quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

Diploma de populista: Editorial | Folha de S. Paulo

Teste para tese de Bolsonaro sobre intermediação seria questioná-lo pelas redes sociais

Até proferir a frase que ofuscaria as demais, Jair Bolsonaro (PSL) fazia um discurso razoável na cerimônia de sua diplomação.

O presidente eleito prometeu governar em benefício de todos os 210 milhões de brasileiros, “sem distinção de origem social, raça, sexo, cor, idade ou religião”. Pediu ainda a confiança da parcela do eleitorado que não o apoiou —quase a metade dos votantes, se considerados também os que marcaram nulo ou em branco.

Obviedades protocolares, talvez, mas ainda assim relevantes em se tratando de quem, na campanha, ameaçava com cadeia os concorrentes diretos e falou em “fuzilar a petralhada”. Isso para nem recordar a coleção de declarações preconceituosas e ofensivas ao longo de sua carreira política.

Tampouco deixou de ser algum avanço o elogio ao trabalho da Justiça Eleitoral e o reconhecimento da lisura do pleito. “Nosso compromisso com a soberania do voto popular é inquebrantável.”

Declarações mais fáceis de fazer, sem dúvida, na condição de vencedor da disputa. Antes desse desfecho, o então presidenciável do PSL lançava acusações infundadas, obscurantistas e irresponsáveis acerca de fraudes nas urnas eletrônicas.

O Bolsonaro de palanque acabaria por surgir, de modo um tanto abrupto, no pronunciamento que em geral se pautava por sensatez e conciliação. “O poder popular não precisa mais de intermediação”, proclamou o diplomado.

Tomada por si só, a afirmação é a própria essência do populismo —o líder carismático pretende falar em nome da vontade popular, quando não encarná-la, a tomar limites institucionais como obstáculos aos anseios que representa.

Observado o contexto, nota-se que o eleito investe, de forma oblíqua, contra o jornalismo profissional. “As novas tecnologias”, diz, “permitiram uma relação direta entre o eleitor e seus representantes”.

Em outras palavras, ele postula que o mandatário pode se entender a qualquer momento com o público por meio de suas redes sociais. O recurso dispensaria, no limite da interpretação, ritos como a concessão de entrevistas ou a participação em debates.

Um teste prático para essa tese seria um cidadão questionar o futuro chefe do Executivo, via Twitter ou Facebook, sobre a movimentação milionária detectada na conta de um assessor de seu filho deputado estadual —e, se chegar a conseguir uma resposta, demandar esclarecimentos adicionais.

A mesma cerimônia proporcionou um contraponto à fala de Bolsonaro. “Democracia”, disse a presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Rosa Weber, “não se resume à escolha periódica, por voto secreto e livre, de governantes”.

Arroubos populistas não são novidade no panorama político nacional, no mais das vezes em forma de retórica vazia. Freios e contrapesos democráticos, bem como a vigilância da imprensa independente, têm bastado para disciplinar os poderes dos governantes.

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