O Globo
Trump deve mesmo impor o pesado aumento de
tarifas de importação que prometeu. Isso provocará forte elevação de preços
Setembro, conhecidos agora todos os dados,
foi um mês bom para a atividade econômica. Setembro foi também o mês do Rock in Rio.
Não se trata de simples coincidência. Grandes espetáculos movimentam amplos
setores da economia, especialmente serviços: hotéis, restaurantes e bares,
viagens, para citar os mais evidentes.
Há algumas semanas, na Inglaterra, o Banco
Central notou uma inesperada alta na inflação quando se esperava estabilidade.
Procura daqui e dali, a única coisa de diferente que acontecia eram os shows
de Taylor Swift,
por diversas cidades. Era isso mesmo, inflação de serviços.
Por aqui, o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) mostrou sólida expansão de 0,84% em setembro, na comparação com agosto. O número saiu nesta semana. Na comparação com setembro do ano passado, a expansão foi de 5,1%, melhor resultado desde julho de 2022. Todos os setores cresceram: indústria, vendas no varejo, prestação de serviços. E isso combina com os dados do IBGE sobre o mercado de trabalho.
No trimestre encerrado em setembro, o índice
de desemprego caiu para 6%, recorde de baixa. Havia 103 milhões trabalhando,
recorde de alta. O número reúne todos os que trabalham em qualquer condição:
com carteira, sem carteira, por conta própria, empreendendo, nos setores
público e privado. O IBGE mostrou que houve ganho de renda.
Tudo considerado, os analistas começam a
rever suas projeções para todo o ano de 2024. A opinião dominante, fora do
governo, falava em crescimento do PIB pouco
acima dos 3%. Pelas novas análises, a coisa está mais perto dos 3,5% — seria um
bom resultado, superando os 2,9% do ano passado.
Como tem acontecido ao longo deste ano, o
crescimento real da economia brasileira vem se mostrando melhor que as
projeções. Mas há problemas. Digamos, quatro: a inflação em alta, juros
elevados e dívida pública aumentando. O quarto fator é Trump.
A inflação também se encaminha para um nível
mais alto que o esperado. Em 12 meses, corre acima do teto da meta, de 4,5% —
uma margem, por assim dizer, generosa. A meta que o Banco Central deve buscar é
de 3%. Trata-se de um sinal esperado. A economia brasileira, de baixa
produtividade, tem capacidade limitada de crescimento. Produtividade é tirar
mais resultado dos mesmos meios de produção. Sem isso, acontece o seguinte: a
economia chega ao máximo do que consegue produzir e, como a demanda continua
aumentando, os preços sobem.
Aí vem o Banco Central e eleva os juros
justamente para esfriar a economia, reduzir o consumo e investimentos. No
momento, pode-se dizer que o BC continua aumentando a taxa básica de juros, e a
inflação deverá cair lentamente. Ninguém gosta de juros altos. Mas, como mostra
a História do Brasil, a inflação é pior. O momento mais delicado é o atual,
quando os juros já estão subindo, e a inflação ainda permanece alta.
O outro problema — dos grandes — está nas
contas públicas. O final da novela do corte de gastos ficou para depois do G20.
Mas, pelos sinais, a redução de despesas não será suficiente para zerar o
déficit, muito menos para produzir um superávit. Quando tem déficit, o governo
precisa tomar dinheiro emprestado para fechar as contas. Faz isso vendendo
títulos, aqueles do Tesouro Direto por exemplo. O resultado é um aumento da
dívida pública e dos juros que o governo precisa pagar para se financiar. E os
juros pagos nos títulos do governo se espalham por toda a economia. Assim,
juros sobem por causa da inflação e da dívida pública.
E, em janeiro, vem Donald Trump.
Pelas nomeações que já fez — nomes absolutamente fiéis a suas ideias —, ele
deve mesmo impor o pesado aumento de tarifas de importação que prometeu. Isso
provocará forte aumento de preços ao consumidor nos Estados
Unidos. Inflação, portanto. E, com inflação, o Federal Reserve, o
banco central, não poderá reduzir juros como se esperava. Juro alto nos Estados
Unidos atrai capitais, valoriza o dólar.
Eis como tudo nos afeta: real desvalorizado
pelos nossos desequilíbrios internos e pelo cenário externo. Em algum momento,
o crescimento desacelera.
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