• Governo quer determinar quais partes da sociedade civil podem participar do debate durante a campanha eleitoral
- O Globo
Convencida de que "há no Brasil um jogo de pessimismo inadmissível", a presidente Dilma, coadjuvada pela cúpula do PT, parece tentada a reverter o jogo na marra.
O ensejo para desencadear uma operação de intimidação dos "pessimistas" foi o texto, enviado a clientes, em que o Banco Santander repisa a constatação, amplamente discutida na mídia, de que o mercado financeiro tem reagido positivamente à queda de popularidade da presidente. As primeiras reações couberam ao presidente do PT, Rui Falcão, que informou que o comitê da campanha estava avaliando se era o caso de entrar com medida judicial contra o banco, já que o que havia ocorrido era "proibido, porque você não pode fazer manifestações que, por qualquer razão, interfiram na decisão do voto". Com base nesse argumento, Falcão permitiu-se fazer admoestações: "Espero que daqui para a frente nem o Santander, nem nenhuma outra instituição incorra nesse tipo de atividade." ("O Estado de S. Paulo", 26 de julho).
A investida de Falcão foi logo reforçada pelo Planalto. Em entrevista à "Folha de S.Paulo", em 29 de julho, Dilma partiu para cima: "É inadmissível para qualquer país, principalmente um país que é a sétima economia do mundo, aceitar qualquer nível de interferência de qualquer integrante do sistema financeiro, de forma institucional, na atividade eleitoral e política." E acrescentou que não queria antecipar o que faria, mas que teria "uma atitude bastante clara em relação ao banco".
São reações que revelam visão espantosamente autoritária do que deve ser o processo eleitoral numa sociedade democrática. Na encruzilhada política em que o país se encontra, é natural que, entre muitas outras considerações, cada eleitor leve em conta como poderá ser afetado pela evolução da economia nos próximos quatro anos. Para que possa tentar vislumbrar essa evolução, é bom que o eleitor seja exposto a amplo leque de visões prospectivas dos desdobramentos econômicos de diferentes desfechos do processo eleitoral.
Parte desse esforço prospectivo é desenvolvido em instituições acadêmicas e institutos de pesquisa. Mas, goste ou não o governo, grande parte desse esforço é também desenvolvido em departamentos de pesquisa de instituições financeiras, grandes empresas, firmas de consultoria, sindicatos de trabalhadores e órgãos de representação patronal.
Com base na repercussão desse leque variado de visões prospectivas na mídia e nas redes sociais, eleitores formam expectativas sobre a evolução da economia e, em alguma medida, conseguem relativizar o discurso econômico dos candidatos a presidente.
O que Dilma Rousseff e a cúpula do PT estão tentando fazer é interditar parte desse confronto de visões prospectivas. Querem ditar quais segmentos da sociedade civil podem participar desse debate e quais não podem. O que lhes falta é uma Lei (Rui) Falcão que imponha um regime em que a CUT possa brandir à vontade o mantra de que a vitória da oposição é receita certa para arrocho salarial, mas instituições financeiras não possam nem mesmo afirmar que a vitória de Dilma seria deletéria para acionistas da Petrobras e de empresas do setor elétrico.
Melhor faria o Planalto se, refeito do surto de autoritarismo, tentasse entender o que vem alimentando a onda de pessimismo de que se queixa. Logo perceberia que o problema básico é o discurso escapista do governo. Ainda não se tem a menor ideia do que Dilma faria em 2015 para enfrentar o grave quadro de estagflação que o país enfrenta. Para continuar fechada em copas sobre a definição da sua equipe econômica, a presidente vem alegando que, por ser supersticiosa, prefere não antecipar nomes antes de ser reeleita.
Mas esse suposto sigilo esconde um segredo de polichinelo. Quem quer que tenha acompanhado de perto a política econômica nos últimos anos bem sabe que, se reeleita, a presidente não abrirá mão de continuar a controlar pessoalmente a formulação e a condução da política econômica.
É dessa percepção de que nada vai mudar que advém boa parte da onda de pessimismo que tanto incomoda o governo.
Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio
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