O IBGE informou o magro crescimento de 0,6% neste primeiro trimestre. Ao mesmo tempo, o Copom elevou a Selic em 0,5 ponto porcentual, para 8,0%, ampliando a distância do País em relação à taxa de juro básica praticada internacionalmente de 5,6% nos países emergentes e de 0,3% nos países desenvolvidos, com média internacional de 2,8%.
O governo parece perdido no front econômico. A política de desoneração a conta-gotas para setores selecionados, além de gerar distorções, derruba a arrecadação da Previdência Social, que é quem está arcando com a desoneração.
De promessa em promessa, o crescimento não vem e o governo rebaixa sua previsão para este ano de 4,5% inicial para 2,7%.
Além do fracasso para retomar o crescimento, assiste-se ao crescente rombo nas contas externas, consequência do péssimo resultado da balança comercial devido à crise internacional e ao câmbio valorizado para conter a inflação.
É absolutamente necessário parar de ser conduzido pelo fantasma da inflação. Ela é cadente, independentemente da ação do Comitê de Política Monetária (Copom), pois a elevação da Selic não altera o preço dos alimentos in natura, os vilões da inflação. Esse preço é em função das condições climáticas e após o choque de oferta está refluindo na medida em que a safra recorde vai surtindo seus efeitos.
Novo rumo. Chega de intervenções pontuais e soltas na economia. A política econômica deve seguir um plano estratégico que parta do potencial que o País possui, que é seu imenso mercado interno, indústria e serviços diversificada e posição forte na produção de alimentos e de commodities metálicas.
Esse potencial está sendo pouco explorado. O mercado interno permite um nível de consumo bem acima do atual, pois, para adquirir bens, as pessoas têm de pagar um sobrepreço elevado (a parcela de juros embutida no valor a ser adquirido). Esse sobrepreço existe em todo o mundo e é de cerca de 10% nos países emergentes e de 3% nos países desenvolvidos. Aqui é de 90% (!). Esse é o freio que inibe o consumo. Se não for retirado, será impossível explorar o potencial que o mercado interno possui.
Nos cinco anos que antecederam a crise (2004 a 2008), o consumo das famílias contribuiu com 56% do crescimento. Na pós-crise (2009 a 2012), essa contribuição atingiu 70%, devido à retração dos investimentos e continuação da expansão do consumo.
Se é o consumo que explica o crescimento, como fazer para deslanchá-lo e fazer que seja atendido em sua expansão principalmente pela produção de bens e serviços sediados no País? Vejamos inicialmente o consumo.
São dois os motores do consumo: a massa salarial e o crédito. O primeiro retrata o estoque de recursos à disposição das pessoas e o segundo alavanca esse estoque pela via da dilatação do prazo para seu uso.
A massa salarial depende basicamente da política de salário mínimo e da transferência de renda, que turbinaram o aumento da classe C durante o governo Lula.
Evolução dos salários. Esse processo, no entanto, perdeu força. O fraco crescimento ocorrido nos últimos dois anos (1,8%, em média) se encarregou de atenuar a evolução da massa salarial, e o baixo crescimento deste primeiro trimestre já aponta para este ano resultado semelhante ao dos últimos dois anos.
Para retomar ritmo mais forte de expansão da massa salarial não se poderá contar com a forte contribuição do salário mínimo, uma vez que ele será corrigido nos próximos dois anos pela fraca evolução do PIB de dois anos atrás.
Resta como instrumento para elevar essa massa salarial políticas e programas de transferência de renda, que ocorrem pela via: a) da previdência social urbana (60%); b) da previdência rural (17%); c) do seguro-desemprego (10%); d) do Benefício de Prestação Continuada (BPC) - um salário mínimo mensal de benefício a pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais, cuja renda mensal familiar per capita seja inferior a um quarto do salário mínimo (7%); e) dos programas diversos com foco em renda, com destaque para o Bolsa Família (6%).
Quanto ao Bolsa Família, há expansão na direção de excluídos (Programa Brasil sem Miséria) e possibilidade de ampliar o acesso e o valor do benefício. Gastou-se com esse programa apenas R$ 20,5 bilhões em 2012, o equivalente a 1,9% (!) da receita do governo federal. Com juros, a despesa atingiu R$ 147 bilhões, ou seja, mais de sete vezes (!) o Bolsa Família.
Com as infelizes decisões das duas últimas reuniões do Copom de elevar a Selic em 0,75 ponto porcentual, serão despendidos por ano R$ 20,5 bilhões, ou seja, tudo que se gastou com um ano de Bolsa Família. Isso serve para demonstrar que dinheiro existe, mas mal aplicado.
É possível ampliar essas transferências mediante maior abertura da porta de acesso dessas políticas e programas, bem como do valor do benefício.
Crédito. O crédito é a outra mola mestra do consumo. Representa metade do PIB e tem péssima qualidade devido às taxas de juros abusivas ao consumidor e às empresas.
Segundo a Associação Nacional dos Executivos de Finanças Administração e Contabilidade (Anefac), nos últimos anos a taxa de juros para financiamentos de um ano girou em torno de 120% para pessoa física e 60% para pessoa jurídica.
Agora, baixou para o menor patamar histórico de 90% para pessoa física e 45% para pessoa jurídica, devido à redução nos juros praticada pela Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil. As demais instituições financeiras quase nada baixaram seu juros, apesar da queda a Selic ocorrida entre 2012 e neste ano até agora.
Para potencializar o consumo, é necessário reduzir o montante que é desviado para o mercado financeiro, direcionando-o para a economia real.
Câmbio. A melhoria na massa salarial e a redução da taxa de juro ao tomador ampliam o consumo, mas não garantem que essa ampliação seja aproveitada principalmente pela oferta interna. Parte significativa está sendo desviada para a importação. O cenário internacional potencializou a oferta internacional de bens e serviços após a crise de 2008, devido à redução da demanda interna dos países ricos e obrigou-os a desvalorizar suas moedas para redirecionar sua produção para os mercados emergentes.
Como o governo desvalorizou muito pouco o real, o País perdeu competitividade relativamente aos países que depreciaram mais suas moedas, dificultando a exportação e abrindo crescentes rombos nas contas externas.
Há que se desvalorizar o câmbio para R$ 3 por dólar para reduzir as perdas nas contas externas. O governo não pode ficar parado temendo o aumento da inflação. Há que considerar que ela já está caindo, independentemente do Copom, devido ao tombo nos preços dos alimentos in natura e que a inflação passada reduziu o poder de compra das pessoas.
É preciso usar o potencial do mercado interno reduzindo os juros da economia e posicionando o câmbio no nível adequado para fazer frente à dura disputa no mercado internacional. Chega de ficar parado!
Fonte: O Estado de S. Paulo
Nenhum comentário:
Postar um comentário