola os ajude e que haja denúncia tempestiva à polícia caso se suspeite que a criança esteja tomando o caminho da violência real.

Por fim, a saúde mental dos estudantes é outra frente de atuação incontornável, ainda mais quando se considera que, na pandemia, a suspensão das aulas presenciais e o isolamento social acentuaram distúrbios de ansiedade e depressão. Soube-se agora, depois da tragédia, que o governo paulista cancelou, há um mês, seu programa de atendimento psicológico nas escolas, por razões técnicas. Menos mal que tenha anunciado agora a retomada do programa, absolutamente necessário.

De tudo isso, depreende-se que não serão soluções simplistas e meramente reativas que vão resolver o problema. Que a indignação não sirva de pretexto para mais violência. É preciso ter coragem de apostar na cultura de paz.

Israel para em protesto contra reforma antidemocrática

Valor Econômico

Netanyahu recuou por um mês para desmobilizar a imensa reação contrária a seus projetos

Durante quase 75 anos, Israel foi uma exceção democrática no Oriente Médio, coalhado de ditaduras e autocracias árabes. Um presente que o veterano político Benjamin Netanyahu pretendia dar ao país em seu aniversário, em 14 de maio, seria esse: o princípio do fim da democracia israelense. Oportunista e corrupto, enfrentando três processos na Justiça, Netanyahu conseguiu formar o governo mais à direita da história do país.

As ações do primeiro ministro para subordinar a Suprema Corte, restringir seus poderes e torná-la na prática uma mera serviçal do Parlamento, por outro lado, produziram as maiores manifestações de repúdio já vistas, em uma insurgência que reuniu banqueiros, empresários do próspero setor de tecnologia, militares e camadas da classe média secular e liberal israelense. Netanyahu brinca com fogo no Oriente Médio, colocando o futuro em risco para, em primeiro lugar, salvar a própria pele e escapar da prisão, e depois, mitigar seu desejo irrefreável pelo poder.

Após cinco eleições em quatro anos, Netanyahu montou um gabinete com apoio majoritário (64 das 120 cadeiras do Knesset) de grupos ultraortodoxos e religiosos mais conservadores - o que inclui políticos às voltas com a lei e nacionalistas radicais favoráveis à anexação de terras dos palestinos. O tom do radicalismo varia na coalizão direitista, mas não muito. Todos acreditam que a Suprema Corte é esquerdista, tem poderes demais, é intervencionista, tendenciosa e, palavra de preferência dos populistas de qualquer parte da Terra, “elitista”.

Os projetos dos membros do atual governo colocam em risco a segurança de Israel. O ministro das Finanças, Bezalel Smotrich, do Partido Religioso Sionista, em palestra em Paris, disse não só que não existe uma cultura palestina, como também que “não existe povo palestino”. No palanque em que foram proferidas, havia mapa no qual tanto a Cisjordânia ocupada como a Jordânia eram partes de Israel - a Jordânia é um dos vizinhos de Israel que menos lhe dá problemas. O ministro da Segurança, Itamar Ben-Gvir é um seguidor do rabino extremista Meier Kahane, do partido Kach, considerado grupo terrorista pelos Estados Unidos.

O ministro da Saúde e Interior, Arieh Deri, teve de sair do governo no início do ano porque não poderia integrá-lo: confessou-se culpado por fraude fiscal para escapar da prisão. No passado, chegou a ser condenado por três anos de cadeia por aceitar propinas. Netanyahu prometeu-lhe a volta ao governo, como ministro das Finanças.

A Procuradora Geral Gali Baharav-Miara, por seu lado, disse que Netanyahu não poderia estar envolvido na questão da reforma judicial. Em um dos processos, no qual é réu por corrupção, ele fizera um acordo com a Corte prometendo que, no poder, não atuaria em projetos que tivessem impacto nos casos pelos quais está sendo julgado.

Sem uma Constituição, e sem Senado, a Suprema Corte é o único anteparo a eventuais ataques aos direitos democráticos feitos pelo Parlamento e um governo dominados por extremistas. A reforma que Netanyahu patrocina muda a composição da comissão que seleciona os juízes da Corte tornando-a favorável ao governo. Ao mesmo tempo, confere ao Knesset o poder de revogar decisões da Corte por maioria simples. A aprovação da reforma referenderá o impasse constitucional, pois a Suprema Corte seguramente a declarará ilegal. A tentativa de subjugar a democracia paralisou o país, sublevou Forças Armadas e os reservistas, e trouxe apreensão nos EUA.

Há uma nova correlação de forças se formando no Oriente Médio, com o fim das hostilidades entre Irã e Arábia Saudita (xiitas e sunitas), a ser testada, sob patrocínio da China. O avanço das ocupações ilegais em territórios palestinos, a ressurreição de ataques mútuos diários na faixa de Gaza podem no futuro encontrar respostas mais fortes se o governo israelense, como promete, seguir em frente em seus planos. O acordo que normalizou relações com Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Marrocos e Sudão pode estar com os dias contados diante das exibições de expansionismo do atual governo. As ameaças de ataques israelenses ao Irã, para deter o avanço rumo a artefatos nucleares, ganha maior probabilidade.

Netanyahu recuou por um mês para desmobilizar a imensa reação contrária a seus projetos. Ao fazê-lo, usou a palavra guerra civil, o que mostra quão fundo a democracia israelense foi abalada - e quão sérias são as ameaças de sua destruição.

 

2 comentários:

Anônimo disse...

Olha o editorial do estadão aí gente... Só falta inflar um pixuleco e dar títulos em letras garrafais. Entendo a sanha dessa gente em querer ir contra o projeto contra a disseminação de mentiras e ódio nas redes. O título é a exemplificação do ódio encarnado dessa gente. Mais respeito é bom para que menos bolsonaros surjam, por favor.

Anônimo disse...

O Globo
"Interesse público deve prevalecer na regulação digital"

Disso ninguem discorda. Sua manchete é mais uma filosofia barata. O único problema, organização Globo, é quem diz o q é "interesse publico". Pra isso, Lula é o Congresso foram eleitos. Jornal e TV e rádio e site têm influência (é o seu caso), mas Lula tb tem o dever é o direito de atuar nesta área (regulação digital). Perceba q, dentre inúmeras diferenças, repito, inúmeras, seus interesses, Globo, nem sempre se confundem com os do público (apoiaram a ditadura e pediram desculpas, por ex., etc). Assim como acontece com o Lula.