segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Austeridade é a promessa dos novos prefeitos

Prefeitos empossados nas capitais trocam anúncio de investimento por discurso de austeridade

Com dificuldades financeiras, os prefeitos que tomaram posse ontem trocaram as promessas de investimentos pelo discurso de austeridade e eficiência. Em Belo Horizonte, Alexandre Kalil disse que cortará gastos e pediu “juízo” aos vereadores. O prefeito de Porto Alegre, Nelson Marchezan Júnior, afirmou que há um “grande risco” de atrasar salários já em janeiro. Em Curitiba, Rafael Greca anunciou corte de 40% da máquina pública.

Promessa só de cortes

• Prefeitos empossados nas capitais trocam anúncio de investimento por discurso de austeridade

Júnia Gama, Eduardo Bresciani | O Globo

-BRASÍLIA- Com dificuldades financeiras e necessidade de cortes de gastos em muitos dos 5.570 municípios do país, os prefeitos que tomaram posse neste primeiro dia de 2017 trocaram as promessas de investimentos pelo discurso da austeridade e da busca de eficiência para otimizar os poucos recursos em caixa. Tom e conteúdo diferentes de circunstâncias do passado recente, quando, quem assumia, vendia otimismo e dias melhores em suas cidades.

Ao menos em janeiro, os prefeitos assumem com certo alívio, após o repasse, por parte do governo federal, de cerca de R$ 5 bilhões distribuídos entre as prefeituras, dinheiro arrecadado com a repatriação de recursos do exterior. No entanto, o reforço é insuficiente no longo prazo, e o Planalto será alvo de pressão para também renegociar as dívidas municipais com a União, a exemplo do que ocorreu com os estados, que conseguiram aprovar projeto sobre o tema no Congresso Nacional.

Desde a simbólica frase “a ordem é: proibido gastar”, pronunciada por Marcelo Crivella, ainda pela manhã, ao assumir o cargo no Rio, a sinalização de prefeitos de capitais por todo o Brasil foi de que 2017 será um ano de dificuldades de caixa. Em São Paulo, o prefeito João Doria (PSDB) destacou ter respeito aos políticos, mas avisou que atuará como “gestor” e “administrador” para dar eficiência à máquina.

Nelson Marchezan Júnior, do PSDB, afirmou, em entrevista logo após assumir como prefeito de Porto Alegre (RS), que “há um grande risco de atrasar salários” de servidores já neste mês de janeiro. Ele disse que, nos próximos dias, pretende apresentar medidas que não serão “soluções fáceis”. Ele venceu a eleição no segundo turno.

O prefeito de Curitiba, Rafael Greca (PMN), prometeu enxugar a máquina em seu discurso de posse. Anunciou a redução de cargos em comissão e prometeu lutar para que sua gestão possa honrar a folha de pagamento dos servidores. Greca volta à prefeitura após 20 anos e fez uma campanha baseada na nostalgia, quando a cidade ganhou notoriedade por ser modelo na área de urbanismo.

— Vamos enxugar a máquina da prefeitura em 40%, reduzir cargos de comissão, lutar para que a prefeitura possa honrar a folha de pagamentos nos próximos anos e, ao mesmo tempo, devolver a eficiência dos serviços públicos — disse o prefeito de Curitiba, em sua posse.

REELEITOS TAMBÉM ACENAM COM AUSTERIDADE
Em Belo Horizonte, o prefeito Alexandre Kalil (PHS), eleito como um “outsider” da política para seu primeiro mandato, disse que pretende cortar gastos desnecessários. Durante sua campanha, o ex-presidente do Atlético Mineiro se apresentou com o slogan “chega de político, é hora de Kalil”. Agora, ele prega o fim do desperdício.

— Governar para quem precisa é governar abrindo mão de cargos, abrindo mão de empregos, abrindo mão de gastos desnecessários — afirmou Alexandre Kalil ao ser empossado.

O peemedebista Iris Rezende, que assume pela quarta vez a prefeitura de Goiânia (GO), reclamou que não sabe a real dívida da prefeitura e que somente após uma semana poderá anunciar medidas na área financeira.

— A comissão (de transição) que trabalhou nesse período não conseguiu chegar a um balanço real de como está a situação. Não sabemos a real dívida da prefeitura. Não sei o dinheiro em caixa e tenho uma semana para conhecer a realidade administrativa para que eu possa fazer as determinações das ações necessárias — afirmou o peemedebista.

Mesmo no discurso de prefeitos reeleitos a crise financeira esteve presente. Edivaldo Holanda Jr. (PDT), de São Luís (MA), prometeu corte de despesas e fusões de secretarias na prefeitura.

— Vamos diminuir as despesas e vamos tratar também da fusão de secretarias e órgãos. Vamos buscar parcerias com os governos estadual e federal e a iniciativa privada para realização de melhorias na cidade e geração de emprego e renda — afirmou Edivaldo.

O pedetista reclamou ainda que os municípios têm perdido receita com a queda de arrecadação e que a cada dia as obrigações dos prefeitos são maiores.

Alguns prefeitos que tomaram posse ontem, em cidades médias do país, anunciaram medidas extremas logo em seus discursos de posse. O prefeito de Montes Claros (MG), Humberto Souto, do PPS, o novo administrador de Petrópolis (RJ), Bernardo Rossi, do PMDB, e Rogério Lisboa, do PR, de Nova Iguaçu, declararam situação de “calamidade financeira”. Essa medida dá mais flexibilidade para as prefeituras negociarem redução de valores de contratos com fornecedores.

Ontem, em entrevista ao GLOBO, o presidente da Associação Brasileira de Municípios (ABM), Eduardo Tadeu Pereira, disse que a capacidade de investimento das prefeituras está “completamente estrangulada” e fez uma previsão pessimista para os municípios. Afirmou que o peso da folha de pagamento dificulta negociações para recursos para investir e que, com a aprovação da PEC do teto de gastos, o dinheiro de convênios com recursos federais para investimentos nas cidades “minguou” e que a tendência é “piorar”.

A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) diz que ao menos 500 prefeituras informaram, ao final de novembro, que os pagamentos de salários de servidores estão com atraso. Também há casos de atraso no pagamento a fornecedores de cerca de oito meses, mecanismo que é utilizado às vezes para que a inflação corroa parte da despesa pendente. A relação entre a dívida e a receita piorou em nove capitais, segundo dados da Secretaria do Tesouro Nacional, revelados ontem pelo GLOBO. Em Cuiabá, Porto Alegre, Manaus, Florianópolis, Recife, Aracaju, Natal, Porto Velho e Belém, a dívida cresceu mais do que a receita entre 2015 e 2016.

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