domingo, 6 de novembro de 2011

Ministério do Esporte investe R$ 753 mil em pista sem uso

Uma ONG da Bahia, a Fundação de Apoio ao Menos de Feira de Santana, é exemplo do descontrole e da falta de critério na liberação de verbas no Ministério do Esporte, informa o enviado especial Leandro Colon. A entidade, que já levou R$ 60 milhões em convênios, fez pistas de atletismo que estão encalhadas. Uma das ideias que não vingaram é uma pista móvel, que custou R$ 753 mil e está sem uso

Esporte dá R$ 753 mil a pista de "ficção"

Fundação da BA - que em 8 anos recebeu R$ 60 mi da pasta - sugeriu pista móvel de borracha, mas material está encalhado em balcão

Leandro Colon

FEIRA DE SANTANA (BA) - O abandono de 15 mil metros quadrados de borracha destinados a pistas de atletismo simboliza, no interior da Bahia, o descontrole e a falta de critério que tomaram conta do Ministério do Esporte. A pasta abraçou uma ideia mirabolante e "pioneira" de um professor de capoeira e presidente da Fundação de Apoio ao Menor de Feira de Santana (Famfs): transformar pneus velhos em pistas de atletismo.

O resultado está nos galpões da entidade. O material está encalhado e abandonado, conforme verificou a reportagem do Estado na quinta-feira passada.

O professor Antonio Lopes Ribeiro, presidente da Famfs, é parceiro antigo do Ministério do Esporte. Nos últimos oito anos, levou R$ 60 milhões da pasta em convênios dos programas Segundo Tempo e Pintando a Liberdade/Cidadania. Ele é personagem de dois inquéritos no Ministério Público por irregularidades no uso do dinheiro da pasta.

Com o discurso da sustentabilidade, o professor se ofereceu para receber dinheiro do Esporte pela produção, nas dependências de sua entidade, de pistas de atletismo com placas de resíduos de borracha. O ministério topou e, desde 2007, começou a repassar verba para o projeto.

Em 2009, surgiu uma novidade: a fundação recebeu R$ 753 mil para fazer uma pista de atletismo móvel, a "primeira oficial do mundo", segundo palavras do professor Lopes e do site do ministério, e mais outras quatro fixas, todas com pneus velhos. O contrato foi assinado pelo hoje secretário nacional de Esporte Educacional, Wadson Ribeiro.

O presidente da Famfs explicou a proposta ao Estado: "Tive uma ideia de botar uma lona embaixo e sair colando as plaquinhas de borracha. A duração é de 400 anos. Sou meio professor Pardal, fico inventando as coisas. E a pista tem a aprovação da Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt)".

Em resposta por escrito enviada ao jornal, a CBAt desmentiu o presidente da Famfs: "A CBAt desconhece oficialmente a existência dessa pista dita móvel e, de forma oficial, qualquer pista fabricada pela fundação. Nunca tivemos qualquer contato da fundação e não emitimos qualquer documento a respeito".

O dinheiro do Ministério do Esporte foi liberado em 2009 para o projeto e o convênio terminou em novembro de 2010. Um ano depois do fim do contrato, a "pista móvel" não saiu do lugar. Está abandonada, a céu aberto, em meio a poças de águas, desnivelada, com as placas soltas, em volta de um campo de futebol da fundação. E duas das pistas fixas estão encalhadas num galpão da instituição. Ao todo, ambas somam 40 mil placas de borracha em 10 mil metros quadrados.

Mas o descaso não para por aí. A pista "móvel" foi prometida pelo Ministério do Esporte para o Centro Olímpico da Universidade de Brasília (UnB). No dia 26 de outubro, o governo avisou a fundação baiana que cabe à UnB buscar o material em Feira de Santana, a 1.300 quilômetros de Brasília. O transporte da pista móvel custa R$ 100 mil, segundo a assessoria da universidade - e, por enquanto, não há dinheiro para ir buscá-la. "A universidade está tentando angariar fundos", disse a assessoria.

Inquéritos. A Famfs e seu presidente estão na mira de dois procuradores da República de Feira de Santana. Hoje, há dois inquéritos abertos pelo Ministério Público Federal para investigar os desvios de recursos e outras irregularidades nos convênios com o Ministério do Esporte.

O Estado teve acesso aos autos. Eles estão baseados em auditorias da Controladoria-Geral da União (CGU) e do Tribunal de Contas da União (TCU). As análises apontam fraudes nas prestações de contas, com o uso de "notas fiscais inidôneas", falta de comprovação de despesas, execução dos objetivos do contrato, burla nas licitações, entre outras coisas. O professor Lopes nega as acusações.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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