• Muitas das decisões de Dilma parecem não ter levado em conta as consequências políticas
- Correio Braziliense
Peter Drucker é quase uma lenda. Misto de guru da administração pública e ícone do mundo dos negócios, criou conceitos que revolucionaram a gestão de empresas e influenciaram a administração pública moderna. Para ele, a coisa mais importante em uma organização são as pessoas.
Comprometimento é uma palavra-chave. Segundo ele, “uma decisão só se torna eficaz quando os comprometimentos com a ação são incluídos na decisão desde o início”. Uma avaliação dos primeiros 100 dias do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff poderia ter como explicação para o fracasso a falta de comprometimento dos parceiros com as suas decisões.
Por exemplo, Dilma não teve o menor compromisso com o discurso e as promessas de sua campanha eleitoral. No jargão político da oposição, o nome disso é “estelionato eleitoral”.
Aumento dos combustíveis, tarifaço de energia elétrica, desemprego, juros elevados, aumento de impostos e corte nos direitos trabalhistas são, hoje, bandeiras da oposição contra o governo. Na campanha eleitoral, porém, foram apresentadas por Dilma como propostas dos adversários.
Não é à toa que o senador Aécio Neves (PSDB-MG), derrotado nas urnas na disputa ao Planalto, aparece hoje nas pesquisas de opinião com muito mais prestígio do que a presidente da República.
Imperial, monocrática e voluntarista, a presidente da República colheu, em três meses e alguns dias, tudo o que plantou de errado ao longo dos quatro primeiros anos de governo. Isso foi agravado por decisões políticas intempestivas, de quem pensava que poderia tudo e deu com os burros n’água.
A agenda do Planalto, desde a posse no segundo mandato, é negativa, por mais que o palácio tente inverter o jogo com entrevistas diárias e atos administrativos. Dilma revelou dificuldades para lidar com a crise econômica e as pressões políticas. Governa contra contra a opinião pública.
A estratégia dela para o desenvolvimento do país, que chamou de “nova matriz econômica”, revelou-se um fracasso. Seu pior desempenho foi na área em que se dizia grande especialista: a energia.
O escândalo da Petrobras, devido à Operação Lava-Jato, pôs à beira do colapso a estratégia de restauração do capitalismo de Estado como modelo de desenvolvimento.
A nomeação de Joaquim Levy, um economista da Escola de Chicago, para ministro da Fazenda, com a missão de executar um ajuste fiscal monetarista, foi a saída para evitar o colapso da economia. O economista não só se tornou o principal fiador do governo perante os empresários como passou a negociar diretamente os termos do ajuste com os políticos.
Trapalhadas políticas
Muitas das decisões de Dilma parecem não ter levado em conta as consequências políticas, a começar pela montagem do seu estado-maior, formado pelos ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil), Miguel Rossetto (Secretaria-Geral da Presidência), Pepe Vargas (Relações Institucionais) e Thomas Traumann (Comunicação Social), que implodiu. Os dois últimos já nem são mais ministros. A intenção do grupo era minar a influência do PMDB no Congresso e reduzir a participação do aliado principal no governo. Deu tudo errado.
Os primeiros sinais do desastre foram a derrota de Arlindo Chinaglia (PT-SP) na disputa pela Presidência da Câmara. Eduardo Cunha (PMDB-RJ) impôs uma derrota acachapante ao governo e agora dá as cartas na agenda legislativa. A ambiguidade no apoio à reeleição de Renan Calheiros (PMDB-AL) também deixou sequelas, pois o Palácio do Planalto perdeu o controle da pauta do Senado.
Na verdade, Dilma fez uma aposta fracassada nos efeitos da Operação Lava-Jato no Congresso. Faltou noção de que o parlamento tem fuso horário diferente do Judiciário. Os políticos enrolados nas denúncias, entres eles os presidentes das duas Casas, sentiram-se acuados e foram para o tudo ou nada com governo. Já deixaram Dilma de joelhos.
Agora, depois de uma rocambolesca operação política para substituir o ministro das Relações Institucionais, Pepe Vargas, Dilma acabou por extinguir a pasta e entregar a condução política das relações do governo com os aliados ao vice-presidente Michel Temer, que é o presidente do PMDB e o sucessor legal dela em caso de impedimento.
Temer passou a ser tratado pelos políticos como uma espécie de primeiro-ministro. Ninguém sabe o que vai ocorrer daqui para a frente. A primeira missão dele é reacomodar os aliados nos segundo e terceiro escalões do governo e pacificar o PMDB. Nada garante, porém, que a disputa entre os peemedebistas e o PT arrefeça. Pelo contrário, os sinais exteriores são de que o conflito aumentará.
A escolha de Temer também não resolve o problema do governo com a opinião pública, porque o PMDB está tão desgastado quanto o PT. Pode estabilizar a situação no Congresso para garantir a aprovação do ajuste fiscal, porém não promove um reencontro com as ruas. Os políticos torcem para que as manifestações de hoje sejam menores do que as de 15 de março, que abalaram o país. Se mais gente for às ruas, a crise política se agravará.
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