CartaCapital
O governo não consegue enfrentar o
bolsonarismo na disputa da opinião pública
A pesquisa Datafolha divulgada
no início de abril trouxe certo alívio ao governo. Depois de ter caído para o
patamar de 24% de avaliação positiva, agora o instituto mostra uma reação, de
24% para 29%, enquanto a avaliação
negativa caiu de 41% para 38%. Somados os dois ganhos, são 8 pontos.
Mas isso não significa que a avaliação seja confortável, pois ela está ainda a
uns 11 a 12 pontos do patamar mínimo que poderia tranquilizar o governo para
transitar rumo a 2026 e às eleições presidenciais.
Existem muitas e variadas análises que buscam explicar as vicissitudes do governo na opinião pública. Uma das mais apontadas é a da inflação, com destaque para o preço dos alimentos. Além de corroer os salários, principalmente dos setores de renda baixa, a inflação bate forte na mesa das famílias. Outra pesquisa do Datafolha mostra que 58% dos brasileiros reduziram a compra dos alimentos e o consumo de água, luz e gás por causa dos reajustes. Para 54%, o governo Lula é muito responsável pela inflação, para 29% ele é um pouco responsável e para 14% ele não tem nenhuma responsabilidade.
Os números explicam como a inflação afeta a
popularidade do governo. O que os números não explicam é a ausência de um
discurso do governo para explicar as causas da subida dos preços e sua apatia
na busca de soluções para mitigá-la. Esse defensivismo provoca um dano ainda
maior porque a oposição se esmera em imputar toda a responsabilidade ao
governo. Ou seja, as perdas são amplificadas porque o governo não age
politicamente, não tem o senso da disputa política.
Inúmeros exemplos podem ser arrolados para
mostrar o fracasso e a incompetência política do governo para travar a disputa
política e ditar a pauta do debate público. A maior parte dos erros de
comunicação são consequência dessa falta de comando e de direção política. Quem
não se lembra do fiasco do Pix? Ou do lançamento da proposta de isenção
do Imposto de Renda para quem ganha até 5 mil reais juntamente com o
pacote do ajuste fiscal?
Agora o governo enviou ao Congresso o projeto
da isenção do IR e da cobrança de imposto para quem ganha acima de 50 mil num
momento favorável. As pesquisas mostram um amplo apoio social às duas
propostas. Mas, novamente, o bolsonarismo foi mais ágil e turvou esse ambiente
com o projeto da anistia, apesar de ele ter rejeição de 56% e apoio de 36%.
Contra tudo o que seria razoável, os bolsonaristas conseguiram o número de
assinaturas suficientes para propor a tramitação acelerada do projeto.
É preciso notar que, mesmo que a anistia não
venha a ser aprovada, o bolsonarismo conseguiu colocar o governo numa situação
delicada. Os líderes da situação na Câmara e a ministra da Secretaria de
Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, dormiram no ponto: não para impedir a
adesão de deputados da base à proposta de tramitação acelerada. Depois do leite
derramado, os líderes e a ministra esbravejam contra os parlamentares que
endossaram a proposta, mas não agiram quando era necessário agir.
Falta ao governo inteligência estratégica e
astúcia política. Nota-se a incapacidade de fazer o jogo do convencimento e da
persuasão com os instrumentos de força governamental e de constrangimento. É
desolador ver o governo rastejar politicamente. Ele não governa a base
parlamentar, a coalizão. Esta arrasta o governo para caminhos escusos. O
governo não consegue pautar o debate e os rumos do País porque se deixa
constranger por três frentes: 1. Pelo bolsonarismo que, mesmo enfrentando todo
tipo de dificuldade, consegue ser politicamente ativo. 2. Pelo Congresso, onde
o Centrão oscila, astutamente, entre a oposição e o governismo. 3. Pelo STF,
que, por conta da omissão do governo e do oportunismo dos partidos em tomar a
linha de frente na defesa das instituições e do Estado de Direito, se viu
obrigado a tornar-se o centro do combate ao golpismo e da defesa da democracia.
Sem aquela mencionada inteligência
estratégica, o governo carece de iniciativa e, juntamente com as esquerdas,
propõe pautas negativas e é surpreendido a todo momento pelas estratégias dos
inimigos e dos aliados/adversários. É incapaz de reagir com a rapidez que a
conjuntura e as redes sociais exigem. Chega sempre atrasado.
Qualquer estratégia eficaz deve partir do pressuposto de que a extrema-direita é inescrupulosa, mentirosa e manipuladora. Em vez de agir, as esquerdas preferem adotar lamentações morais mergulhando na capitulação sem luta. A inteligência estratégica, além de agregar várias virtudes do agir, confere a capacidade de antevisão do devir, de previsão e de antecipação de ações para conduzir os acontecimentos e as conjunturas para o leito desejado. Para seguir na recuperação do terreno perdido, o governo precisa capacitar-se para imprimir direção e sentido ao País.
Publicado na edição n° 1358 de CartaCapital,
em 23 de abril de 2025.
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