• É mais fácil Dilma voltar interditada que eleições gerais
- Valor Econômico
Fundamental para a aceitação do pedido de impeachment na Câmara, o deputado Eduardo Cunha será peça-chave também no governo de Michel Temer. Ele é considerado mesmo indispensável para os primeiros 30, 60 dias - o período concedido ao vice para convencer o país de que as medidas que vai adotar estão no caminho certo.
A política é o campo no qual Temer tem predominância muito grande. O vice é um dos teóricos da governabilidade. De saída, ele leva outra vantagem: ninguém vota o impeachment para ficar contra o novo governo. Mas o vice terá que ser rápido, adotar logo as medidas de que precisa e projetar segurança, segundo o PMDB.
As primeiras medidas são esperadas para o dia 13, se o afastamento de Dilma for confirmado em 11 de maio, conforme previsto. Nem Cunha, com toda sua força, terá como ficar contra, neste primeiro momento. Desvinculação de receitas da União e a regulamentação dos decretos expedidos por Dilma para cobrir o déficit estão entre as prioridades no Congresso.
O virtual ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, não tem direito ao erro e nem pode repetir o ministro Joaquim Levy com medidas que não resolvem nada. Não há tempo para discussões exóticas como a independência do Banco Central, assunto para ser discutido num quadro de estabilidade, o que não é o caso.
Temer quer combater o desemprego imediatamente. Não há como esperar a volta do crescimento. Será uma saída à moda Lula, com incentivos a um setor ou setores da economia. Não está claro se a indústria automobilística é um desses segmentos.
A venda de ativos também é prioridade, por mais que o preço das estatais esteja praticamente no chão. Correios e Infraero registraram prejuízos recordes em 2015. Mas se o governo não tiver como investir, entende-se no PMDB que a situação ficará pior mais à frente.
A atual conjuntura mundial não dá esperança para o governo tentar resolver a situação do país com ajuda externa. O Brasil terá que sair da crise, sobretudo, com boas decisões internas.
E tudo passa pela Câmara. Cunha foi quem juntou o centrão e levou os partidos a negociar com o governo que ia entrar e que estava disposto a dar o mesmo que o governo marcado para sair. Na mira do Ministério Público Federal, do STF e da neo-oposição, o deputado mantém ascendência sobre um grande grupo na Câmara. Provou isso na sua eleição, em fevereiro de 2015, e agora no impeachment.
Sob sua vigilância, PP, PSD e PR se acertaram antecipadamente: iriam juntos para Dilma ou para o impeachment. Foram esses três partidos que disseram a Dilma que só iriam para o ministério depois da votação e não o contrário. O governo aceitou seus termos. Os partidos ganharam tempo para avaliar corretamente os riscos.
No governo Temer, dois partidos devem diminuir na Esplanada dos Ministérios: o PT, que saiu derrotado, e o PMDB, que entrou no impeachment com sete ministérios e nenhum poder de decisão no governo.
Além dos nomes da copa e cozinha do Planalto (Eliseu Padilha e Geddel Vieira Lima), Temer deve abrir espaço para o PMDB do Senado. O ministro Eduardo Braga (Minas e Energia) pode ficar, se não for para o governo do Amazonas por força de uma decisão da Justiça Eleitoral. O senador Jader Barbalho deve ter um upgrade no ministério.
Braga e Barbalho estiveram do lado contrário de Temer - o senador do Pará contribuiu com três dos sete votos que Dilma teve na bancada do PMDB. Promover o filho de Jader a um ministério mais forte e manter Braga seria "um gesto de grandeza política" de Temer, por entender as razões que os levaram a ficar contra na Câmara, mas também que serão decisivos na votação do Senado. Tropa de choque do governo, a senadora Katia Abreu (TO) não ficará com nada.
Cunha hoje exerce ampla influência no PP, PR e parte do PSD da Câmara, sem falar da bancada evangélica. O PR deve ficar com o Ministério dos Transportes, com o deputado alagoano Maurício Quintella, que pouco antes da votação renunciou à função de líder da bancada para dizer "sim" ao impeachment. É da cota de Cunha no ministério.
O PP quer o Ministério da Saúde para o deputado Ricardo Barros (PR) e manter o da Integração Nacional, onde estava Gilberto Occhi. Quer também a Caixa Econômica Federal, a Codevasf e ampliar sua influência no Dnocs. O ideal para Temer seria contar com a Saúde para outro aliado e deixar com Barros, talvez, o Ministério da Agricultura, que é pedido pelo PRB, outro partido na órbita de Cunha. Até agora, o PP não abriu mão.
O DEM ficou numa situação peculiar: também quer dois ministérios, está com o a pasta da Educação praticamente assegurada, mas tem o compromisso público de votar contra Eduardo Cunha no processo de cassação do deputado carioca que corre na Câmara. A tendência é que arrefeça essa posição.
O PSDB decidiu deixar longe do país um dos quadros que mais se empenhou no impeachment, o senador José Serra. Ele ficará no Itamaraty, pois não podia ser ministro da Fazenda contra a vontade de Geraldo Alckmin, governador de São Paulo, e de Aécio Neves, presidente do PSDB.
Tendo votado o impeachment de Dilma, o PSDB não tinha como ficar de fora do novo governo. Mas agora, além de Serra, quer acomodar também Alckmin e Aécio no ministério. Com três do PSDB, dois do DEM e um do PPS (o deputado Raul Jungmann é cotado para a Defesa), a oposição ficaria, no governo Temer, quase do tamanho do PT no fim do governo Dilma.
O tabuleiro de Temer no Congresso está sendo montado por quem é do ofício, mas não há garantia de estabilidade de médio e longo prazos. O vice terá que mostrar resultados no exercício da Presidência. O afastamento de Dilma está consolidado. A lei política é essa. Mas a votação do mérito é uma questão aberta.
Se o governo Temer entrar em colapso, é mais fácil Dilma voltar com um primeiro-ministro a tiracolo que os políticos acertarem um projeto de eleições gerais em outubro, como acena o Palácio do Planalto.
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