quarta-feira, 17 de julho de 2019

Bernardo Mello Franco: O pedestal de Moro

- O Globo

Moro se diz vítima de uma “campanha contra a Lava-Jato e a favor da corrupção”. Mas a operação não se limita à figura dele, e apontar excessos não significa defender a impunidade

Sergio Moro saiu de férias, mas não saiu de cena. Diante de um novo lote de vazamentos, o ministro imitou o chefe e foi ao Twitter. Mais uma vez, ignorou a mensagem e atacou o mensageiro. “Sou grande defensor da liberdade de imprensa, mas essa campanha contra a Lava-Jato e a favor da corrupção está beirando o ridículo”, escreveu.

O ex-juiz cometeu duas impropriedades na mesma frase. Na primeira, indicou que a sua fé na liberdade de imprensa não é tão desinteressada assim. Quando a notícia não o favorece, o jornalismo deixa de merecer sua defesa.

Na segunda, Moro tentou desqualificar as reportagens como uma “campanha contra a Lava-Jato e a favor da corrupção”. É um argumento duplamente falso. A operação não se limita à figura do juiz, e apontar excessos em investigações não significa defender a impunidade dos investigados.

Desde que os diálogos começaram a vir à tona, o ministro já adotou ao menos três estratégias diferentes. Inicialmente, disse que o único “fato grave” seria a invasão dos celulares de procuradores. O discurso só convence quem não quer ler o conteúdo dos chats.

Em seguida, Moro passou a sugerir que as mensagens seriam falsas ou adulteradas. A conversa caiu por terra quando ele se desculpou por ter chamado os os militantes do MBL de “tontos”, em bate-papo com o procurador Deltan Dallagnol.

Agora o ex-juiz tenta vender uma tese conspiratória. A se acreditar no tuíte de ontem, imprensa e oposição teriam se associado num complô contra a Lava-Jato. É um discurso enganoso, semelhante ao de políticos que ele condenou.

Retratado em atos governistas como um Super-Homem, Moro parece ter se convencido de que está acima dos mortais. Do alto de seu pedestal, ele não teria que se submeter a cobranças e questionamentos como qualquer agente público.
Quem ousar criticá-lo deve ser queimado na fogueira dos hereges.

A favor do ex-juiz, diga-se que ele não está sozinho. Ontem Jair Bolsonaro adotou o mesmo tom ao defender a indicação de seu filho Eduardo para o cargo de embaixador do Brasil em Washington. “Se está sendo criticado pela mídia, é sinal de que é a pessoa adequada”, afirmou.

Quando faltam argumentos, o presidente e o ministro atacam os culpados de sempre.

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