- Valor Econômico
PT tem pouco tempo para viabilizar Haddad presidente
A menos que sofra uma violenta queda nas intenções de voto, o deputado Jair Bolsonaro é o cara a ser batido nas eleições presidenciais. Há precedentes de reversão rápida de expectativa, sendo o mais próximo o de Marina Silva (Rede Sustentabilidade), que em 48 horas perdeu o lugar no segundo turno para o senador Aécio Neves (PSDB), o que parecia assegurado, após sofrer intensa campanha negativa movida pelo PT na propaganda oficial, em 2014.
Ainda na noite do sábado que antecedeu a eleição, Marina teve uma reunião com o então presidente do PSB, Roberto Amaral, para tratar de providências para o segundo turno. Os dois foram dormir certos de permanecer na campanha e disputar com a ex-presidente Dilma Rousseff a principal cadeira do Palácio do Planalto, mas acordaram no dia seguinte com Aécio Neves com o pé na porta.
Sem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na disputa, só uma campanha semelhante de desconstrução - e com o mesmo sucesso - pode ameaçar a posição de Bolsonaro. Os próximos sete, dez dias dirão sobre a eficácia dos petardos dirigidos contra o candidato do PSL, principalmente do aspirante do PSDB, Geraldo Alckmin. Mas o navio de Bolsonaro, aparentemente, segue sem grandes danos estruturais no casco. Nesse ritmo, a disputa de 7 de outubro é pela segunda vaga.
Quem vai, Marina, que hoje ocupa a segunda colocação, Alckmin, que ainda não decolou, Ciro Gomes (PDT), que ficou isolado ou Fernando Haddad, o ex-prefeito de São Paulo, com total apoio de Lula? Em geral os analistas têm afirmado que Lula terá capacidade de transferência de votos suficiente para colocar Haddad no segundo turno. Logo o próximo presidente sairia de uma disputa entre Bolsonaro e Haddad. Há controvérsia.
O professor David Fleischer, da Universidade de Brasília (UnB), vê mais obstáculos à frente de Haddad do que de Marina Silva e Geraldo Alckmin. Entre a última sexta-feira e o início desta semana foi possível perceber o motivo das dúvidas do professor: a campanha de Haddad com Lula é uma coisa e sem Lula é outra inteiramente diferente.
Como a sessão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que cassou o registro da candidatura Lula terminou tarde da noite, já na madrugada de quinta-feira para sexta-feira, o programa do PT e algumas inserções ainda tiveram uma forte presença do ex-presidente - menos em São Paulo, onde o Tribunal Regional Eleitoral acabou com a festa e impediu a vinculação do programa do candidato petista ao governo, Luiz Marinho, tendo Lula como cabo eleitoral.
As pesquisas de intenção de votos que mostram Haddad com 12%, 14% na largada partem do pressuposto do total apoio de Lula, que não estará disponível, ao ex-prefeito. Ou seja, mostram o "Andrade", como o vice na chapa do PT estaria sendo chamado no Nordeste, e não o Haddad, que sem a cobertura de Lula patina na mesma faixa de um dígito que Alckmin e Ciro, nas pesquisas eleitorais.
Em 2014 Lula empenhou todo seu prestígio e os recursos do PT na campanha de Dilma Rousseff, mas não conseguiu evitar o segundo turno e Dilma ganhou com estreita margem de diferença. É provável que Lula seja hoje um cabo eleitoral menos eficiente do que pode ser em 2014, a menos que a vitimização patrocinada pelo PT tenha efetivamente transformado o ex-presidente num mártir, o que ainda carece de comprovação.
O que deve reduzir o impacto do apoio de Lula é o seu banimento da telinha e das ondas do rádio, determinados pela Justiça Eleitoral. Em resumo, não pode ter comercial com Lula apoiando Haddad. Está proibido pelo TSE, decisão que vem sendo cumprida com rigor por seus ministros. Já nesta segunda-feira o ministro Luiz Salomão determinou que o PT suspenda a veiculação no horário eleitoral de uma peça para o rádio que apresenta Lula como candidato a presidente. Multa de R$ 500 mil em caso de descumprimento.
Esse era o dilema ontem enfrentado pelo PT. As cabeças mais frias do partido argumentavam pela decisão imediata da substituição do candidato, a fim de dar tempo para que Haddad possa desencadear uma ofensiva de cinco semanas para tentar se fazer conhecido e escapar da faixa dos candidatos com um dígito.
Esses lembram que o partido perdeu fragorosamente a eleição municipal de 2016, o que sempre tem influência na eleição presidencial, dois anos mais tarde. Se perder com Haddad, o PT precisa ao menos sobreviver com uma bancada de média para grande no Congresso, para poder garantir recursos para as eleições seguintes de 2020 e 2022. Essa turma tem pressa. E duvida, mesmo quando as pesquisas informam que o PT é um partido com 24% das preferências do eleitorado, léguas à frente do segundo colocado.
Adiar seria o suicídio político. Esperar até o dia 11, prazo estipulado pelo TSE, para substituir Lula por Haddad deixaria o candidato com apenas três semanas de campanha. Se já parecia difícil, ficaria pior. Ou como diz Fleischer: o PT está naquela situação de que se correr o bicho pega, se ficar o bicho come. Os radicais do partido, que têm prevalecido na discussão, ainda não se conformaram em por fim à vitimização de Lula. Querem um mártir. Os mais sensatos queriam uma decisão ontem mesmo.
Resta saber como os outros candidatos vão tirar proveito dessa situação do PT. Alckmin segue na linha de tirar o máximo de votos possíveis de Bolsonaro. Há dúvida sobre se é a melhor estratégia. Ao redor do candidato já há quem defenda que ele deve partir logo para uma disputa do voto útil tendo como alvo não Bolsonaro, mas Marina Silva, hoje uma ameaça real à passagem do tucano para o segundo turno, se der certo a aposta de Alckmin no horário eleitoral para deixar a segunda divisão dos candidatos.
As pesquisas até agora mostraram que quem tira mais votos de Lula é Marina Silva. A candidata do Rede Sustentabilidade sobe de 8% para 16%, na disputa sem Lula. Difícil dizer se essa é a tendência que vai vingar. Mas é certo que a manutenção de Lula, a partir de agora, só prejudica o candidato do PT.
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