Desde que assumiu, há dois anos, prefeito reduziu verbas para os desfiles das escolas de samba
‘Ei, você aí!, me dá um dinheiro aí!, me dá um dinheiro aí!’. Seis décadas depois de lançada, a marchinha composta pelos irmãos Homero, Glauco e Ivan Ferreira, em 1959, soa mais atual do que nunca nos barracões das escolas de samba. Afinal, pode-se dizer que a penúria é um traço comum entre as diferentes bandeiras que passarão este ano pela Marquês de Sapucaí. Desde que o prefeito Marcelo Crivella assumiu, há dois anos, as verbas oficiais para os desfiles encolheram.
Este ano, a prefeitura destinou a cada agremiação do Grupo Especial, que reúne a elite do samba, apenas R$ 500 mil — em 2016, foram R$ 2 milhões. As da Série A (antigo Grupo de Acesso) receberam R$ 250 mil. E o dinheiro só foi liberado às vésperas do carnaval. A título de comparação, a prefeitura de São Paulo deu R$ 1,2 milhão para as grandes escolas, e R$ 783 mil para as do Acesso 1. Ou seja, uma campeoníssima do Rio receberia mais se desfilasse na segunda divisão do samba paulistano.
Crivella diz que é preciso fazer o “desmame” das verbas públicas . “Quem sabe, no ano que vem, este bebê parrudo, de perninhas grossas, já esteja desmamado”, afirmou. É evidente que, num cenário ideal, os desfiles seriam bancados com recursos privados, enquanto as verbas do município ficariam reservadas aos serviços essenciais. Mas não é assim que a bateria toca. Patrocínio no samba sempre existiu. Porém, dança de acordo com o ritmo da economia.
Já houve tempos em que a maior parte dos enredos era patrocinada, o que enchia as escolas de dinheiro e o Sambódromo, de temas que muitas vezes só interessavam aos próprios “mecenas” — a Beija-Flor chegou a enaltecer a sangrenta ditadura da Guiné Equatorial, em troca de R$ 10 milhões. Mas, desde a recessão de 2015/2016, patrocínios para o samba rarearam. Este ano, além da prefeitura, apenas a Light contribui para a festa — está dando R$ 1 milhão para cada agremiação do Grupo Especial por meio da Lei do ICMS.
Desde a inauguração do Sambódromo, em 1984, os desfiles são bancados principalmente com o dinheiro da venda de ingressos e de transmissão da TV. Foi a partir do ano 2000, nas comemorações pelos 500 anos do Descobrimento, que a prefeitura passou a destinar recursos para o espetáculo. É inegável que isso deu um upgrade às apresentações, à medida que fantasias e alegorias se tornaram mais complexas. Ganharam o público e o carnaval.
A prefeitura não está fazendo favor às escolas. O carnaval é o evento mais importante do calendário turístico, ao lado do réveillon. Gera emprego, renda e atrai milhares de visitantes. A Confederação Nacional de Comércio de Bens, Serviços e Turismo estima que este ano a folia movimentará R$ 6,78 bilhões em todo o país. O Rio terá a maior fatia desse bolo: R$ 2,1 bilhões.
Crivella alega que hotéis e restaurantes “não têm 100 mil funcionários aposentados” e nem hospitais e escolas para cuidar. Acontece que, sem o carnaval, cairá o número de turistas, aumentará o desemprego, e haverá ainda menos dinheiro para manter a máquina pública. Não ver isso é viver num mundo de fantasia.
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