segunda-feira, 4 de março de 2024

Carlos Pereira* - A democracia precisa de democratas?

O Estado de S. Paulo

A combinação de apoio à democracia com a performance gera o desejo de uma democracia melhor

Democracias estariam mais seguras diante de maior apoio popular? Ou, estariam em risco de retrocessos quando o apoio dos eleitores é menor? Há muito que se argumenta que regimes democráticos e seu respectivo apoio popular se reforçariam mutuamente. Que elevados níveis de apoio popular garantiriam que democracias permaneceriam fortes e duráveis. Ao mesmo tempo que experiências de governança democrática virtuosa gerariam suporte robusto da sociedade em favor da democracia.

Por outro lado, acredita-se que o fortalecimento democrático funcionaria como uma espécie de termostato do apoio popular; ou seja, em vez de uma democracia forte gerar mais apoio popular, o aprofundamento da democracia provocaria uma reação inversa. Entretanto, paradoxalmente, são justamente em momentos de risco de retrocessos democráticos que o suporte popular em favor da democracia aumentaria.

Esse “efeito termostato” pode ser verificado na série história de pesquisas de opinião sobre o apoio à democracia de 1989 a 2023. A diferença entre o “apoio à democracia” e a soma dos eleitores que responderam “tanto faz” e “apoio à ditadura” sugere que o apoio à democracia foi muito maior durante os anos do governo Bolsonaro e alcançou o seu ápice um pouco antes das eleições de 2022, quando existia a percepção de grande temor de retrocessos democráticos no Brasil.

Entretanto, no artigo Democracy, Public Support, and Measurement Uncertainty, que acaba de ser publicado na revista científica American Political Science Review, Yuehong ‘Cassandra’ Tai e seus autores questionam essas crenças. Eles demonstram que a relação entre suporte público e democracia desaparece quando levam em consideração o grau de incerteza dos eleitores quanto à solidez da democracia e da sua capacidade de entregar as políticas consistentes com as suas preferências.

O estudo, feito em 144 países por cerca de 33 anos (1988 a 2020), indica que o declínio do suporte popular à democracia não sinaliza que a democracia necessariamente sofrerá retrocessos. Tampouco que mudanças no padrão democrático que venham a indicar riscos de retrocessos ativariam respostas tipo termostato de aumento do apoio popular em favor da democracia, como se pensava.

O efeito da democracia no apoio popular, o estudo sugere, pode ser consequência da sua efetividade, particularmente se a democracia é acompanhada de redistribuição e diminuição de desigualdade. Ou seja, é da combinação do suporte democrático com a satisfação em relação à sua performance que surgem demandas por democracias melhores.

*Professor titular da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (FGV Ebape) e sênior fellow do Cebri

2 comentários:

ADEMAR AMANCIO disse...

A democracia só é ''nociva'' por eleger políticos contrários à democracia.Quem é contra a democracia devia ser banido do processo eleitoral.

Anônimo disse...

■Quem apoia ditadores e terroristas deve ser derrotado democraticamente em processos eleitorais.
= Especialmente os políticos de partidos que se dizem democráticos, mas que usam a democracia para reforçar os interesses de ditaduras e de terroristas.