quinta-feira, 17 de outubro de 2024

Míriam Leitão - Ideias e métodos do pacote de gastos

O Globo

Medidas visam além do cumprimento da meta de 2025, são estruturais para um equilíbrio mais permanente das contas públicas

As propostas do pacote de corte de gastos, em grande medida, terão que passar pelo Congresso. Algumas são projetos de emenda constitucional, outras de lei ordinária. “Agora serão medidas estruturais mesmo. A gente está falando de revisão estrutural, com exceção de um ou outro ato normativo, porque queremos medidas para valer agora e sempre, com a consciência de que revisão de gastos é atemporal”, me explicou uma fonte do governo. O trabalho começou há algum tempo, então já há um amadurecimento das propostas. O governo não quer que sejam detalhadas antes de serem anunciadas formalmente, para evitar “a morte prematura das propostas”. Mas há itens com impacto forte, há uma que pode chegar a R$ 20 bilhões.

Os ministérios da Fazenda e do Planejamento trabalharam de forma coordenada na preparação do pacote de medidas que vão ser anunciadas em breve. Primeiro, cada ministério fez a sua lista, depois, trocaram páginas. Descobriram que em grande parte coincidiam no alvo do corte, ainda que de vez em quando os caminhos fossem diferentes. O que contam é que tudo foi olhado. Estão no foco gastos de educação e saúde, apesar de não haver mudança no mínimo constitucional. As despesas com os militares, os programas sociais, os valores do Fundeb, do BPC, está tudo sobre a mesa.

Eles evitaram medidas que nunca passariam pelo Congresso porque seria um desgaste inútil. Evitam também temas caros ao presidente Lula como a política de valorização do salário mínimo. Eu havia dito no blog que seguro-desemprego está entre os programas analisados porque a equipe econômica mira também o objetivo de neutralizar o estímulo à rotatividade. O GLOBO apurou que a possibilidade estudada é usar parte da multa do empregador para financiar o seguro-desemprego.

O que a equipe econômica acha é que, com alternativas inteligentes, pode-se propor mudanças que deixem o Congresso confortável para aprovar, e avaliam que da maneira como as medidas têm sido desenhadas, partidos mais à direita do espectro político, mas que fazem parte da base, como o União Brasil, o MDB e o PSD, podem ser convencidos a aprovar. Informam que as medidas não são impopulares, ainda que toquem em quase todos os itens conhecidos de gastos importantes para atingir o objetivo.

Como eu havia dito no blog, a equipe econômica mira um pacote de 0,5% do PIB. O GLOBO apurou R$ 50 bilhões, o que coincide com a informação. A equipe tem tentado evitar as notícias que digam exatamente quais são as medidas para impedir a reação que se forma antecipadamente.

As medidas que afetam os militares já estão sendo discutidas com as Forças Armadas. São três e elas podem chegar a uma economia de R$ 6 bilhões. Uma delas foca o velho tema das filhas dos militares. A ideia é acabar com a possibilidade de pensão, mesmo que isso implique em devolver valores que já foram poupados pelos militares. O item que põe fim aos supersalários na esfera pública é considerado mais importante do ponto de vista moral, do que de economia mesmo, que será entre R$ 3 bilhões e R$ 4 bilhões por ano.

A equipe terá reuniões com o presidente Lula nos próximos dias, e divulgará o pacote ao Congresso até o dia 15 de novembro. Avalia-se que há uma janela política depois das eleições. Apesar de ser o fim do mandato das presidências nas duas casas, a estratégia é falar com os atuais presidentes e também em fevereiro voltar aos eleitos para o próximo mandato e explicar cada uma das propostas que não passarem este ano. A avaliação é que algumas medidas podem ser apensadas a PECs ou a leis já em tramitação.

Para a meta do ano que vem, o governo está contando com o ajuste de R$ 25 bilhões já anunciado de medidas que dependem apenas do Executivo. Com esse ajuste, o Orçamento foi equilibrado para o Congresso. As medidas do pacote são para um equilíbrio mais permanente do que a meta de 2025, segundo me explicaram. Nada será jogado no Congresso, sem conversa anterior.

— Não é para salvar a lavoura de 25, é um projeto estrutural que terá ganhos futuros também para além de 26. Algumas propostas têm impacto de R$ 5 bilhões a R$ 6 bilhões no ano que vem, mas podem ter benefício muito maior com o passar do tempo. Não é só matemática, tem justiça social também — informou uma fonte.

Com essas ideias e métodos a equipe econômica tem trabalhado intensamente com seus técnicos e ministros, foca no corte de despesas.

 

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