Folha de S. Paulo
É bom que o presidente esteja se afastando de
ditadores de esquerda que antes apoiava
Até alguns mandatos atrás, presidentes
brasileiros podiam fazer o que quisessem no campo das relações internacionais
sem se preocupar com a repercussão doméstica de suas ações. O brasileiro médio
não dava a mínima para a política internacional. O jogo mudou.
A polarização transformou as relações externas em mais um campo de batalha das guerras culturais. Hoje dá para inferir o posicionamento político de um cidadão –e até em quem ele vai votar na próxima eleição presidencial-- perguntando-lhe só o que ele acha da Venezuela e das guerras na Ucrânia e em Gaza.
O corolário disso é que presidentes precisam
estar mais atentos a seus passos geopolíticos. Têm de olhar tanto para as
implicações diretas como para as indiretas.
Se é fácil ganhar o aplauso de militantes
investindo contra figuras controversas como Maduro,
Musk ou Netanyahu,
também é fácil perder o respeito da fatia de eleitores que valoriza a aplicação
coerente de princípios como o respeito à democracia e aos direitos humanos.
Penso que Lula faz bem
ao afastar-se de antigos aliados como Maduro e Ortega.
Ambos converteram seus países em ditaduras. Se Lula quer firmar-se como
baluarte das forças democráticas em oposição ao golpismo da extrema direita
representada por Bolsonaro, então tem de ser coerente e mostrar que se opõe
também a autoritarismos de esquerda.
Mostrar contrariedade não significa, é óbvio,
romper relações diplomáticas. A Venezuela é um país vizinho, o que significa
que estamos condenados a nos relacionar. O que importa é encontrar um ponto de
equilíbrio. É preciso passar a mensagem pró-democracia sem sacrificar outros
interesses, como o comércio bilateral e a tranquilidade nas fronteiras.
Podemos passar dias discutindo se Lula
acertou no tom ao mandar a embaixadora para a posse de Maduro. Eu teria enviado
o terceiro secretário. Seria um protesto mais eloquente. Mas acho que Lula
acerta no movimento de afastamento. O preocupante aqui é o PT, que fez a
sinalização oposta, indicando ser fã de ditaduras desde que tenham seu sabor
ideológico favorito.
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