A decisão do Supremo Tribunal Federal, por 8 votos a 2, de garantir a constitucionalidade da lei que permite ao Executivo reajustar o salário mínimo baseado em critérios previamente definidos e não mais a partir de valor fixado anualmente pelo Congresso, é de especial relevância se examinada pela ótica política do equilíbrio de poder entre os Poderes.
Aspecto, aliás, ressaltado pelos dois ministros que deram votos vencidos, Marco Aurélio Mello e Carlos Ayres Britto.
O STF livrou o governo do desgaste anual de enfrentar o debate no Legislativo, o que era exatamente o intuito da proposta apresentada pelo Planalto, aprovada no Parlamento e contestada na Justiça pela oposição.
O Judiciário seguiu tecnicamente a lei. Nem sempre o faz, mas não se pode criticá-lo por fazê-lo. Cumpre apontar, porém, a consequência: a obstrução do debate e a redução da já decrescente participação do Poder Legislativo nas questões de interesse nacional.
A fixação do mínimo dará menos trabalho a partir de agora, será meramente técnica, levando em conta a inflação acumulada segundo o Índice Nacional de Preços ao Consumidor e a variação do Produto Interno Bruto nos dois anos anteriores.
A discussão política perde espaço. Mas o governo também fica refém dos números, independentemente do fato de a situação no ano suportar ou não o reajuste no montante previsto.
O dano maior, entretanto, é a criação de mais um fator de distanciamento do Congresso em relação aos temas que importam ao público.
Essa lei reforça a constatação do estudo feito por José Álvaro Moisés, no núcleo de políticas públicas da USP, sobre o desempenho do Congresso entre 2009 e 2010:85% da agenda do Legislativo é dominada pelo Executivo.
Os parlamentares poderão concluir por si o quanto perdem em importância - em boa medida por cessão voluntária de poder - para o Palácio do Planalto nesta terça-feira, quando a pesquisa será apresentada no Congresso.
Foi uma decisão boa para o Executivo, mas ruim para o sistema representativo.
Mãos dadas. Márcio Moreira Alves usava uma expressão que irritava muito o PMDB. Referia-se à "moral homogênea" para definir o compartilhamento de interesses fisiológicos entre a cúpula do partido.
Diante da decisão do Conselho de Ética da Assembleia Legislativa de São Paulo de arquivar sem investigar o caso da venda de emendas denunciado pelo deputado Roque Barbiere pode-se concluir que existe uma "moral homogênea" em vigor nos órgãos ditos de controle ético nos âmbitos federal e estadual.
Assim como a maioria governista de inspiração petista faz no Congresso, a maioria governista de inspiração tucana obstrui a função fiscalizadora da Assembleia em São Paulo.
Mesma medida. Na essência, não há diferença entre as situações do ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda e do atual, Agnelo Queiroz, cujo afastamento está sendo pedido pelo DEM, ex-partido de Arruda.
No caso do ex, havia um vídeo. Sobre Agnelo há gravações feitas pela Polícia Civil de onde, aliás, foram agora demitidos 57 delegados-chefes e 7 diretores.
O PT, partido do governador do DF, precisará caprichar nos eufemismos se resolver defender seu correligionário depois de ter capitaneado o processo que acabou levando ao afastamento definitivo de Arruda.
João sem braço. Se havia alguma dúvida de que a indicação de João Paulo Cunha para a presidência da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara era um gesto estratégico do PT, não há mais, desde que um projeto de anistia para a cassação de José Dirceu apareceu na pauta da CCJ.
Revelado o fato, Cunha mandou retirar a proposta fazendo-se de desentendido a respeito do que sempre esteve muito bem entendido com o colega Dirceu. Como o presidente da Comissão, note-se, de Constituição e Justiça, réu no processo do mensalão.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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