domingo, 12 de abril de 2015

Míriam Leitão - Razão conhecida

- O Globo

Fatos concretos sustentam a mudança de humor do país. Chegamos neste domingo, 12 de abril, com uma coleção de razões para o descontentamento. Nada foi fabricado pela imprensa nem pela oposição. Não há conspirações nem conjuração dos astros contra o governo. Quase um milhão de pessoas entraram no time dos sem emprego, a inflação pulou para 8%, os juros subiram e os cintos foram apertados.

Se o brasileiro estivesse feliz com a conjuntura econômica é que seria estranho, porque o trimestre foi tenebroso: inflação, estagnação, juros e desemprego aumentando; contas públicas em colapso. O que fora negado foi diariamente confirmado durante os 100 primeiros dias de governo. O governo se desdisse o tempo todo. Quem votou na presidente se sentiu ludibriado pelas afirmações falsas da campanha; quem não votou tem sentido revolta ao ver a confirmação dos motivos do seu voto.

Não houve uma explicação sequer para uma mudança radical de curso para os seus eleitores. Quem estava contra o governo firmou convicções; quem era a favor não sabe o que pensar nem o que dizer a amigos e familiares. Esta foi uma eleição em que o ódio foi cultivado, principalmente pelos militantes oficiais. Famílias brigaram, amizades foram rompidas, divisões se aprofundaram. O governo teria que ter tido a noção de todo esse cenário, mas agravou contradições com as acusações contra supostos adversários.

Diariamente, durante 100 dias, o governo deu motivo de desgosto aos brasileiros. Houve uma sucessão de números recordes ou históricos. A pior inflação de março em 20 anos, o maior rombo fiscal desde 1997, o crescimento forte da dívida pública, o aumento exponencial dos preços da energia, novos impostos e muitas notícias sobre o propinoduto descoberto na Petrobras.

Há um ano, em fevereiro de 2014, o então deputado do PT e vice-presidente da Câmara André Vargas recebeu com o punho levantado o então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa. Era um protesto pelas prisões do ex-ministro José Dirceu e do ex-presidente do PT José Genoíno. Vargas mesmo disse que esse era um gesto símbolo do partido. No centésimo dia do segundo mandato, André Vargas foi para a prisão na 11a fase da Operação Lava-Jato.

Na quinta-feira, a imagem de roedores lançados no chão da CPI da Petrobras, enquanto o tesoureiro do PT falava, correu mundo e foi para as primeiras páginas dos jornais. Era simbólico e triste. Na CPI, com direito conquistado na Justiça de não falar a verdade, o tesoureiro e réu da Lava-Jato João Vaccari Neto fez um depoimento incoerente. Admitiu que foi se encontrar com Alberto Yousseff, o doleiro preso no escândalo. Perguntado sobre o motivo da sua ida, deu uma resposta inusitada: “Essa dúvida eu também tenho”. O tesoureiro do PT não sabe por que vai aonde vai. Tudo assim muito duvidoso neste começo de mandato.

A presidente Dilma disse que a Petrobras “deu a volta por cima” e “limpou o que tinha de limpar”. Mas a estatal não divulgou balanço auditado ainda, foi rebaixada, e está em meio a uma saraivada de ações nos tribunais internacionais, de investidores públicos e privados que investiram na empresa e perderam recursos por causa da corrupção. Ela se colocou em vários momentos como a defensora da Petrobras contra os que a atacam, numa inversão dos fatos que irrita qualquer pessoa bem informada. O governo e seus aliados atacaram a Petrobras. Quem a defende é o Ministério Público, a Justiça e Polícia Federal no Paraná.

A inflação incomoda e irrita os consumidores. Essa é a boa herança que o país preservou do processo de estabilização da economia. Depois de meio século sendo leniente com o processo inflacionário e tendo visto o extremo a que pode chegar esse mal insidioso, o brasileiro decidiu há 20 anos não tolerar inflação alta.

Esta escalada dos preços foi contratada pelo governo no mandato anterior com seus erros, suas postergações de reajustes, suas manobras. E 8% é além da conta, além do teto da meta, mais do que o brasileiro está disposto a suportar. Sem dúvida, esse é um dos motivos da queda abrupta do apoio à presidente Dilma. Tudo o que sustenta a rejeição à presidente é fato. É tudo verdade.

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