Dizem que ele não disse, mas, se tivesse dito, estaria muito bem dito. Falo de Charles de Gaulle e da suposta declaração de que o Brasil não é um país sério. As evidências historiográficas são de que ele jamais proferiu tal frase, mas, se, passados quase 50 anos, a versão ainda prevalece sobre os desmentidos de diplomatas e historiadores, é porque a expressão é boa demais para dispensar um autor da estatura do estadista francês.
A Lei Geral da Copa, que tramita no Congresso, é exemplo dessa pouca seriedade. Ela estabelece um verdadeiro estado de exceção.
Como não promoveremos as melhorias prometidas em mobilidade urbana, cogita-se decretar feriado nos dias de jogos do Brasil e alterar o calendário escolar, inclusive nas 5.553 cidades onde não haverá partidas.
As coisas se tornam institucionalmente mais graves quando analisamos as modificações na legislação exigidas pela Fifa e que o Congresso parece disposto a ceder. No afã de proteger as marcas da entidade, avança-se tanto que direitos e garantias fundamentais são atropelados.
Numa interpretação literal do projeto como está hoje, cartunistas poderão ser presos se fizerem humor com os símbolos da competição e donos de lojas que fiquem no caminho para o estádio não poderão expor em suas vitrines marcas que não patrocinem a competição.
A Fifa tenta também suspender a lei da meia-entrada e a que impede a venda de cerveja em estádios. Nunca achei que essas normas fizessem muito sentido, mas é complicado rifar a legislação nacional para receber um evento de entidade privada.
Sempre espertos, nossos legisladores incluíram no projeto até um minitrem da alegria para ex-jogadores das Copas de 58, 62 e 70.
O pior disso tudo é concluir que o que obteremos em troca dos bilhões que estamos torrando não passa de um conjunto de gambiarras legislativas e puxadinhos de infraestrutura.
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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