- O Globo
As crises que assombram o novo governo têm um traço peculiar: não precisam da ajuda da oposição. Todas têm origem no campo bolsonarista
As crises que assombram o governo Bolsonaro têm uma característica peculiar: não precisam da ajuda da oposição.
No discurso de posse, o presidente indicou que manteria o clima de confronto com a esquerda. No entanto, seus adversários na eleição nem lhe fizeram cócegas até aqui.
Todos os fantasmas que rondam o Planalto surgiram no campo governista. A maior parte foi fabricada pelos filhos e pelo partido de Bolsonaro. O resto deve a existência ao próprio presidente, que demonstra dificuldade para se adaptar ao novo papel.
Os herdeiros lideram o ranking das trapalhadas. Mesmo sem cargos no governo, Zero Um, Zero Dois e Zero Três têm criado múltiplos embaraços para a gestão do pai.
Flávio, o primogênito, envolveu o nome da família numa investigação ruidosa no Rio. É suspeito de embolsar salários de assessores e cultivar relações com chefes de milícia.
Carlos, o filho do meio, foi pivô da queda de um ministro com 48 dias de governo. Sua ofensiva contra Gustavo Bebianno ainda pode deixar sequelas. Demitido, ele levou para casa os arquivos da campanha e uma coleção de áudios gravados pelo ex-chefe.
Eduardo, o caçula do trio, começou a fazer barulho antes da posse. Além de ameaçar fechar o Supremo Tribunal Federal com “um soldado e um cabo”, semeou discórdia no PSL ao descrever colegas como “favelados”. Na sexta-feira, usou as redes sociais para criticar o Exército, que tem atuado como fiador do novo regime.
Conhecido como partido nanico até fechar negócio com Bolsonaro, o PSL é outra usina de encrencas. Já está claro que a sigla lançou candidatas laranjas em Minas e Pernambuco. Agora pipocam suspeitas em outros estados.
Na Câmara, o partido paga pela inexperiência e pela desarticulação. Apesar de formarem a maior bancada, ao lado do PT, os deputados do PSL parecem mais interessados em gravar vídeos para as redes sociais. Na terça passada, levaram um baile do centrão e assistiram, atônitos, à primeira derrota do governo.
Bolsonaro já deu sinais de que não precisaria de ajuda para se embananar. Na primeira semana, ele foi desmentido por auxiliares depois de anunciar um decreto inexistente e admitir a instalação de uma base americana no Brasil. No caso Bebianno, seu temperamento elevou a temperatura da crise, em vez de esfriá-la.
Num cenário normal, o novo governo encontraria condições mais favoráveis para se organizar. O presidente venceu a eleição por ampla margem. O novo Congresso é o mais conservador das últimas décadas.
A oposição saiu das urnas desunida. O PT ficou isolado, e outras siglas de esquerda se dispersaram na lógica do “cada um por si”.
O deputado Alessandro Molon, do PSB, assumiu há dez dias o cargo de líder da oposição na Câmara. Ele reconhece que a correlação de forças é desfavorável, mas aposta nos tropeços do bolsonarismo. “Este governo está se enrolando sozinho. Por enquanto, nossa maior tarefa é não atrapalhar”, brinca.
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