O fato de Dilma não levar os antecessores a Roma esta semana indica que deseja ser a estrela do show e promover desde já uma vacina contra o uso de temas religiosos na campanha de 2014. Temas para lá de explorados em 2010
A viagem de Dilma Rousseff ao Vaticano diz mais pelas ausências em sua comitiva do que pelas presenças. Enquanto Lula foi aos funerais de João Paulo II acompanhado de dois dos antecessores, José Sarney e Fernando Henrique Cardoso — Itamar Franco estava lá porque era embaixador do Brasil na Itália —, Dilma foi com os mesmos personagens que sempre a acompanham nos eventos internacionais. Ao mundo da política, fica o reforço do recado passado na posse dos ministros no último sábado: “Eu aprendi que numa coalizão você tem que valorizar as pessoas que contigo estão, que são companheiros que acompanham a gente em uma jornada diuturna e que, portanto, têm que estar com a gente nos bons e nos maus momentos, e nós com eles”. O recado é claro: Dilma daqui para frente estará com os partidos realmente aliados. E com quem mais se mostrar leal e disposto a acompanhá-la na campanha reeleitoral daqui a um ano.
Essa nova marcação do governo deixa para trás os tempos em que a presidente convidava o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso para solenidades no Itamaraty, como o fez logo no início do governo, março de 2011, quando da visita do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, ao Brasil. O convite, à época, foi considerado surpreendente até mesmo pelo PT. Lula, por exemplo, não compareceu ao almoço oferecido a Obama e à primeira-dama Michele, porque não queria se sentar à mesa com FHC. Agora, é Dilma quem evita contato.
A presidente tem lá suas razões para não chamar os antecessores. Afinal, se levasse só Lula ficaria aquela impressão de viagem petista. Se chamasse todos, diluiria a importância política de sua presença no Vaticano. A presidente está num momento em que é bom se mostrar próxima da Igreja, até para evitar que, daqui a um ano, haja uma nova rodada de acusações de defensora intransigente do aborto, como houve em 2010. Em Aparecida do Norte, na festa da Padroeira do Brasil durante o segundo turno, houve inclusive a distribuição de folhetos apócrifos para denegrir a imagem de Dilma enquanto candidata. O resultado foi que, no segundo turno, a presidente passou mais tempo visitando templos e igrejas do que propriamente palanques. Espera-se, dentro do governo, que a próxima temporada eleitoral seja diferente.
Enquanto isso, no Congresso…
Os petistas apreciaram o fato de Dilma não levar os antecessores. Há entre eles a sensação de que a presidente foi uma das responsáveis pelo resgate da imagem do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso pelos tucanos. Afinal, foi depois da carta que ela enviou a Fernando Henrique, parabenizando-o pelos 80 anos, que o PSDB parece ter acordado para quem era, de fato, o maior líder do partido. Agora, para alegria dos petistas, essa fase de o governo levantar os tucanos terminou.
Dilma está cada vez mais ciente de que precisa governar com aqueles que estão dispostos a seguir nesse projeto, leia-se o PMDB de Michel Temer. Os peemedebistas de fato hoje não têm muita alternativa, uma vez que têm a vice presidência da República. Na prática, agem como aquele sujeito que flerta aqui e ali, mas não larga a mulher, no caso o governo Dilma, porque é ela quem lhe sustenta. E como Dilma parece disposta a dividir mesmo o poder, o PMDB está cada vez mais dedicado à manutenção do casamento.
Ainda não se sabe, entretanto, até que ponto Dilma fará essa divisão. Conforme dissemos aqui ontem, a pressão por mais mudanças na equipe e redistribuição dos cargos de segundo escalão será grande. Mas antes de contemplar ainda mais os peemedebistas, Dilma precisará resolver outros problemas, como o PR e o PTB. Os petebistas não estão assim tão fechados com a presidente. Há um grupo em manobras para se aproximar do senador Aécio Neves (PSDB) e outro, representado pelo senador Armando Monteiro, próximo do governador de Pernambuco, Eduardo Campos - que está a cada dia mais à vontade no papel de pré-candidato a presidente, basta ver a desenvoltura com que disse a um grupo de empresários em São Paulo que é possível fazer muito mais do que Dilma está fazendo.
Os desfiles de Eduardo vão servir para que Dilma acelere a definição da reforma. Isso porque os petistas já perceberam que não dá para esperar o tempo passar ou deixar os aliados à deriva serem recolhidos pelo PSB ou pelo PSDB. As apostas na política são as de que em duas semanas a presidente conclui mais uma parte da reformulação, deixando o segundo escalão um pouquinho mais para frente. Afinal, se entregar tudo agora, fica sem cartas para jogar logo ali. E, sabe como é, quem poupa sempre tem algum para aquela emergência. E emergências não vão faltar daqui para frente nesse início da corrida a 2014.
Fonte: Correio Braziliense
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