DEU EM O GLOBO
O Brasil tem várias realidades na exportação. Quem exporta matéria-prima com preços em alta está bem; quem exporta manufaturado que depende muito de mão de obra passa aperto. O setor de calçados é o caso típico do segundo grupo. Mesmo assim, exportou até novembro 15 milhões de pares de sapatos a mais. Armínio Fraga propõe uma guerra de guerrilhas contra o Custo Brasil.
Exportadores de qualquer setor, resmungos contra o câmbio à parte, concordam que o maior vilão é o chamado Custo Brasil; nome genérico de uma lista de problemas que vai da burocracia, estrutura tributária à infraestrutura caindo aos pedaços.
Nos últimos dias, o governo brigou contra o dólar baixo comprando moeda nos mercados à vista e futuro, e entidades empresariais repetiram o pedido de elevação de tarifas de importação. Nem as medidas do governo vão evitar que o real permaneça valorizado, nem protecionismo é solução.
O presidente da Abicalçados, Heitor Klein, admite que são dois os problemas: dólar baixo e custo alto. Lamenta que o país tenha perdido tempo na segunda frente:
- Quando o real valia R$2,20, lá em 2005, o Custo Brasil era amenizado pelo ganho de competitividade da moeda. Então o governo teve tempo para reduzir esse custo.
Hoje, um real equivale a US$0,59 - invertendo-se a forma tradicional de olhar, que seria US$1 igual a R$1,68. Se estivesse a R$2,20, um real equivaleria a US$0,45. Nesta diferença, muitos outros competidores ganham espaço do Brasil, porque todo mundo está derrubando preços de produção exatamente para conviver com a fraqueza da moeda de referência.
Mesmo sabendo onde aperta o galo, a indústria de calçados tem caminhado. Até novembro, o setor exportou 129,5 milhões de pares contra 114,9 milhões em 2009. Alta de 12,7%. Em valor, a alta foi de 9,8%. Ano passado houve recuperação do que havia sido perdido na crise.
- Em 2010, exportamos US$1,4 bilhão; em 2008, US$1,8 bilhão. Perdemos, em dois anos, US$900 milhões, mas isso também pela crise nos Estados Unidos e Inglaterra, nossos maiores mercados - diz Klein.
O diretor comercial da Pegada Calçados, Astor Ranfit, empresa que tem fábricas na Bahia e Rio Grande do Sul e exporta para 40 países, dá um flagrante dos dilemas de quem exporta:
- Em janeiro, subimos 10% os preços de nossos exportados. Seis meses atrás, o dólar estava por R$1,80. Neste meio tempo, demos aumento de salário em reais que são puxados pela falta de mão de obra e inflação interna.
Entrevistei o ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, esta semana, e um dos assuntos foi o pedido da indústria por proteção, diante da queda da competitividade pelo real forte demais:
- Também acredito que o câmbio está exageradamente apreciado. O Brasil está caro, na média com outros países. Mas temos uma indústria muito protegida. Melhor seria uma campanha de redução do Custo Brasil. É mais chato, trabalhoso, mas seria bom se o governo tivesse uma planilha gigante, mapeando problemas e atacando um por um. É uma guerra de guerrilhas. Cada setor tentaria tirar seu obstáculo. O trabalho poderia ser coordenado pelo ministro Palocci, do lugar onde está, como Pedro Parente fez na época em que eu estava no governo.
Essa longa lista do que fazer em cada área para reduzir burocracia, entraves, irracionalidades, melhorar a logística e a estrutura tributária trará ganhos mais permanentes. Armínio acha que inventar a cada hora uma medida cambial pode acabar assustando o investidor de longo prazo, do qual precisamos para sustentar o crescimento.
José Augusto de Castro, da AEB, não hesita quando tem que dizer quem sofre mais com o câmbio: setores manufaturados intensivos em mão de obra e capital nacional, como calçados, têxteis e confecções, móveis. Ontem, a Fiesp divulgou que o déficit comercial dos manufaturados chegou a US$70,9 bi em 2010, alta de 95% sobre 2009. As importações cresceram 45%, contra 18% das exportações.
Mesmo assim, há casos espantosos de sucesso. A Grendene, principal exportadora de sapatos do país, conseguiu crescer as exportações no terceiro trimestre de 2010 em 30% em receita, e em 20% no volume, sobre 2009.
- O câmbio atrapalha bastante porque reduz a margem. Temos que agregar valor ao produto e conquistar mercado pelo diferencial da marca - disse Francisco Schmidt, diretor de relações com investidores da Grendene.
Schmidt diz que a concorrência com a China é difícil:
- Temos que atuar em outra faixa de mercado. O Brasil já foi o maior produtor de calçados do mundo, nos anos 70. Hoje, os chineses produzem 10 vezes mais que nós: 10 bilhões de pares contra 800 milhões.
As Havaianas exportam para 80 países. Segundo a diretora de Sandálias da Alpargatas, Carla Schmitzberger, as vendas em dólares cresceram 39% em 2010 e 25% em reais. Sobre 2008, a venda em dólares aumentou 46%. A exportação é 15% da produção total, mas poderia ser 40%.
- Temos enormes desvantagens em relação a outros países. Nossos custos subiram 14% pela valorização do real. O Custo Brasil dificulta produzir, embarcar, exportar. Os problemas de infraestrutura são grandes. Nossas fábricas são no Nordeste e às vezes temos que mandar o produto de caminhão até o porto de Santos - diz Carla.
O presidente da Abit, Fernando Valente Pimentel, diz que o foco tem que ser na redução do custo:
- Nosso câmbio é flutuante e ninguém defende que deixe de ser. O foco tem que ser a redução do custo de produção em reais.
O setor de embalagens, segundo o presidente da Abre, Maurício Groke, não exporta muito, mas está vendo o produto estrangeiro entrar cada vez mais. A importação subiu 57% no primeiro semestre. A base é baixa, mas há preocupação com a tendência. E faz o mesmo rol de reclamação que os outros sobre custos de produção no país.
O Brasil tem várias realidades na exportação. Quem exporta matéria-prima com preços em alta está bem; quem exporta manufaturado que depende muito de mão de obra passa aperto. O setor de calçados é o caso típico do segundo grupo. Mesmo assim, exportou até novembro 15 milhões de pares de sapatos a mais. Armínio Fraga propõe uma guerra de guerrilhas contra o Custo Brasil.
Exportadores de qualquer setor, resmungos contra o câmbio à parte, concordam que o maior vilão é o chamado Custo Brasil; nome genérico de uma lista de problemas que vai da burocracia, estrutura tributária à infraestrutura caindo aos pedaços.
Nos últimos dias, o governo brigou contra o dólar baixo comprando moeda nos mercados à vista e futuro, e entidades empresariais repetiram o pedido de elevação de tarifas de importação. Nem as medidas do governo vão evitar que o real permaneça valorizado, nem protecionismo é solução.
O presidente da Abicalçados, Heitor Klein, admite que são dois os problemas: dólar baixo e custo alto. Lamenta que o país tenha perdido tempo na segunda frente:
- Quando o real valia R$2,20, lá em 2005, o Custo Brasil era amenizado pelo ganho de competitividade da moeda. Então o governo teve tempo para reduzir esse custo.
Hoje, um real equivale a US$0,59 - invertendo-se a forma tradicional de olhar, que seria US$1 igual a R$1,68. Se estivesse a R$2,20, um real equivaleria a US$0,45. Nesta diferença, muitos outros competidores ganham espaço do Brasil, porque todo mundo está derrubando preços de produção exatamente para conviver com a fraqueza da moeda de referência.
Mesmo sabendo onde aperta o galo, a indústria de calçados tem caminhado. Até novembro, o setor exportou 129,5 milhões de pares contra 114,9 milhões em 2009. Alta de 12,7%. Em valor, a alta foi de 9,8%. Ano passado houve recuperação do que havia sido perdido na crise.
- Em 2010, exportamos US$1,4 bilhão; em 2008, US$1,8 bilhão. Perdemos, em dois anos, US$900 milhões, mas isso também pela crise nos Estados Unidos e Inglaterra, nossos maiores mercados - diz Klein.
O diretor comercial da Pegada Calçados, Astor Ranfit, empresa que tem fábricas na Bahia e Rio Grande do Sul e exporta para 40 países, dá um flagrante dos dilemas de quem exporta:
- Em janeiro, subimos 10% os preços de nossos exportados. Seis meses atrás, o dólar estava por R$1,80. Neste meio tempo, demos aumento de salário em reais que são puxados pela falta de mão de obra e inflação interna.
Entrevistei o ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, esta semana, e um dos assuntos foi o pedido da indústria por proteção, diante da queda da competitividade pelo real forte demais:
- Também acredito que o câmbio está exageradamente apreciado. O Brasil está caro, na média com outros países. Mas temos uma indústria muito protegida. Melhor seria uma campanha de redução do Custo Brasil. É mais chato, trabalhoso, mas seria bom se o governo tivesse uma planilha gigante, mapeando problemas e atacando um por um. É uma guerra de guerrilhas. Cada setor tentaria tirar seu obstáculo. O trabalho poderia ser coordenado pelo ministro Palocci, do lugar onde está, como Pedro Parente fez na época em que eu estava no governo.
Essa longa lista do que fazer em cada área para reduzir burocracia, entraves, irracionalidades, melhorar a logística e a estrutura tributária trará ganhos mais permanentes. Armínio acha que inventar a cada hora uma medida cambial pode acabar assustando o investidor de longo prazo, do qual precisamos para sustentar o crescimento.
José Augusto de Castro, da AEB, não hesita quando tem que dizer quem sofre mais com o câmbio: setores manufaturados intensivos em mão de obra e capital nacional, como calçados, têxteis e confecções, móveis. Ontem, a Fiesp divulgou que o déficit comercial dos manufaturados chegou a US$70,9 bi em 2010, alta de 95% sobre 2009. As importações cresceram 45%, contra 18% das exportações.
Mesmo assim, há casos espantosos de sucesso. A Grendene, principal exportadora de sapatos do país, conseguiu crescer as exportações no terceiro trimestre de 2010 em 30% em receita, e em 20% no volume, sobre 2009.
- O câmbio atrapalha bastante porque reduz a margem. Temos que agregar valor ao produto e conquistar mercado pelo diferencial da marca - disse Francisco Schmidt, diretor de relações com investidores da Grendene.
Schmidt diz que a concorrência com a China é difícil:
- Temos que atuar em outra faixa de mercado. O Brasil já foi o maior produtor de calçados do mundo, nos anos 70. Hoje, os chineses produzem 10 vezes mais que nós: 10 bilhões de pares contra 800 milhões.
As Havaianas exportam para 80 países. Segundo a diretora de Sandálias da Alpargatas, Carla Schmitzberger, as vendas em dólares cresceram 39% em 2010 e 25% em reais. Sobre 2008, a venda em dólares aumentou 46%. A exportação é 15% da produção total, mas poderia ser 40%.
- Temos enormes desvantagens em relação a outros países. Nossos custos subiram 14% pela valorização do real. O Custo Brasil dificulta produzir, embarcar, exportar. Os problemas de infraestrutura são grandes. Nossas fábricas são no Nordeste e às vezes temos que mandar o produto de caminhão até o porto de Santos - diz Carla.
O presidente da Abit, Fernando Valente Pimentel, diz que o foco tem que ser na redução do custo:
- Nosso câmbio é flutuante e ninguém defende que deixe de ser. O foco tem que ser a redução do custo de produção em reais.
O setor de embalagens, segundo o presidente da Abre, Maurício Groke, não exporta muito, mas está vendo o produto estrangeiro entrar cada vez mais. A importação subiu 57% no primeiro semestre. A base é baixa, mas há preocupação com a tendência. E faz o mesmo rol de reclamação que os outros sobre custos de produção no país.
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