segunda-feira, 22 de abril de 2013

O general mentiu - Ricardo Noblat

A história desse julgamento ainda não terminou José Dirceu, condenado no caso do mensalão

O que ainda faz o general José Elito Carvalho Siqueira como ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República? O general mentiu ao país a respeito de uma operação de espionagem conduzida pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin). E mentira pública cometida por autoridade é considerado algo de muito grave no chamado mundo civilizado. Motivo de demissão.

NO ÚLTIMO DIA 19 de março, Jérome Cahuzac, ministro francês do Orçamento, pediu demissão do cargo depois que o Ministério Público decidiu investigá-lo por lavagem de dinheiro. Cahuzac levara três meses negando que tivesse uma conta bancária no exterior — o que não constituía crime. Acabou confessando que mentira. Luiz Estevão (PMDB-DF) foi o primeiro senador brasileiro cassado.

NÃO PERDEU o mandato por ter embolsado parte do dinheiro destinado à construção de uma obra pública. Perdeu porque mentiu ao se defender. Richard Nixon, presidente dos Estados Unidos, fez o que pôde para encobrir as ligações do seu governo com o arrombamento do comitê do Partido Democrata no edifício Watergate, em Washington. Renunciou ao mandato depois que se descobriu que mentira.

O JORNAL "0 ESTADO DE S. PAULO" denunciou no último dia 4 que o "governo montara uma operação coordenada pelo GSI e executada pela Abin para monitorar a movimentação sindical no Porto de Suape, em Pernambuco". Lembrou que Eduardo Campos, governador de Pernambuco e aspirante à sucessão de Dilma, opõe-se à medida provisória que retirou dos estados a autonomia para licitar novos terminais de carga. E que por isso se reunira com sindicalistas.

"A AÇÃO ENVOLVE uma equipe de infiltrados no Porto de Suape e a produção de relatórios de inteligência repassados ao general José Elito" informou o jornal. No dia seguinte, o general assinou uma dura nota classificando a reportagem de "irresponsável". E afirmou à certa altura: "É mentirosa a afirmação de que a GSI/Abin tenha montado qualquer operação para monitorar o movimento sindical do Porto de Suape ou qualquer outra instituição do país."

RECENTEMENTE, o jornal teve acesso ao documento que confirma tudo o que o general desmentiu. Simplesmente tudo. O documento Ordem de Missão 022/82105 foi enviado às seções da Abin em 15 estados. A missão: identificar ações grevistas como reação à medida provisória que altera o funcionamento dos portos. O alvo central: sindicalistas ligados à Força Sindical e, por tabela, a Eduardo Campos.

POUCO ANTES DE A missão ter início, "uma equipe de agentes de Brasília percorreu os estados alvo para uma ação de vigilância prévia" segundo o jornal. Pela primeira vez, "a vigilância se valeu de um equipamento de filmagem israelense que permite a transmissão em tempo real e em alta resolução de imagens captadas nos portos"

O GENERAL RECONHECEU a existência do documento, mas ainda assim negou que, ao comentar a primeira reportagem, tivesse mentido. "A gente monitora tudo, assuntos que possam ser de interesse do país" E arrematou: "Não foi um monitoramento de movimento A ou B, mas de cenário"

O GENERAL MENTIU duas vezes, pelo menos: ao classificar de "irresponsável" e de "mentirosa" uma denúncia que sabia ser verdadeira e ao negar depois que mentira a respeito. Se seu amor ao decoro fosse maior do que seu amor #o emprego, não teria mentido. E, uma vez flagrado mentindo, pediria demissão.

Fonte: O Globo

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