- O Estado de S. Paulo
Termina manhã, 2 de agosto, o prazo de quatro anos concedido pela Lei n.º 12.305, de 2010 - a lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) - para os municípios brasileiros apresentarem seus planos diretores de gerenciamento de resíduos e instalarem aterros sanitários adequados. Segundo a Confederação Nacional dos Municípios (CNM), existem hoje 1.360 aterros nos mais de 5 mil municípios do País; o restante, fica implícito, vai para lixões a céu aberto. Mesmo nas cidades com mais de 100 mil habitantes existem em torno de 40 lixões e menos de 250 municípios geram 80% dos resíduos (Estado, 14/5). De acordo com a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), 40% do lixo coletado tem "destinação irregular". Mas sem planos adequados as prefeituras não poderiam receber recursos federais. E, diz a CNM, 61,7% dos municípios não se adequaram às exigências da PNRS.
As prefeituras, ainda uma vez, pediram "mais prazo". E projeto de um deputado no Congresso Nacional o estende por mais oito anos (!). Até o momento em que estas linhas foram escritas - no dia 30/7 - o governo federal, por intermédio da ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, havia dito que não aceitaria a prorrogação (Estado, 14/5). Outras fontes do governo, entretanto, disseram esta semana aos jornais que sim, aceitaria. Se aceitar, o que acontecerá, então, diante desse problema, que já tem ângulos calamitosos, até mesmo em Brasília, onde está o chamado "lixão da Via Estrutural", a 16 quilômetros do Palácio do Planalto?
Em 1992, quando foi secretário de Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia do Distrito Federal, o autor destas linhas tentou implementar um projeto de aterro adequado, usina de compostagem e reciclagem, conjunto habitacional para 1.700 pessoas que já moravam dentro do lixão e operariam a usina, assim como uma usina móvel para resíduos da construção civil. Mas uniram-se forças políticas da extrema esquerda à extrema direita e conseguiram impedir a execução. Hoje o lixão da Estrutural continua lá, com número muito maior de habitantes.
E o problema não é somente lá, está também em cidades como Belém, Porto Velho e outras. O Estado do Rio de Janeiro tem 20 lixões que recebem quase 500 toneladas por dia (O Globo, 4/7). Mais grave ainda, conforme a CNM, 98,2% dos resíduos vão para aterros, mesmo em São Paulo (Folha de S.Paulo, 10/5). A reciclagem não chega a 2%. A Prefeitura está tentando fazer com que 30% dos paulistanos entrem no projeto de reciclagem de restos de alimentos e os transformem em adubo - já estão sendo distribuídas 2 mil composteiras domésticas, nas quais haverá minhocários (há quase 15 anos este articulista viu projeto como esse funcionando muito bem na maioria das casas de Estocolmo, na Suécia). A expectativa é de que cada família possa operar com dois quilos diários de resíduos.
Uma usina de triagem de material separado pelos moradores, inaugurada em Santo Amaro (Estado, 16/7), deverá ser o ponto de partida para um processo que incluirá mais duas até 2016, nas quais operarão, como na primeira, catadores de 21 cooperativas. As mais recentes poderão até separar os resíduos pela sua dimensão, com leitores óticos. E com isso cada uma poderá trabalhar com 250 toneladas diárias, 750 toneladas no total (a região de São Paulo gera cerca de 20 mil toneladas diárias; o Brasil, mais de 200 mil toneladas diárias - mais de um quilo por pessoa/dia, fora os resíduos da construção, que têm uma tonelagem ainda maior). A atual gestão municipal espera chegar ao fim de seu mandato reciclando 10% do lixo.
Muito se caminhará se se levar à prática a chamada lei da logística reversa, que obriga comerciantes de pilhas e baterias, agrotóxicos, óleos lubrificantes, lâmpadas e eletrônicos, entre outros produtos, a receber de volta os resíduos correspondentes, que encaminharão aos produtores para que lhes deem destinação adequada. O certo é que com a coleta seletiva em cada casa, com a compostagem dos resíduos orgânicos e com a reciclagem de lixo seco se pode reduzir para uns 20% a porcentagem de lixo que vai para aterros - o que poderá significar uma economia enorme.
A cidade de São Bernardo do Campo também implantou projeto de coleta seletiva, mas está destinando resíduos à incineração - que, como já foi escrito neste espaço, é um caminho problemático, porque custa muito caro e desperdiça recursos reutilizáveis e/ou recicláveis. Itajaí, em Santa Catarina, entrou pelo mesmo caminho. Mas a cidade paulista de Itu implantou a coleta em toda a cidade, em contêineres, para os quais os moradores de cada residência levam seu lixo.
Estudo do Banco Mundial e da Climate Network, para a Cúpula do Clima que a ONU realizará em setembro, diz que uma política adequada para resíduos no Brasil poderia gerar 110 mil empregos em menos de duas décadas, além de economizar 1% da demanda total de energia no País (Folha de S.Paulo, 25/6). Hoje, diz o trabalho, 42% do que vai para os lixões poderia ir para aterros, onde, com a geração de biogás, se pode produzir energia; e a compostagem do lixo orgânico permite fabricar adubo para canteiros, praças, encostas, etc. Para isso, contudo, seria indispensável a separação doméstica do lixo.
Há situações paradoxais nessa área dos resíduos. Os administradores das cidades que não mantiverem o espaço urbano livre dos resíduos depositado nas lixeiras certamente serão punidos com a desaprovação popular e a perda de votos nas eleições seguintes. Isso, no entanto, não significa que serão beneficiados com mais votos se tiverem uma coleta e destinação adequadas - o cidadão acredita que isso é uma obrigação que já lhe custa caro no IPTU e em outros tributos, o que não é bem o caso. Os lugares da Europa onde políticas de resíduos funcionam cobram de cada casa uma taxa proporcional ao volume de lixo gerado. Mas São Paulo já revogou esse caminho... E agora, com mais prazo para os municípios ou com dois terços deles não cumprindo a PNRS, como será?
Washington Novaes é jornalista
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