Sem apoio do Planalto, movimento retoma "abril vermelho" com ações em SP, PE e MS
Roldão Arruda
Com críticas ao governo da presidente Dilma Rousseff, que teria deixado de lado a execução da reforma agrária, o Movimento dos Sem-Terra (MST) decidiu intensificar as ações do chamado "abril vermelho". No final de semana foram invadidas propriedades rurais nos Estados de São Paulo, Pernambuco e Mato Grosso do Sul.
No município de Sandovalina, na região do Pontal do Paranapanema, extremo oeste de São Paulo, cerca de 600 pessoas estão acampadas desde sábado no interior da Fazenda São Domingos. Sua principal reivindicação é maior agilidade do governo na desapropriação e aquisição de terras para a reforma.
Esta foi a 18.ª vez que os sem-terra invadiram aquela propriedade. Numa dessas invasões, em 1997, houve reação e sete sem-terra foram baleados.
Segundo o MST, a São Domingos faz parte do conjunto de terras do Pontal consideradas áreas devolutas e que , de acordo a lei, devem ser destinadas à reforma agrária. A proprietária, Ana Lúcia Paes, registrou um boletim de ocorrência na delegacia de Sandovalina. O pedido de reintegração de posse deve ser encaminhado hoje à Justiça.
Irregularidades. Em Batayporã, município da região leste do Mato Grosso, divisa com São Paulo, outro grupo de quase 600 homens e mulheres está acampado numa área próxima à sede da Fazenda Boa Esperança. Eles invadiram o imóvel no sábado, exigindo a retomada da implantação de assentamentos no Estado, paralisada desde 2010.
O grupo deve encaminhar hoje uma lista de reivindicação ao superintendente do Incra no Estado, Paulo Cestari Pinheiro.
A suspensão da implantação de assentamentos no Estado ocorreu após a constatação de uma série de irregularidades no Projeto Fazenda Santo Antônio, em Itaquiraí, também na região leste. O Ministério Público Federal interveio e obteve na Justiça Federal a suspensão de novos projetos, até que as regularidades sejam resolvidas.
Segundo Cestari, o cumprimento da ordem judicial pode levar muito tempo. "São casos que exigem pedido de despejo de ocupantes irregulares dos lotes do Incra", disse. "Cada infrator tem plena liberdade de esgotar os recursos para a defesa. São cerca de 30 mil lotes nos 178 assentamentos do Incra no Estado.".
Outra invasão ainda em andamento ocorreu na Fazenda Serra Grande, na região do agreste de Pernambuco. De acordo com o MST, o proprietário da área chamou a Polícia Militar para tentar retirar as famílias à força. Depois de muita negociação, elas deixaram a sede da fazenda e armaram seus barracos numa área próxima. "Vamos continuar resistindo", afirmou Denaide Souza, da coordenação estadual do MST.
Estão previstas mais vinte ocupações de terras em Pernambuco até o final do "abril vermelho", que é realizado todos os anos em memória dos 19 sem-terra que foram mortos no interior do Pará no dia 17 de abril de 1996, no episódio que ficou conhecido como massacre de Eldorado de Carajás. Em 2002, o então presidente Fernando Henrique Cardoso reconheceu aquela data como o Dia Internacional de Luta pela Terra.
Em manifestações que devem ocorrer amanhã em diferentes partes do País, militantes do MST irão lembrar que, 16 anos depois do massacre, ninguém foi preso e a reforma agrária avançou muito pouco. A coordenação nacional do movimento também deverá destacar que o primeiro ano do governo Dilma foi o pior dos últimos 16 anos em termos de assentamentos de famílias de sem-terra.
O cenário não deverá ser muito diferente neste ano. Incra está quase parado, em decorrência do contingenciamento, desde o início do mês, de quase 70% dos recursos destinados ao custeio. Um dos principais efeitos do corte, nos próximos dias, será a redução dos serviços de assistência técnica aos assentamentos da reforma agrária. Contratos já feitos terão que ser cancelados.
O corte contraria a política da própria presidente. Ela tem dito que prefere melhorar a produtividade dos assentamentos existentes a criar outros. Mas, sem assistência técnica, dizem assessores do Incra, não há como falar em produtividade.
Desmobilização. O ritmo de invasões e de ocupações de edifícios neste ano tem sido menor que o dos anteriores. Uma das explicações para isto, segundo especialistas, está no crescimento econômico do País. Com a criação de mais empregos, especialmente na área da construção civil, o MST perdeu parte da sua capacidade de mobilizar pessoas na periferia das cidades.
Colaboraram Angela Lacerda, Sandro Villar e João Naves
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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