terça-feira, 28 de janeiro de 2025

Um novo imposto para as big techs? - Luiz Cáudio Allemand

Correio Braziliense

A tributação do novo mercado digital tem se tornado preocupação crescente entre os países, pois a atual abordagem tributária internacional permite que as plataformas de tecnologia se beneficiem de uma posição confortável

Vivemos na borda da quarta revolução industrial, na era do conhecimento. Tanto na Europa quanto no Brasil, a denominada "sociedade participativa na era da informação" se baseia na tecnologia, formando uma grande rede hiperconectada.

Essa sociedade é marcada pela expansão tecnológica e, consequentemente, pelo grande volume de dados, tendo como pano de fundo a informação como um ativo de agregação de valor, geradora de riqueza e bem-estar, que lhe garante o desenvolvimento social e econômico, resultante da popularização da internet, da mídia social e de uma revolução tecnológica trazida por ela.

A digitalização da economia, a partir do fenômeno big data, impõem aos governos, o desafio de criar regras para uma economia digital, que exige a implementação de novos instrumentos para atuação fiscal.

O direito tributário possui ainda o desafio de implementar regras que possibilitem a transformação dos ativos, hoje considerados intangíveis, em possibilidades de exigências tributárias, pois, no caso brasileiro, a legislação não regulamenta a transmissão de dados pessoais a título oneroso entre empresas, o que dificulta mais ainda a fiscalização.

A tributação do novo mercado digital tem se tornado preocupação crescente entre os países, pois a atual abordagem tributária internacional permite que as plataformas de tecnologia se beneficiem de uma posição confortável, devido à ausência de regulamentação sobre a tributação relacionada ao tratamento dos dados pessoais dos cidadãos, esses coletados em seus respectivos países, por meio das mídias digitais, que, ao serem vendidos ou utilizados pelas próprias plataformas, transformam-se em inúmeros negócios altamente lucrativos, sem que haja a devida incidência fiscal.

O sistema tributário foi pensado e idealizado para uma sociedade e uma economia menos complexas do que a atual, o que obriga aos países inovarem com um imposto para alcançar as grandes plataformas digitais.

Nesse sentido, com o objetivo de combater a erosão da base tributária na economia digital, a União Europeia tem empenhado-se, nos últimos anos, para encontrar soluções globais, liderando as negociações sobre a tributação internacional dos serviços digitais por meio da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Em outubro de 2023, foi publicado o acordo elaborado por mais de 130 países sobre a tributação das grandes empresas de tecnologia. No entanto, ainda não há um consenso sobre como será implementado o chamado "Pilar 1", proposto pelo projeto para realocar os lucros anuais aos países, onde a transação foi efetivamente realizada.

Já no "Pilar 2", que propõe o comprometimento dos Estados-membros em implementar uma tributação mínima, houve avanços, apesar das dúvidas em relação a questões que envolvem dupla tributação, mecanismos de restituição de impostos e ferramentas fiscais adequadas. Esse progresso, no entanto, tem encontrado grande resistência por parte do governo Trump, conforme evidenciado em seu discurso de posse, no qual afirmou que não se comprometeria com a OCDE no "Acordo Tributário Global",  firmado pelo ex-presidente Biden.

Diante da dificuldade de consenso, em 2020, a Itália começou a exigir o "Digital Service Tax", com uma alíquota de 3%, que incide sobre qualquer empresa digital estrangeira que gere receitas com serviços digitais naquele país, de sorte que, trata-se de uma nova espécie de tributo. Caso a Europa assine o tratado proposto pela OCDE, o "Digital Service Tax",  implementado por países como França e Itália, deverá ser ajustado às novas diretivas.

No Brasil, em dezembro de 2024, foi editada a Lei nº 15.079/2024, que criou o adicional da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL) para se adaptar às Regras Globais Contra a Erosão da Base Tributária, com alíquota de 15% sobre o lucro das multinacionais, uma vez que a reforma tributária não tratou dessa questão.

No cenário internacional, é necessário um acordo entre os países e a consequente transparência fiscal para a fiscalização adequada das gigantes da tecnologia, evitando, assim, a bitributação dos seus lucros em vários países. A Alphabet, proprietária do Google, e a Meta, dona do Facebook, Instagram e WhatsApp, informam, anualmente, faturamentos de bilhões de dólares. No entanto, essas mesmas empresas não efetuam qualquer tipo de cobrança para a utilização das suas plataformas digitais, pois os usuários e seus metadados são seus ativos.

*Advogado, mestre em direito, LL.M. pela Steinbeis University Berlin, diretor jurídico da Fiesp, membro do Conselho Superior de Direito da Fecomercio-SP e presidente da Câmara de Mediação e Arbitragem da Federação das Indústrias do Espírito Santo

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