Isabel Braga e Cristiane Jungblut Brasília
DEU EM O GLOBO
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A três meses de eleger novo presidente, o PT mergulhou numa crise em razão da sua posição no esforço de enterrar as investigações sobre José Sarney (PMDB-AP). Petistas alinhados com o governo dizem que o partido não abandonou a defesa da ética, mas outras correntes criticam a aliança com o PMDB e a opção pelo pragmatismo, visando às eleições de 2010.
O eterno dilema do PT
Partido se debate entre valores históricos e pragmatismo de Lula diante da eleição de 2010
Acrise no Senado e o apoio incondicional ao presidente José Sarney (PMDB-AP) e ao PMDB em nome de uma aliança em torno da candidatura Dilma Rousseff à Presidência racharam o PT e reacenderam o debate sobre a submissão do partido aos interesses do Planalto. A polêmica aumenta a menos de três meses da escolha do novo presidente da legenda, que conduzirá o partido nas eleições de 2010. Virá à tona a eterna dicotomia entre os que defendem a volta do PT às suas raízes éticas e os que agem de forma pragmática para garantir a manutenção do poder em 2010.
Nome escolhido pelo Planalto e pelo presidente Lula, o ex-senador e ex-presidente da Petrobras José Eduardo Dutra defende a mesma linha de ação do atual presidente, Ricardo Berzoini (SP): a aliança com o PMDB é estratégica. Dutra é o candidato da corrente Construindo um Novo Brasil (CNB), do antigo Campo Majoritário. Defensores de outras candidaturas afirmam que a crise do partido remonta aos problemas enfrentados em 2005, quando integrantes da cúpula se envolveram no escândalo do mensalão. E esperam que a disputa, hoje favorável a Dutra, inclua o debate sobre a necessidade de diferenciar os interesses do PT e os do governo Lula.
— As eleições internas estão aí, e existe um grupo, ao qual me integro, que se opõe a uma postura de submissão e apoio cego a qualquer iniciativa do governo, especialmente no campo político. Às vezes é preciso discordar do governo que, em nome da governabilidade, toma um rumo que não é o do partido — afirma o deputado Antonio Carlos Biscaia (RJ), que apoia a candidatura de José Eduardo Cardozo (SP).
‘O PT não está a reboque do governo"
Um dos fundadores do PT e integrante da corrente Movimento PT, que tem como candidato à presidência do partido o deputado Geraldo Magela (DF), o deputado Fernando Ferro (PE) diz que a atual crise parece a reedição do filme de 2005, quando foi anunciada a morte do partido: — A conta está sendo cobrada basicamente do PT. É preciso uma reflexão séria. As denúncias têm de ser investigadas. O presidente Lula tem suas razões, que são razões de governo, e são diferentes das razões do PT.
Maioria no partido, os integrantes do antigo Campo Majoritário ou de tendências que apoiam Dutra negam que o PT viva uma crise. Para eles, está em jogo não um debate ético, mas político, porque há uma ação da oposição para afetar a candidatura Dilma. Insistem que não há como não priorizar a aliança com o PMDB, que é estratégica para 2010, e negam qualquer ato de obediência cega ao Planalto. Para Dutra, a crise é localizada no Senado e não influirá nas eleições internas: — O PT não está a reboque do governo.
O PT defende o que o governo está defendendo.
Dutra enfatiza que o PT no Senado sempre foi pela apuração de denúncias, mas que o partido entendeu que o Conselho de Ética não era o local adequado: — No Conselho, virou uma disputa política, na medida em que o DEM , que votou na eleição do Sarney, adotou uma postura de oposição. Por isso, o PT também agiu politicamente. No Senado não há um debate ético, mas político.
O líder do PT na Câmara, Cândido Vaccarezza (SP), afirma que, apesar dos últimos acontecimentos, o partido nunca esteve tão unido: — O presidente Berzoini fez uma nota (em defesa do arquivamento das denúncias contra Sarney) e não teve um membro do Diretório Nacional que a tenha questionado. Isso é inusitado no PT. Falar em submissão cega do PT é uma bobagem! O que há é uma aliança positiva, que tem maioria na Câmara e no Senado e que dá estabilidade ao governo. Nenhum partido tem mais moral do que o PT para defender a ética na política.
Defensor ferrenho do governo e da candidatura Dilma, o deputado Gilmar Machado (MG) lamenta a saída de figuras como Marina Silva (AC) e Flávio Arns (PR) do partido. Para ele, a pauta da eleição de novembro incluirá a conduta do PT.
— Deixamos claro que a prioridade era o PMDB. Fizemos essa opção, e não escondemos de ninguém — disse Machado, que apoia Cardozo.
Apontado como um dos mais críticos no PT desde o mensalão, o exprefeito de Porto Alegre Raul Pont (RS) condena a aliança com o PMDB: — A situação no Senado é resultado direto do sistema eleitoral. As alianças são espúrias, sem identidade e, neste caso, estamos no governo e somos reféns de um sistema que não temos controle.
O raciocínio do presidente Lula é o de que ruim com Sarney, pior sem ele. Entendo, mas o PT não pode ficar refém desse pragmatismo.
O g o vernador da Bahia, Jaques Wagner, diz que há uma luta política subjacente a um problema no Senado, que tem que ser investigado. Mas alerta que não pode haver ingenuidade.
— Às vezes, tenta-se tomar, a partir de um problema, a bandeira da ética, como se fosse patrimônio de um lado ou de outro. Esta deve ser a bandeira de todos os partidos. Não reconheço ninguém, nem do meu partido nem dos outros, como dono do patrimônio da ética. Esta é uma coisa anterior à formação partidária.
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