- O Globo
Pouco mais de cinco meses depois de ter provocado indiretamente a saída de Eduardo Cunha da presidência da Câmara, uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) a ser julgada pelo plenário do Supremo Tribunal Federal na próxima semana ameaça outro presidente, desta vez o do Senado, Renan Calheiros.
No caso de Cunha, a ADPF impetrada pela Rede foi uma das razões para o ministro Teori Zavascki determinar a saída dele da presidência da Câmara dos Deputados. Agora, o STF vai analisar o mérito da questão, que advoga que um político que é réu não pode ocupar cargos que o coloquem como substituto da Presidência da República.
Uma suposta “linha sucessória” não existe, pois há apenas um sucessor legal do presidente brasileiro, que é seu vice, que o substitui em eventualidades, ou sucede a ele em caso de vacância permanente, por doença, morte ou impeachment.
Os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Renan Calheiros, assim como a presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, portanto, não fazem parte da linha sucessória, mas substituem o presidente por um período de no máximo 90 dias, para convocar eleições.
Do ponto de vista constitucional, portanto, Michel Temer não tem vice-presidente, assim como Itamar Franco e Sarney não tiveram, mas o partido Rede defende que um réu não pode substituir o presidente da República, mesmo em caráter provisório.
Não há como o senador Renan Calheiros alegar que o assunto só foi colocado em pauta para atingi-lo, depois da desavença que ele liderou entre o Senado e o Judiciário. Mas, como em política não há coincidências, a análise do mérito de assunto tão momentoso faz com que ele fique inquieto, mesmo que ainda não seja réu em nenhum processo.
A coincidência de a ADPF ter entrado em pauta no período em que o primeiro dos vários processos contra Renan foi liberado pelo ministro Edson Fachin para julgamento, depois de dez anos, também deve estar incomodando o presidente do Senado, cujo mandato termina em fevereiro do próximo ano.
Como não tem mais direito a disputar novo mandato, Renan Calheiros pode se safar de se tornar réu antes do fim do seu mandato, e não deveria estar tão preocupado assim. Mas a disputa com a presidente do STF parece ter dominado a estratégia geralmente calculista de Renan, que, caso se torne réu pela acusação de receber propina para pagar a pensão alimentícia à mãe de um filho que teve fora do casamento, pode ter que deixar a presidência do Senado pelo mesmo motivo dez anos depois.
Em 2007, ele fez um acordo e renunciou à presidência do Senado para não ser cassado pelo Conselho de Ética. Renan, por sinal, está sendo vítima da mesma estratégia que utilizou para se opor à Operação Lava-Jato. Ele desengavetou um projeto de lei para combater o abuso de autoridade justamente neste momento em que as investigações chegam aos parlamentares. Mas alegou que ele estava na fila para ser votado, sem ter nada a ver com o momento presente.
Da mesma maneira, o mérito da ADPF da Rede já estava pronto para ser julgado, mesmo porque a pauta do Supremo não é organizada da noite para o dia. Pode ter sido uma infeliz coincidência, mas Renan Calheiros, como político experiente, sabe que coincidências não existem. Se, porém, como disse Albert Eisntein, “coincidência é a maneira que Deus encontrou para permanecer no anonimato”, o senador Renan Calheiros pode estar prestes a ser punido por seus atos.
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