- Valor Econômico
O PT e a 2ª turma convergiram nos movimentos
A carta foi dividida em sete itens e ditada aos advogados. Na reunião de segunda-feira do diretório nacional, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, leu a missiva que lhe foi dirigida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a partir de sua cela em Curitiba.
Parte da leitura foi reproduzida em rede social de um dirigente petista. Na edição, a carta começa a partir da metade do quarto item: "O PT deve ficar totalmente à vontade para tomar qualquer decisão porque 2018 é muito importante para o PT, para a esquerda e para a democracia. Para mim, quero minha liberdade".
Numa tradução livre de seu português cristalino, o ex-presidente implorou: "Não tenho que ser candidato, mas me tirem daqui". O PT, no entanto, logo divulgaria uma nota oficial para reafirmar a candidatura de Lula.
No item seguinte da carta, num exercício de puro lulismo, o ex-presidente disse quase o contrário: "Tem insinuações de que se eu não for candidato, se não tiver holofotes, se não falar contra minha condenação, será mais fácil uma condenação a meu favor. A Suprema Corte não tem que me absolver porque sou candidato ou porque vou ficar bonzinho. Tem que votar porque sou inocente e porque tem que recuperar o papel constitucional que é ser garantia do cumprimento da Constituição".
O PT não divulga a íntegra do texto. Em três itens e meio de uma carta cabe tudo. De correligionários que o ex-presidente gostaria de ver como advogados inscritos no seu processo judicial, a candidaturas estaduais que não devem ser relegadas em nome da disputa nacional, mas a direção do partido se limita a informar que o ex-presidente se limitou a fazer saudações e referendou a senadora Gleisi Hoffman como a única porta-voz petista.
No dia seguinte à divulgação da carta do ex-presidente, a segunda turma do Supremo Tribunal Federal decidiu, por três votos (Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandovski) a dois (Celso de Mello e Edson Fachin), tirar, da alçada do juiz Sérgio Moro, os trechos relativos à delação da Odebrecht mencionados nas ações referentes ao ex-presidente que tramitam na 13a Vara da Justiça Federal de Curitiba.
Há beneficiários da decisão da segunda turma mais poderosos do que o ex-presidente, a começar do atual titular do cargo e futuro réu da Lava-jato, Michel Temer. Há ainda interesses que extrapolam o rol de políticos atingidos pela operação e que podem a vir a ser afetados pelos rumos que parecem tomar a Lava-jato.
A primeira consequência de um Lula não apenas impedido de se candidatar mas também de operar politicamente foi a ascensão do ex-ministro Joaquim Barbosa, nome que amedronta não apenas o PT mas também parte da magistratura e grandes bancas de advocacia.
Ainda há muitos revezes possíveis à decisão da segunda turma, mas debite-se a liderança do movimento mais à habilidade silente de Dias Toffoli do que à verborragia recalcitrante do ministro que lhe faz par. Toffoli tem pressa. Sua ascensão à presidência da Corte em setembro levará de volta àquela turma a atual titular, composição que, numa votação como a de ontem, por exemplo, poderia até manter o placar, só que no sentido contrário.
Redistribuir a Lava-jato para varas federais Brasil afora é um movimento menos afrontoso à opinião pública do que, por exemplo, reverter a execução da pena em segunda instância. Combinada com o fim do foro privilegiado, a ser votado na próxima semana com maioria já consolidada a favor, a redistribuição sempre poderá ser defendida como uma aposta na autonomia e na independência da justiça federal. Se há um Judiciário disposto a romper o que o ministro Luis Roberto Barroso chamou de 'pacto oligárquico', este não poderia ser um movimento restrito a Curitiba de Moro ou ao Rio de Marcelo Bretas.
Ao liderar este movimento, Toffoli também parece determinado a descomprimir as pressões sobre a cadeira que virá a assumir. Sobre a Corte que 'empurra a história', na definição de Barroso, paira crescente suspeita de que, para resolver o secular problema da separação dos poderes de uma república em frangalhos, o Supremo resolveu concentrá-los num só.
Se o movimento no Judiciário ainda comporta idas e vindas, na política parece ter emitido o sinal de que a ficha do PT, finalmente, começa a cair. O manifesto das direções partidárias na semana passada em torno de uma plataforma eleitoral comum, a carta de Lula ao diretório nacional do PT e a reunião do ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, e do ex-governador Ciro Gomes, com economistas sinalizam a disposição do partido de romper o isolamento que o samba de uma nota só da candidatura Lula lhe impôs.
Um sinal de que a carta de Lula começou a fazer efeito foi a reação interna ao encontro entre Haddad e Ciro, menos estridente do que aquela que marcou a primeira vez em que um encontro entre ambos foi noticiado. Parece ter soado o alerta no partido de que, se a aproximação entre PT e PDT for obstruída, Joaquim Barbosa corre o risco de atropelar ambos.
A tentativa de associar o ex-ministro a uma plataforma de centro-direita, no entanto, atende à necessidade do PT de não fraturar seu campo político mas revela um partido ainda desnorteado pelo isolamento de sua principal liderança. É uma associação que afronta tanto as concepções do pré-candidato quanto as resoluções tiradas pelo PSB em congresso partidário e com as quais os próprios petistas parecem ter convergido em manifesto da semana passada.
Entre as posições conhecidas do ex-ministro está sua crítica ao financiamento estatal para empresas que pretendam adquirir ativos públicos. Se esta for uma posição de centro-direita, Marcelo Odebrecht deve voltar para a cadeia porque é um periculoso extremista de esquerda.
Biotônico carcerário
A aposta de que o senador Ciro Nogueira abrirá mão da presidência do PP no momento em que o partido está no ápice de seu poder, desconhece a visão de longo prazo da categoria. O ex-deputado Roberto Jefferson já foi condenado e preso. Continua dando todas as cartas no PTB. Idem para o ex-deputado Waldemar Costa Neto. Tem ainda mais poder do que antes. Ambos continuam a coordenar os consórcios de seus partidos no poder, robustecidos durante o período em que estiveram sob custódia judicial.
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