- O Globo
A presidente Dilma termina o ano com boas perspectivas de resistir no cargo, diante da demonstração de apoio que o presidente do Senado, Renan Calheiros, vem lhe dando, e da divisão da oposição, que muda de estratégia a todo instante, transmitindo à opinião pública a ideia de que está atrás apenas de retomar o poder.
O voto do relator das contas presidenciais de 2014, senador Acir Gurgacz, aprovando-as “com ressalvas”, rejeitando a recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU), tem valor apenas simbólico para o impeachment, já que a denúncia da oposição só foi aceita na parte referente a 2015.
Mas, mesmo assim, abre caminho para a alegação da presidente de que suas contas objeto da denúncia nem foram julgadas ainda, e de que as de 2014 estão em discussão no Congresso já com voto favorável do relator. Será preciso uma rebelião na Comissão Mista do Orçamento, e depois no Congresso, para condenar Dilma.
A avaliação do gesto de apoio pode ser feita pelo papelão a que o senador do PDT se submeteu, citando como “ressalvas” os crimes de responsabilidade de que Dilma é acusada pelo TCU: falta de aderência do cenário econômico-fiscal com o que de fato ocorria na economia; compromissos vencidos e não pagos; e restos a pagar em soma vultosa.
A oposição, em suas idas e vindas, a cada momento em que o impeachment parece mais difícil, joga suas fichas na anulação da eleição pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mas nada impede que retorne à tese inicial se os ventos melhorarem. Mas seus líderes não fazem nada para mudar as condições políticas para o impeachment; ao contrário, jogaram o vice Michel Temer ao mar na primeira análise superficial da decisão do Supremo.
Mesmo com todas as dificuldades decorrentes da crise econômica, e estando neste momento em minoria na Câmara, o governo vem conseguindo ter uma atuação política mais consistente na defesa do mandato da presidente Dilma. Não acredito que tenha sucesso ao final, mesmo que supere o impeachment, pois nada indica que a economia se recuperará nestes próximos três anos, fazendo com que a pressão política permaneça forte.
Mas, abandonando o caminho do impeachment, por considerá-lo “mais estreito” depois da decisão do STF, a oposição já dá por perdida a batalha e abre mão de tentar manter a maioria na formação da Comissão Especial da Câmara, que será eleita pelo voto aberto. E reconhece que o governo está readquirindo poder de barganha.
Também não participa do debate em torno das decisões do Supremo, permitindo que o senador Renan Calheiros atue como se tivesse poderes de barrar liminarmente o processo.
O ex-presidente do STF Ayres Britto, que sempre defendeu a tese de que o Senado não tem essa prerrogativa, acha que nos embargos de declaração o Supremo poderá recolocar a discussão nos trilhos, ressaltando que a Constituição, em seus artigos 51 e 52, define que compete “privativamente” à Câmara “autorizar, por dois terços de seus membros, a instauração de processo contra o presidente e o vice-presidente da República”, e ao Senado, também “privativamente”, processar e julgar.
Portanto, cada uma das Casas tem suas funções definidas como “exclusivas” pela Constituição, sendo impossível ao Senado assumir a tarefa de autorizar ou não o processo, assim como a Câmara não julga o presidente da República.
Também o advogado criminalista Cosmo Ferreira ressalta que o artigo 38 da lei 1.079 de 10 de abril de 1950 define que, no processo e no julgamento do presidente da República e dos ministros de Estado, serão subsidiários, naquilo em que lhes forem aplicáveis, “os regimentos internos da Câmara e do Senado, como o Código de Processo Penal”.
No juízo de admissibilidade a cargo da Comissão, tal qual ocorre no processo criminal, Cosmo Ferreira confirma que “não há espaço para a valoração da prova”. Se ela é robusta ou não, é matéria pertinente ao mérito, a ser enfrentada pelo plenário do Senado, que fará um julgamento, aí, sim, político.
Feliz Natal a todos. A coluna volta a ser publicada no dia 29.
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