O panorama mundial lembra o que diziam de Mahler as línguas ferinas de Viena: que ele não sabia como terminar uma sinfonia. Toda a vez que a orquestra dava a impressão de atingir o clímax, a música recomeçava do zero.
Se olharmos para o mundo ao redor é um pouco isso o que vemos. Nos EUA a crise brinca de criar falsas esperanças: a recuperação do emprego e o aumento de produção de um mês são desmentidos no seguinte.
Na Europa, a alternância de quebra-não quebra refaz, o tempo todo, o percurso circular Irlanda-Grécia-Portugal, com a Espanha esperando o turno.
Na diplomacia de Obama, dois problemas foram no início separados do resto para serem confiados a mediadores experientes e consagrados: o de Israel e os palestinos a George Mitchell, e o Paquistão-Afeganistão a Richard Holbrooke.
Dois anos e meio depois, Mitchell renunciou, Holbrooke morreu e ambos os problemas estão piores do que antes.
As duas guerras herdadas de Bush não tiveram melhor sorte. A retirada no Iraque e no Afeganistão não deve enganar ninguém. No fundo, corresponde ao conselho que o jornalista francês Bernard Fall deu aos americanos no Vietnã: "Declarem vitória e caiam fora".
A Primavera Árabe é a mesma coisa: não consegue desabrochar em verão. No Egito, ninguém sabe se os militares deixarão o poder; no Bahrein e no Golfo, a democratização foi firmemente contida.
No Iêmen, na Síria, na Líbia, os governos resistem com graus distintos de êxito. Nem a operação militar da Otan contra Gaddafi logrou superar a indecisão.
O que está acontecendo com o mundo? Uma espécie de reprise do "Anjo Exterminador", de Buñuel, na qual invisível maldição impede os convivas de deixarem a casa? Uma "paz dos cemitérios" como o aparente triunfo da reação sobre as revoluções de 1848, que apenas escondia o lento apodrecimento dos antigos regimes?
As razões são provavelmente tão diversas e complexas como os próprios problemas. Contudo não é arriscado afirmar que a mediocridade das lideranças mundiais e as profundas divisões dentro dos países explicam muito da paralisia atual. Não se diga que a culpa é da crise financeira. A década de 1930 foi muito pior, o que não anulou lideranças fortes e resolutas para o bem e para o mal.
Uma dessas lideranças decisivas era a do ex-diretor do FMI Strauss-Kahn. Os que o viram atuar descrevem como se substituía aos líderes nacionais a fim de coordenar não só a sempre dividida União Europeia, mas até o governo alemão!
Sem lideranças convictas, não saem do lugar negociações vitais das quais depende o futuro do mundo: mudança climática, a Rodada Doha de comércio, a guerra das moedas. Quem acredita ainda na expectativa despertada pelo G20?
Inaugurado em meio a entusiasmo mágico, o destino de Obama é fiel espelho da situação geral. Tendo perdido a iniciativa estratégica, o governo contrasta com implacável oposição de demagogos e lunáticos de direita. Nunca foi tão verdadeira a descrição do poema de Yeats: os melhores carecem de qualquer convicção ao passo que os piores estão cheios de passional intensidade. Não é, convenhamos, receita adequada para permitir revigorar uma posição de liderança.
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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