quarta-feira, 29 de janeiro de 2025

O que se prevê da relação entre Planalto e Congresso - Fernando Exman

Valor Econômico

Governo pretende ocupar a agenda legislativa e aprovar o máximo de itens da sua pauta prioritária já no primeiro semestre

Eleita a nova cúpula do Congresso no sábado (1º), o governo Lula pretende ocupar a agenda legislativa e aprovar o máximo de itens da sua pauta prioritária já no primeiro semestre. O horizonte a partir de julho é incerto e preocupa.

É preciso logo de saída, portanto, aproveitar o bom relacionamento estabelecido com os novos presidentes da Câmara e do Senado, ainda que hoje sejam distintas as expectativas no Executivo em relação ao deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) e ao senador Davi Alcolumbre (União -AP).

São reconhecidos o controle que Alcolumbre tem do plenário e a sua capacidade de mobilização das bancadas. No entanto, sua adesão à pauta do Planalto dependerá de cada caso, dizem fontes graduadas do governo, ainda que em seu Estado ele tenha se aproximado do PT com vistas à eleição de 2026.

Quanto a Motta, é dada como certa a sua convergência em relação à agenda econômica. A polidez e o traquejo do parlamentar paraibano são famosos. Porém, ainda é desconhecida sua forma de atuar quando sentado na cadeira mais poderosa da Câmara. Logo se saberá.

Já estão elencadas, entre as prioridades do Planalto, a PEC da Segurança e a proposta de emenda constitucional que visa a despolitização das Forças Armadas. Na área econômica, existe a expectativa de concluir a regulamentação da reforma tributária do consumo e aprovar mais uma leva de projetos que melhorem o ambiente de negócios. No front fiscal, permanece a intenção de limitar os supersalários do funcionalismo público e alterar o sistema de proteção social dos militares.

Ao segundo semestre, por enquanto está reservada a discussão sobre a reforma tributária sobre a renda. É o plano para ocupar o noticiário com uma pauta popular, que serviria também de “esquenta” para o ano eleitoral.

Contudo, é crescente a preocupação dos articuladores políticos do governo com o ambiente político em Brasília na segunda metade do ano. Existe grande expectativa em relação ao que emergirá da Operação Overclean e, também, das demais investigações que envolvem as emendas parlamentares ao Orçamento.

Vale lembrar: a Overclean foi deflagrada no dia 10 de dezembro, em uma operação conjunta pela Controladoria-Geral da União (CGU), Polícia Federal (PF), Ministério Público Federal (MPF) e Receita Federal. Teve o objetivo de desarticular uma organização criminosa envolvida em fraudes licitatórias, desvios de recursos públicos, corrupção e lavagem de dinheiro.

Segundo a CGU, ela impactou o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs) na Bahia, entre outros órgãos públicos. Durante o período investigado, a organização movimentou aproximadamente R$ 1,4 bilhão e foi identificado superfaturamento em contratação de obras.

Não tardou para a Justiça Federal enviar o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF). Quando isso ocorre, a conclusão é óbvia, e imediatamente as atenções de todos os Poderes se voltam para o processo: pelo menos um dos suspeitos detém foro privilegiado.

Mas este não é o único procedimento no STF envolvendo as emendas. Como recentemente mostrou o Valor, atualmente há pelo menos 14 procedimentos na Corte que apuram suspeitas relacionadas à execução dessas rubricas orçamentárias. Os casos estão nas mãos dos ministros Kassio Nunes Marques, Luiz Fux, Cristiano Zanin, Gilmar Mendes e Cármen Lúcia, além, é claro, de Flávio Dino.

Quando se fala sobre o tema, é verdade, vem logo à mente a imagem do ministro Flávio Dino. É ele que tem estado à frente das exigências feitas pelo STF ao Congresso para elevar a transparência e rastreabilidade das emendas parlamentares ao Orçamento. São demandas legítimas. E algumas delas podem ser destacadas, como a de que os parlamentares só devem destinar emendas para o Estado ou munício da unidade da federação pelo qual foi eleito, salvo projeto de âmbito nacional.

Outra decisão pediu que a CGU fizesse auditoria em todos os repasses parlamentares. Em outra ocasião, a determinação foi para que as chamadas “emendas Pix” - emendas individuais que permitem a transferência direta de recursos - só poderiam ser liberadas quando observados os requisitos constitucionais da transparência e da rastreabilidade, além de fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU) e da CGU. Também foi feita uma demanda para a restruturação do Portal da Transparência e, em outra ocasião, a Polícia Federal foi acionada para instaurar inquérito e apurar possíveis práticas criminosas na liberação e destinação de emendas parlamentares. Ou seja, mais denúncias podem surgir. E de várias frentes.

Por isso, na visão de interlocutores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, é até positiva essa multiplicidade de relatores no STF. Ela ajuda a dissipar as suspeitas de partidos da base aliada de que existe uma maquinação entre os Poderes Executivo e Judiciário - foram muitas as insinuações sem provas de integrantes do Centrão no sentido de que governo e Dino, que foi ministro da Justiça e Segurança Pública de Lula, poderiam estar atuando de forma coordenada. Não se relativiza, entretanto, o risco que os desdobramentos dessas investigações podem representar para a governabilidade.

 

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