As empresas brasileiras se debruçam sobre um quadro mutante. Têm que planejar seus investimentos para 2012, mas a crise da Europa cria um ambiente de incerteza, independentemente da área em que atuam. Há chance de que o pior seja evitado, mas nenhuma empresa pode subestimar o risco de um cenário de estresse, na hipótese de haver agravamento da crise externa.
A Petrobras não vai cumprir a previsão de investimentos deste ano e não se espera aumento forte em 2012. A Vale vai investir 11% a menos no ano que vem. A Oi foi a mercado tomar US$1 bilhão em crédito rotativo para formar um colchão de liquidez. A Cyrela olha para 2012 com dois cenários à mesa: um, igual ao ano morno de 2011, e outro, de estresse, com retração de demanda. A Braskem disse que continuará seu ritmo de investimentos em torno de R$1,8 bilhão por ano, mas o presidente da empresa, Carlos Fadigas, teme o efeito indireto:
- A crise mundial está fazendo com que parte da produção não tenha mercado. No nosso setor, essa sobra de produção está sendo despejada em alguns países. O Brasil tem sido vítima de dumping. O que agrava o problema é que alguns estados dão incentivos ao produto importado, com abatimento no ICMS. Em Itajaí, por exemplo, 9% do imposto volta para o importador. A margem da petroquímica é de 9%, 12%.
Fadigas diz que a Braskem está mais preocupada com esse efeito indireto, porque isso é que dificulta a decisão de investir.
Além da retração mundial, tem havido também escassez de financiamento, o mesmo que aconteceu em 2008. Esse é mais um elemento que dificulta o trabalho das empresas de elaborar a estratégia para 2012.
Os setores mais dependentes do mercado externo sentem mais. A Vale já anunciou que vai investir 11% a menos no ano que vem, US$21,4 bilhões contra US$24 bi deste ano. A volatilidade do preço do minério é um dos problemas. No início do ano, a tonelada era negociada a US$180. Com a crise, agora é vendida na faixa de US$120. A mesma coisa acontece com a Petrobras. Se a crise internacional se agravar, o preço do petróleo tende a cair; mas um inesperado em países produtores fará o preço saltar. A empresa trabalha com essa incerteza. A estatal está com problema de geração de caixa, segundo analistas do setor, como o economista Ricardo Corrêa, da Ativa Corretora. A Petrobras teve que importar gasolina a um preço maior do que vendia aqui dentro. Teve que importar álcool também e deve continuar porque o setor sucroalcooleiro está com a produção estagnada.
A siderurgia trabalha com ociosidade de 20 milhões de toneladas no Brasil. No mundo, de 500 milhões. No setor de papel e celulose, nosso maior comprador é a Europa, a fonte da crise.
O assessor econômico da Presidência da Abimaq, Mário Bernardini, conta que o prazo médio de pedidos em carteira do setor de máquinas estava em 22 semanas no início do ano. Hoje, caiu para 17 semanas. Esse indicador mostra quanto tempo as empresas precisam trabalhar para entregar todas as encomendas.
- A crise não é só da Europa, ela chegou aqui e temos que nos preocupar com seus efeitos. Os investimentos estão caindo desde o início do ano. No primeiro trimestre, o ritmo estava crescente; no segundo, forte; no terceiro, estável. No quarto, a tendência é de queda. As maiores empresas, como Petrobras, Vale, foram reduzindo o ritmo. O governo também investiu menos - disse Bernardini.
Fadigas, da Braskem, disse que a conjuntura cria uma situação injusta para o Brasil: o país investiu para se organizar e ter mercado interno, e agora a indústria não está aproveitando as vantagens desse mercado porque temos recebido produção excedente de outros países. A Braskem é a maior do país no setor petroquímico, comprou concorrentes, chega a ter 70% de fatia de mercado em alguns segmentos. Mesmo assim se preocupa.
- Há clientes da empresa que simplesmente estão deixando de produzir no Brasil e, portanto, de comprar de nós matérias-primas. Essa construção do mercado interno foi um longo trabalho: o governo Fernando Henrique tocou a agenda da estabilização, o governo Lula, o da inclusão social, e o da presidente Dilma começa a buscar a eficiência. A indústria brasileira não pode perder esse momento - diz Fadigas.
O faturamento do setor de máquinas e equipamentos cresceu 10% em 2010. Este ano crescerá 6% em termos reais - descontada a inflação - mas o segmento de máquinas-ferramentas está operando com faturamento 40% abaixo do nível de 2008.
- A indústria da transformação está com perspectiva de crescimento zero este ano e recuperação modesta em 2012. Esse não é o ambiente propício para o investimento - disse Bernardini.
No ano, o índice Ibovespa acumula queda de 17%. O valor de mercado das empresas está menor, e, consequentemente, a capacidade de fazer dívidas para investir. Além disso, a oferta de crédito lá fora está menor.
De todos os problemas, o pior é a incerteza que paira sobre 2012. Enquanto não houver uma solução para o euro, as empresas continuarão inseguras em seus investimentos e projeções.
FONTE: O GLOBO
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