O sobrenome Papandreou está no dicionário político internacional há três gerações, mas nunca foi tão vilipendiado como este Giorgios, filho e neto de premiês gregos, colocado no pelourinho porque ousou adicionar um ingrediente político na panela de pressão da crise econômica internacional.
Seu pecado: propor um referendo nacional para aprovar o penoso aperto fiscal imposto pela União Europeia como condição para salvar a Grécia do catastrófico calote. Ex-presidente da Internacional Socialista, Papandreou não quis responsabilizar-se sozinho por um sacrifício que penalizaria o país por uma década. Seu raciocínio: se os conterrâneos preferem permanecer como sócios da privilegiada e poderosa federação europeia têm que pagar um preço e acatar suas regras.
Democracia é isso. Berço da filosofia política, matriz da soberania popular, pátria do teatro – sobretudo da tragédia – a república helênica está há cerca de um ano no centro das preocupações mundiais. Passado glorioso, presente periférico, a ponta meridional do Velho Mundo está provocando o maior abalo no magnífico edifício construído ao longo de 60 anos sobre os escombros da Segunda Guerra Mundial. Pela primeira vez um país-membro cogita deixar a comunidade, abrir mão do fortíssimo euro e cuidar da vida de costas para um mundo cada vez mais mundializado.
Como chefe de governo, responsável pela tranquilidade, Papandreou sabe que o seu país não aguenta a tensão da interminável sucessão de greves e manifestações violentas. O páthos – emoção extremada – é essencial na armação de tragédias, porém conviver cotidianamente com ele, é patológico. Cria um estresse insustentável.
Está agora evidente que Papandreou não soube cronometrar e empacotar a ideia do compartilhamento nacional para oferecê-la à dupla Merkel-Sarkozy, timoneiros da União Europeia. Mas ele conhece o passado quase ingovernável do país: a Guerra Fria começou de fato na Grécia, antes de terminada a Segunda Guerra Mundial. Papandreou sabe que juntar por um período prolongado o garrote fiscal e a desordem nas ruas é fórmula infalível para uma convulsão social e, em seguida, para a ruptura institucional.
A União Europeia é desde a sua origem uma construção essencialmente econômica e como tal jamais poderia ser acionada para garantir a governabilidade de um de seus associados. O premiê grego estava pensando no Day After, o tenebroso dia seguinte quando o calote tivesse sido evitado (ou adiado), o país incendiado pelos protestos e ele sozinho na arena das tragédias para apagá-los. Merkel e Sarkozy não pouparam o grego, mas graças a ele doravante passarão a pensar no que pode acontecer com outros meridionais inflamáveis como Itália e Espanha. Papandreou estava atento ao jogo democrático, tentou jogá-lo integralmente. Pagará por isso.
No outro lado do planeta, a presidente Cristina Kirchner fez o contrário: ludibriou o eleitorado. Enlutada e empolgada, prometeu aos argentinos a bonança continuada e uma semana depois da espetacular vitória eleitoral castigou-os com duas drásticas medidas – mudança nas regras para a compra de dólares (a poupança nacional) e o fim de subsídios e o inevitável aumento nos preços de produtos e serviços.
O tango argentino tem algo de trágico: difícil imaginar Papandreou e la Kirchner dançando-o juntos.
Alberto Dines jornalista
FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)
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