Duas unanimidades inéditas e inesperadas no âmbito da ONU desmentem categoricamente a doutrina da inevitabilidade do conflito entre as civilizações proposta em 1993 pelo cientista político Samuel Huntington. O déspota líbio Muamar Qadafi que sempre encarnou a tese da impossibilidade do convívio entre o Islã e civilização ocidental está sendo o agente da sua negação.
No sábado (26/2), o Conselho de Segurança da ONU sob a presidência da brasileira Maria Luiza Viotti aprovou por unanimidade pesadas sanções contra o governo e os dirigentes líbios. Três dias depois, os 192 membros que compõem a Assembleia-Geral aprovaram sem um único voto contra a expulsão da Líbia do Conselho de Direitos Humanos. Até mesmo o representante líbio (rompido recentemente com Qadafi) votou contra o seu país.
Enquanto a Líbia mergulha numa sangrenta guerra civil, a humanidade representada pela sociedade mundial afirma e reafirma que há pontos de convergência, valores comuns, anseios e horrores assemelhados. A ruptura não está à espreita, há espaço para aproximações.
Estabelecido o primado da vida sobre a morte é possível construir um núcleo de consensos, independente das culturas, sistemas políticos, conceitos morais, ritos religiosos, tradições e costumes. A diversidade não nos conduz obrigatoriamente ao abismo, ao contrário, as diferenças são um estímulo para a construção de pontes.
O apalhaçado e cínico tirano - certamente um dos inspiradores da tese de Huntington - forçou uma situação-limite, letal, sem perceber que ao mesmo tempo incubava os anticorpos capazes de reverter a inexorabilidade do confronto. Mais parecido com Benito Mussolini do que com Adolf Hitler, o coronel Qadafi faz parte do mesmo elenco de bestas-feras cuja brutalidade é tamanha que automaticamente desperta os mais recônditos instintos de sobrevivência e decência.
Os ventos de mudança que sopram no mundo árabe não são fenômenos isolados, nem devem ser vistos como exclusivamente árabes, mediterrâneos ou islâmicos. Chegaram ao Irã que está na Ásia Central e não é árabe. Podem seguir na direção do Extremo Oriente ou dar uma volta e contagiar a Venezuela.
Este sopro não está sendo produzido pelas novas tecnologias de informação, nada tem a ver com Bill Gates ou Steve Jobs. Serve-se das suas maquinetas da mesma forma que no passado, em seguida ao Renascimento, a revolução protestante de Martinho Lutero dividiu a Europa graças ao poder das prensas e tipos móveis desenvolvidos por Johann Gutenberg na Alemanha.
O Choque das civilizações, a mais conhecida obra de Huntington, levou a ONU a criar em 2005, por sugestão do premiê espanhol José Luiz Rodriguez Zapatero, a Aliança das Civilizações que hoje conta com 100 países. E na mesma Líbia onde em 1941 e 1942 travaram-se as colossais batalhas que reverteram os triunfos iniciais do nazi-fascismo as forças de Qadafi ajudadas por mercenários massacram aqueles que ousaram rebelar-se contra ele. Quanto mais sangue for derramado, maior o clamor, mais amplos os vínculos para escorraçá-lo.
O mundo é mais igual e mais unido do que parece.
» Alberto Dines é jornalista
FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)
No sábado (26/2), o Conselho de Segurança da ONU sob a presidência da brasileira Maria Luiza Viotti aprovou por unanimidade pesadas sanções contra o governo e os dirigentes líbios. Três dias depois, os 192 membros que compõem a Assembleia-Geral aprovaram sem um único voto contra a expulsão da Líbia do Conselho de Direitos Humanos. Até mesmo o representante líbio (rompido recentemente com Qadafi) votou contra o seu país.
Enquanto a Líbia mergulha numa sangrenta guerra civil, a humanidade representada pela sociedade mundial afirma e reafirma que há pontos de convergência, valores comuns, anseios e horrores assemelhados. A ruptura não está à espreita, há espaço para aproximações.
Estabelecido o primado da vida sobre a morte é possível construir um núcleo de consensos, independente das culturas, sistemas políticos, conceitos morais, ritos religiosos, tradições e costumes. A diversidade não nos conduz obrigatoriamente ao abismo, ao contrário, as diferenças são um estímulo para a construção de pontes.
O apalhaçado e cínico tirano - certamente um dos inspiradores da tese de Huntington - forçou uma situação-limite, letal, sem perceber que ao mesmo tempo incubava os anticorpos capazes de reverter a inexorabilidade do confronto. Mais parecido com Benito Mussolini do que com Adolf Hitler, o coronel Qadafi faz parte do mesmo elenco de bestas-feras cuja brutalidade é tamanha que automaticamente desperta os mais recônditos instintos de sobrevivência e decência.
Os ventos de mudança que sopram no mundo árabe não são fenômenos isolados, nem devem ser vistos como exclusivamente árabes, mediterrâneos ou islâmicos. Chegaram ao Irã que está na Ásia Central e não é árabe. Podem seguir na direção do Extremo Oriente ou dar uma volta e contagiar a Venezuela.
Este sopro não está sendo produzido pelas novas tecnologias de informação, nada tem a ver com Bill Gates ou Steve Jobs. Serve-se das suas maquinetas da mesma forma que no passado, em seguida ao Renascimento, a revolução protestante de Martinho Lutero dividiu a Europa graças ao poder das prensas e tipos móveis desenvolvidos por Johann Gutenberg na Alemanha.
O Choque das civilizações, a mais conhecida obra de Huntington, levou a ONU a criar em 2005, por sugestão do premiê espanhol José Luiz Rodriguez Zapatero, a Aliança das Civilizações que hoje conta com 100 países. E na mesma Líbia onde em 1941 e 1942 travaram-se as colossais batalhas que reverteram os triunfos iniciais do nazi-fascismo as forças de Qadafi ajudadas por mercenários massacram aqueles que ousaram rebelar-se contra ele. Quanto mais sangue for derramado, maior o clamor, mais amplos os vínculos para escorraçá-lo.
O mundo é mais igual e mais unido do que parece.
» Alberto Dines é jornalista
FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)
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