terça-feira, 28 de janeiro de 2025

Liderança digital - Merval Pereira

O Globo

Tudo indica que o futuro, tanto da esquerda como da direita, se faz longe dos líderes analógicos

O presidente Lula advertiu que talvez não possa disputar a reeleição em 2026 por estratégia política, para se fortalecer ainda mais no PT ou então teme mesmo que a saúde o impeça de governar, como aconteceu com Joe Biden nos Estados Unidos — situação que, aliás, foi citada por ele na conversa que teve com seus principais assessores e ministros?

Em qualquer das hipóteses, a dúvida mostra que os petistas não têm saída a não ser tentar convencê-lo a disputar, mesmo que a derrota se mostre mais provável no momento de encarar as urnas. A pesquisa Quaest divulgada ontem confirma a desconfiança de que o governo Lula não corresponda às expectativas — e já exibe maioria de avaliações negativas.

Paralelamente, a direita brasileira, incentivada pelo novo governo Trump nos Estados Unidos, vê com mais esperança a possibilidade de vitória, mesmo que Bolsonaro, tornado inelegível por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), não dispute a eleição.

Ao contrário dos petistas, que não têm substituto para Lula, a direita tem alternativas e, no momento, a falta de Bolsonaro parece melhorar até suas chances, desde que o escolhido não seja apontado como oposto a ele e possa contar com sua aprovação quando ficar definido que não existe a possibilidade de ele ser anistiado. Não há no PT a possibilidade de existir outra candidatura que não seja a de Lula ou a do escolhido por ele. O único que pode ser flexível, maleável, próximo ao centro e até à direita é Lula. Qualquer outro será considerado extraviado.

A direita pode ter candidatos centristas ou extremistas e terá eleitores para todos os gostos, o que pode abrir uma divisão que favoreça a esquerda. A disputa entre Pablo Marçal e Bolsonaro na recente eleição para prefeito de São Paulo mostrou bem o que pode acontecer em nível nacional. Bolsonaro tem dado sinais de que quer alguém de sua família para substituí-lo, se for o caso. Mas, à medida que a investigação da tentativa de golpe avança, vemos que todos os seus próximos estavam envolvidos e podem ser indiciados.

Os governadores de direita tendem a apoiar o de São Paulo, Tarcísio de Freitas, caso ele seja o ungido por Bolsonaro. Provavelmente teria muitos votos dos que votaram em Lula contra Bolsonaro, mas estão desiludidos. Se não, vários se lançarão, como já anunciou o governador de Goiás, Ronaldo Caiado. Bolsonaro ainda não perdeu o controle da situação política, mas, se insistir em indicar alguém de sua família, poderá se desmoralizar e destruir a possibilidade de a direita voltar ao poder.

Hoje, o maior adversário dos Bolsonaros é o deputado mineiro Nikolas Ferreira, que desponta como liderança renovada da direita, usando com maestria os meios digitais, como ocorreu no caso dos boatos sobre taxação do Pix, em que levou o governo ao corner com mais de 300 milhões de visualizações de um post crítico. O vereador carioca Carlos Bolsonaro, que representa a geração digital do bolsonarismo, perdeu a máquina que montara no Planalto e ficara conhecida por “gabinete do ódio”. Hoje disputa com Marçal e Nikolas a liderança da guerra digital.

Ou melhor, é uma “guerra geracional” no seio da direita brasileira, coisa que não acontece com o PT, que vem sendo atropelado nas campanhas digitais, pois só tem militantes analógicos. A maior prova é que tiveram de ir ao Recife para buscar apoio do prefeito do PSB, João Campos, filho de Eduardo Campos e neto de Miguel Arraes. Ele assumiu a liderança política da esquerda dando a ela um aggiornamento necessário, descolorindo os cabelos no carnaval e usando as plataformas digitais para ampliar seu eleitorado ao divulgar obras. Tudo indica que o futuro, tanto da esquerda como da direita, se faz longe dos líderes analógicos.

 

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