quinta-feira, 17 de outubro de 2024

Bruno Boghossian - O ajuste político do corte de gastos

Folha de S. Paulo

Ala do governo defende deixar de fora itens que possam contaminar pacote levado a Lula e ao Congresso

A equipe econômica começou a estabelecer os limites da proposta de corte de gastos que será apresentada nas próximas semanas. A fase atual é uma espécie de ajuste do ajuste. O objetivo é manter as estimativas de redução de despesas, mas descartar pontos considerados impopulares demais e que poderiam contaminar politicamente o pacote.

Um dos alvos principais da discussão é o tamanho da mudança que deve ser proposta para o BPC (Benefício de Prestação Continuada). Uma ala do governo envolvida na elaboração das medidas prefere deixar dois pontos fora do plano: o aumento da idade mínima de acesso ao benefício e o fim da correção dos pagamentos pelo salário mínimo.

O grupo avalia que esses itens nem deveriam ser levados à mesa de Lula. Ainda que todos saibam que o presidente tem o poder de dar a palavra final sobre cada tópico, alguns auxiliares entendem que a simples ideia de um ajuste mais duro no benefício pago a idosos e pessoas com deficiência muito pobres poderia tornar todo o pacote menos palatável.

A mexida, caso essa avaliação prevaleça, teria outro foco: deixar mais nítidos os conceitos de vulnerabilidade que determinam o acesso ao BPC, corrigindo o que o ministro Fernando Haddad chama de distorções, provocadas pela judicialização e pela concessão do benefício a quem não precisa.

O resultado das conversas indicará as escolhas políticas que a equipe econômica deve fazer para enfrentar o desafio do ajuste. Lula seria o primeiro filtro. Embora concorde com a ideia geral de uma revisão de gastos, o presidente faz questão de manifestar sua oposição a um corte amargo para a população de baixa renda.

A calibragem do BPC e a limitação de supersalários do setor público seriam movimentos táticos em busca de um certo equilíbrio. A mesma lógica é direcionada a deputados e senadores que precisam ser convencidos a aprovar as medidas da equipe econômica e, em dois anos, disputar eleições para manter suas cadeiras.

Uma possível decisão antecipada de cortar gordura do pacote carrega um certo risco. Se a proposta final tiver poucos excessos, o governo terá uma margem menor para negociar o texto com o presidente e os parlamentares.

 

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