- O Globo
A decisão liminar da ministra Rosa Weber tem uma importância que vai muito além da própria CPI da Petrobras, que ela autorizou a funcionar com o foco restrito à estatal, como queriam as oposições. O mais relevante mesmo é a defesa da democracia embutida em seu voto, especialmente do “pluralismo político como fundamento do Estado democrático de Direito”, previsto na Constituição.
“Há situações em que a aplicação pura e simples, no processo de decisão política, da regra da maioria resulta em injustiça, na medida em que negam direitos titularizados por indivíduos ou minorias”, ressalta a ministra do Supremo Tribunal Federal.
A ministra se refere ao artigo 58 da Constituição para reafirmar que, “preenchidos os requisitos para a instauração de CPI, o seu conteúdo, (...) com o fato determinado apontado pela minoria parlamentar, não está à disposição da maioria, tampouco das Mesas das Casas Legislativas e de seus presidentes”.
Com isso, ela rebate a tentativa de inviabilizar a CPI pedida pela minoria, acrescentando-se a ela novos focos de investigação: “Na prática, tal procedimento equivale a submeter à deliberação majoritária a própria instauração da comissão nos termos requeridos pelo grupo signatário, o que não encontra respaldo na jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal”.
No Senado, já havia sido registrada pelo senador Francisco Dornelles a inconstitucionalidade da manobra situacionista. O senador do Rio de Janeiro recusou-se a ser o relator do requerimento da CPI, porque “o sexto (existência de cartel no sistema de trens e metrôs de São Paulo e do Distrito Federal) e o sétimo (superfaturamento de convênios e contratos na área de tecnologia da informação) são fatos determinados que não possuem nenhuma conexão com o conjunto de fatos relativos à Petrobras”. São temas que deveriam ser investigados em CPIs distintas, salientou Dornelles.
A ministra Rosa Weber agiu da mesma maneira: indeferiu o requerimento da situação e aceitou o da oposição. Seu argumento para isso foi direto:
“Não é suficiente à garantia constitucional da minoria que se deflagre alguma investigação”, diz a ministra, mas “é preciso respeitar a iniciativa da minoria, expressa em seu requerimento”.
Em seu voto, a ministra Rosa Weber responde às alegações do presidente do Senado, Renan Calheiros, a quem mandou ouvir antes de tomar sua decisão. O presidente do Senado, a exemplo do que fez na nota oficial comentando a decisão da ministra, alega que os regimentos internos do Congresso Nacional, leis internas do Parlamento, “são importantes instrumentos para elucidar a matéria”.
Renan cita o regimento interno da Câmara dos Deputados, que determina que, “na ocorrência de requerimentos com objetos coincidentes, prevalecerá aquele de espectro mais abrangente. É uma premissa bastante sensata e que se aplica ao caso”.
Mas a ministra Rosa Weber esclarece que “o direito constitucional alegado opera acima da esfera regimental; acima e soberanamente. Violação do direito constitucional da minoria não depende do exame de normas regimentais. É o que afirma a jurisprudência desta Suprema Corte, em vários precedentes (...), diante de situação em que a formal observância do regimento interno do Parlamento implicou ofensa à Constituição da República”.
A respeito da independência dos poderes, “um dos pilares das democracias modernas” na argumentação de Renan, a ministra Rosa Weber esclarece que questões internas de outros poderes da República devem ser preservadas, mas, quando, “como no caso dos autos, (está) em jogo a interpretação do texto da Lei Maior, abre-se a jurisdição constitucional, cabendo ao Poder Judiciário exercer o controle da juridicidade
da atividade parlamentar”.
O senador Renan Calheiros diz ainda em sua nota que é preciso evitar “um precedente que implique futuras investigações seletivas, restritivas ou mesmo persecutórias a serviço de maiorias circunstanciais”.
Assim como distorceu o sentido da posição do exministro do STF Paulo Brossard para aceitar a inclusão de assuntos desconexos na CPI — o que o jurista gaúcho nega em seu voto —, Renan Calheiros finge que não sabe que a questão central desta vez é de proteção às minorias, que “maiorias circunstanciais” querem impedir de atuar.
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