- O Estado de S. Paulo
Não é bem verdade que o eleitor goste de debates programáticos. Depende dos debates e dos programas. Se for aquela coisa repetitiva sobre números que ninguém confere e questões fora do alcance dos comuns, realmente a coisa fica maçante. Despertam mais atenção desempenhos de nanicos histriônicos ou de candidatos que, livres das armaduras dos marqueteiros, falam a linguagem normal das pessoas.
Mas se for um bom embate conduzido por quem entende do riscado e não se deixa levar por truques nem se satisfaz com perguntas sem respostas, aí há uma chance de se substituir comparações estéreis entre governos passados, bate-bocas grosseiros e manipulações toscas por um confronto produtivo capaz de levar o eleitor a se decidir pelo melhor. Isso inclui não apenas os candidatos Dilma Rousseff e Aécio Neves, mas também seus apoiadores de maior visibilidade e experiência de governo comprovada. No caso presente há dois ex-presidentes da República no jogo.
Seria de todo útil, por exemplo, se Luiz Inácio da Silva e Fernando Henrique Cardoso aceitassem trocar algo mais que ironias por intermédio da imprensa. Poderiam se sentar frente a frente e abordar todos os temas pertinentes ao interesse nacional. Uma discussão mais elevada e politizada que essa posta a partir da distorção que Lula fez de uma fala de FH.
O tucano externou uma constatação sobre o mapa do resultado do primeiro turno dizendo que o PT cresceu nos grotões onde se concentra o eleitorado com menos escolaridade e menor renda. O petista reagiu dizendo que o adversário havia qualificado os nordestinos como ignorantes e desinformados.
Na tréplica, Fernando Henrique apontou que Lula estava querendo transformar uma categoria do IBGE em insulto e que "daqui a pouco só será ouvido em programas humorísticos". FH fez sociologia onde caberia um pouco mais de prudência política e Lula exercitou sua arte de se apropriar da palavra do outro para criar antagonismos ao seu gosto.
Agora são os pobres e os nordestinos. Como se não houvesse pobres e nordestinos em São Paulo, onde o PT colheu seu mais retumbante fracasso. O partido pôs o mote do preconceito na mesa e saiu acusando o oponente de ser preconceituoso. Estabelece a divisão para em seguida dizer que o adversário quer dividir o País.
O truque é tão ultrapassado e deletério quanto as carcomidas práticas da "velha política" da qual faz parte a manipulação marqueteira que explora dicotomias como essas de pobres contra ricos, sudeste contra nordeste, escolarizados contra iletrados e por aí afora.
Nessa eleição, o que o PT não quer discutir é o fato notório de que a maior parte de seu eleitorado é de dependentes de programas assistenciais. Isso leva o partido a ter clientela e, portanto, à necessidade de mantê-la fiel, necessitada e agradecida.
Na reforma da política caberia um item indispensável: o início do processo civilizatório das campanhas eleitorais. Não precisam ser maçantes, exclusivamente programáticas. Elas podem ser emocionantes, incluir ataques e atacantes. Não necessariamente primitivos e trapaceiros.
Valor do passe. Marina saiu da eleição, mas a eleição não saiu de Marina, como se vê pelas exigências a conta-gotas para apoiar o tucano Aécio Neves. Dá a impressão de querer prolongar os momentos de protagonista vividos no primeiro turno.
Quanto mais o tempo passa, menos valorizado fica o apoio de Marina, uma vez que o eleitorado, conforme demonstram as primeiras pesquisas, já vai se definindo independentemente da posição dos partidos e dos políticos. De ávido por uma palavra da ex-senadora no início da semana passada, o tucano chegou à sexta-feira dizendo que ela ficasse à vontade quanto ao momento e a conveniência de se definir.
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