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Capitão empoderado
Que mais poderia querer o presidente Jair Bolsonaro com menos de seis meses de governo? Por unanimidade, coisa rara, o Congresso autorizou-o a gastar mais R$ 250 bilhões sem os quais não fecharia as contas do governo deste ano. Foi o tal crédito suplementar aprovado na semana passada.
Até o final de julho, ou na volta do recesso de meio de ano, o Congresso aprovará a reforma da Previdência, apesar de Bolsonaro e do seu pouco empenho para tal. A reforma produzirá efeitos a médio e a longo prazo. Mas no curto influenciará a tomada de decisões para investimentos futuros.
Isso significa que Bolsonaro tem garantido pela frente um período de relativa tranquilidade de pelo menos 9 a 12 meses. Para um governo sem norte seria um ganho e tanto. Quando nada, não precisaria ter pressa em criar novos problemas. Mas quem disse que o capitão sabe ser paciente?
Para espanto de aliados e adversários, ele aproveitou, ontem, uma viagem a São Paulo para lançar-se candidato à reeleição. Sim, nem bem completou seis meses no cargo, e sem que ninguém o provocasse, Bolsonaro disse e repetiu que se o povo quiser ele topa governar por 8 anos.
Daqui por diante, o Congresso e demais instituições da República levarão em conta o que aditiu Bolsonaro quando tiverem que deliberar sobre qualquer coisa. Foi aberta a sucessão presidencial de 2022. E o principal candidato já está em campanha como se viu ontem na Marcha com Jesus.
De colete à prova de bala sob uma camiseta da marcha que reuniu mais de 3 milhões de pessoas na capital paulista, Bolsonaro comportou-se como candidato. No alto de um palanque, em meio a líderes evangélicos, repetiu o gesto de quem atira com uma arma. A plateia delirou. Só faltou pedir votos.
O capitão sente-se cada vez mais forte. Em duas semanas, demitiu quatro generais do seu governo, dois deles ministros. Demitiu o presidente do maior banco de investimento público. Esvaziou os poderes do Chefe da Casa Civil. E viu quem poderia lhe fazer sombra diminuir de estatura.
O ministro Sérgio Moro, da Justiça e da Segurança Pública, foi atingido por denúncias que mancham sua trajetória como juiz. O ministro Paulo Guedes, da Economia, ex-Posto Ipiranga, indicou um nome para substituir Joaquim Levy na presidência do BNDES. Bolsonaro preferiu outro ligado aos seus filhos.
Está em curso uma reforma ministerial que só Bolsonaro conhece a extensão – ele e os garotos, naturalmente, além do guru da família. Desidrata-se a chamada ala militar do governo. Sobrou até para o general Augusto Heleno: o chefe da Agência Brasileira de Informações é agora um homem do presidente.
Ninguém tem mais emprego garantido. E aí de quem contrariar as vontades de Bolsonaro. O aviso vale também para o Congresso. Bolsonaro orientou seus eleitores a pressionarem os deputados para que revoguem a decisão do Senado contrária ao decreto da farra das armas. Os deputados ficaram furiosos.
Tiro de raspão
Falta a bala de prata
Se a ideia por enquanto é apenas aumentar o nervosismo do ex-juiz Sérgio Moro, a divulgação de mais uma conversa, desta vez entre procuradores da Lava Jato à época, certamente produzirá efeito
Moro estava mal acostumado com a condição de figura pública inimputável, paparicado onde pusesse os pés, aspirante a uma vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal e eventual candidato à sucessão de Bolsonaro.
Mas o que ontem veio a público por meio de uma parceria entre o site The Intercept, o jornalista Reinaldo Azevedo e a rádio BAND está muito distante de parecer um tiro mortal. Foi, digamos, um tiro de raspão.
Sabia-se que Moro enviara uma mensagem ao procurador Deltan Dallagnol sugerindo a substituição da procuradora Laura Tessler como representante da Lava Jato em audiência marcada com Lula no caso do tríplex do Guarujá.
O ex-presidente seria interrogado por Moro. Na avaliação dele, Tessler tivera um desempenho fraco em outra audiência. Que fosse trocada por outro procurador. Ou então que fosse treinada para sair-se bem.
Soube-se agora que o Dallagnol discutiu o assunto com o colega Carlos Fernando dos Santos Lima. E que Tessler acabou substituída na audiência com Lula por outros dois procuradores.
É mais uma evidência de que Moro foi tudo menos isento na condução do processo que resultou na condenação de Lula, posterior prisão e impedimento de disputar a eleição presidencial do ano passado.
Moro defendeu-se dizendo que sua mensagem para Dallagnol pode ter sido adulterada. Se não foi, não revelaria nenhum ato ilícito. Só a justiça poderá dizer se o ex-juiz transgrediu a lei. Mas tudo indica que não dirá tão cedo.
De fato, melhor que dê tempo ao The Intercept para que esvazie antes seu estoque de mensagens e de gravações que diz ter contra Moro e procuradores – não só de Curitiba, mas também de outras cidades.
Vida que segue – a de Moro, a inspirar maiores cuidados.
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