- Folha de S. Paulo
Flávio e Jair Bolsonaro foram, no passado, defensores de milícias e esquadrões da morte
Conforme brilhantemente mostrado por Celso Rocha de Barros em sua coluna desta segunda (28), Fabrício Queiroz —ex-assessor de Flávio Bolsonaro— parece afundado até o pescoço em sua relação com a milícia de Rio das Pedras. Com as informações disponíveis hoje, contudo, não dá para estabelecer um vínculo concreto entre a família Bolsonaro e alguma milícia carioca.
No plano ideológico, no entanto, a ligação é direta: não só Flávio, como também Jair Bolsonaro foram, no passado, defensores de milícias e esquadrões da morte.
Em 2003, em discurso na tribuna da Câmara sobre a atuação de um grupo de extermínio na Bahia, o então deputado Jair Bolsonaro opinou: “Enquanto o Estado não tiver coragem de adotar a pena de morte, o crime de extermínio, no meu entender, será muito bem-vindo. Se não houver espaço para ele na Bahia, pode ir para o Rio de Janeiro. Se depender de mim, terão todo o meu apoio.”
Em 2008, novamente na Câmara, defendeu a instituição da milícia. “Querem atacar o miliciano, que passou a ser o símbolo da maldade e pior do que os traficantes. Existe miliciano que não tem nada a ver com gatonet, com venda de gás. Como ele ganha R$ 850 por mês, que é quanto ganha um soldado da PM ou do bombeiro, e tem a sua própria arma, ele organiza a segurança na sua comunidade.”
Ou seja, a possível objeção de Bolsonaro às milícias era às atividades paralelas por elas desempenhadas, como o gatonet (provavelmente necessárias a seu sustento), e não à sua essência: o uso ilegal da violência para supostamente combater o crime.
Em meio a infinitas discussões sobre o papel do Estado, todos —salvo anarquistas— concordam com uma atribuição fundamental: deter o monopólio do uso da violência dentro de seu território, e com ele garantir a lei e a ordem. Como em tantas outras, o Estado brasileiro vem falhando miseravelmente nisso. A violência aumenta sem parar e o Estado não dá mostras de conseguir combater efetivamente os criminosos e nem de impedir sua organização.
Na ausência do Estado de Direito, formam-se grupos armados para manter a segurança, que adotam as mesmas práticas dos criminosos que dizem combater. No caso das milícias, reproduzem a violência mais desumana dos atos mais corruptos da polícia como forma de garantir a ordem dentro de um território. São os expedientes que já conhecemos: extorsão, execução, chacina.
O apoio pregresso dos Bolsonaro às milícias casa bem com as bandeiras específicas que trazem para a segurança pública. A primeira é armar a população e permitir o porte de arma generalizado, terceirizando o combate ao crime. A segunda é o salvo-conduto para que policiais não sejam responsabilizados caso matem inocentes. Em ambos os casos, é o arbítrio (e os interesses? Os preconceitos?) armado que solucionará o crime nas ruas. Fortalecem-se as milícias, abole-se a lei.
Em entrevista ao Roda Viva no ano passado, Bolsonaro foi perguntado acerca do assalto que sofrera em 1995. Ele armado, foi rendido e teve sua moto e sua arma roubadas, uma situação que não se deseja a ninguém. Na resposta, Bolsonaro soltou ainda um comentário enigmático: algum tempo depois do crime, o chefe do tráfico na favela em que sua moto fora encontrada, Jorge Luís dos Santos, morreu.
Não só o traficante morreu num misterioso suicídio por enforcamento na prisão, como sua mãe e sua esposa foram encontradas mortas. Tudo para proteger o cidadão de bem. Será esse o novo modelo de “justiça” que a revolução ética do novo governo propõe?
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