- Correio Braziliense
Assim como houve uma blindagem no Congresso, via legislação eleitoral, para salvar os grandes partidos, começa a reação do mundo jurídico para blindar a elite política contra a Lava-Jato
As pesquisas de opinião são inequívocas: a corrupção é a principal preocupação dos brasileiros, maior até do que a saúde, a educação e a segurança, cujas mazelas são associadas pelo eleitor à roubalheira dos cofres públicos. Mesmo se a Lava-Jato estivesse com os dias contados — ainda não é o caso —, esse cenário não mudaria até as eleições. O ambiente econômico de estabilidade da moeda, redução de juros e retomada da geração de emprego modesta diante das necessidades do país, faz com que a questão da ética na política venha a ter o mesmo peso que teve para a sociedade o combate à inflação durante o Plano Real. Houve uma mudança de paradigma quanto a isso, quem quiser que se engane.
Esse diagnóstico, porém, não foi capaz de produzir um novo consenso político nacional, como foi a luta contra a inflação, por exemplo. O motivo é o modus operandi da política nacional e o envolvimento das lideranças dos principais partidos do país nos escândalos investigados pela Lava-Jato e outras operações de combate à corrupção. Nesta semana, por exemplo, as investigações chegaram à cúpula do PP, partido que ampliou sua bancada exponencialmente no recente troca-troca partidário. Saltou de 38 deputados eleitos para 53 parlamentares, atrás apenas do PT, que ainda tem a maior bancada, com 60 deputados, mesmo perdendo 9 parlamentares ao longo da atual legislatura.
O PP é a bola da vez nas investigações da Operação Lava-Jato, com a realização de operações de busca e apreensão nos gabinetes e residências do presidente da legenda, senador Ciro Nogueira (PI), e do líder da bancada na Câmara, deputado Dudu da Fonte (PE). O crescimento do PP contrasta com a perda de deputados do MDB, cuja bancada foi reduzida de 65 para 50 deputados, mesmo com o partido no poder, e também do PSDB, que tinha 54 deputados e agora está com 48. Outro partido que cresceu muito no troca-troca foi o DEM, que elegeu 21 deputados e está com 43 representantes, graças à atuação do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ). Uns mais, outros menos, todos têm em comum o envolvimento de ex-presidentes na Operação Lava-Jato.
De certa forma, a cúpula do Congresso conseguiu se blindar na reforma política, que garante vantagem estratégica para os grandes partidos, em termos de tempo de televisão e recursos financeiros, principalmente nas eleições proporcionais; nas eleições majoritárias, as disputas regionais sofrerão grande impacto da Operação Lava-Jato, mas os políticos enrolados nas investigações poderão concorrer à Câmara dos Deputados e, assim, tentar permanecer no Congresso. O catalisador da insatisfação popular com a corrupção, porém, é a disputa para presidente da República. Esse é o rubicão para quem quiser se eleger. Seja porque pode ficar fora da disputa por causa de condenações, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seja em razão do ambiente tóxico de seu próprio partido, como está acontecendo com o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin.
Blindagem
Assim como houve uma blindagem no Congresso, via legislação eleitoral, para salvar os grandes partidos, começa uma forte reação do mundo jurídico para blindar a elite política do país em relação às condenações da própria Lava-Jato. As grandes bancas de advocacia reagem com astúcia processual e poder de articulação junto aos tribunais, principalmente no Supremo, onde se trava hoje um grande choque de concepções: o velho Direito romano-germânico, que serve de alicerce para as nossas instituições, está sendo confrontado pelo “americanismo” de jovens juízes e promotores, inspirados no Direito anglo-saxão. A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) lidera a reação garantista; por isso, é chamada de Jardim do Éden pelos advogados.
Há duas linhas de frente nesse embate. Uma é o caso de Lula, que está preso em Curitiba e impedido de disputar as eleições por causa da Lei da Ficha Limpa. A disputa se dá em torno da questão da execução da pena após condenação em segunda instância, jurisprudência que já foi objeto de três decisões do Supremo, mas que pode ser revista se o assunto for posto novamente em pauta devido à correlação de forças existente na Corte.
A outra frente é a discussão sobre a amplitude da Operação Lava-Jato, da qual o juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara de Curitiba, em primeira instância, e o ministro-relator Edson Fachin, no Supremo Tribunal Federal (STF), são responsáveis. Ambos estão sendo questionados como “juízes naturais”, o primeiro em relação às investigações que não estão diretamente ligadas ao escândalo da Petrobras; o segundo, quanto aos pedidos de habeas corpus, recursos e embargos dos réus e condenados da Lava-Jato. Esse embate vem se repetindo nas últimas semanas e deve se intensificar depois de setembro, quando Dias Toffoli assumirá a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF); em compensação, a ministra Cármen Lúcia, atual presidente da Corte, ocupará seu lugar na Segunda Turma, que passaria a ser uma espécie de “purgatório”.
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