quinta-feira, 31 de outubro de 2019

Bernardo Mello Franco - Sobrou para o porteiro

- O Globo

Em 24 horas, o porteiro do condomínio de Bolsonaro passou de testemunha-chave a vilão. Ninguém explicou por que ele inventaria uma trama contra o presidente

Depois de quase 600 dias, as autoridades encontraram um culpa dopara ocaso Marielle. É o porteiro do condomínio Vivendas da Barra, domicílio do presidente Jair Bolsonaro, de seu filho Carlos e do ex-PM Ronnie L essa, preso sob acusação de matara vereadora.

Na noite de terça, o Jornal Nacional revelou o teor dos depoimentos do porteiro à polícia. Ele disse que Élcio Queiroz, outro ex-PM envolvido no caso, esteve lá no dia do crime e informou que iria à casa de Bolsonaro. Segundo o relato, a entrada foi autorizada pelo “Seu Jair”.

O testemunho coincidiu com o livro do condomínio, onde o porteiro anotou a visita à casa 58. O JN apontou uma contradição: Bolsonaro não poderia estar no local. Meia hora depois da entrada do ex-PM, ele registrou presença no plenário da Câmara, em Brasília.

O presidente reagiu à reportagem com fúria. Direto da Arábia Saudita, atacou violentamente a TV Globo e o governador Wilson Witzel. Ele ameaçou não renovara concessão da emissora, fórmula usada por Hugo Chá vez par acalar o jornalismo independente na Venezuela.

“O que parece é que o porteiro mentiu, ou induziram o porteiro acomete rum falso testemunho”, sentenciou.

Exaltado, ele chamou os jornalistas de “patifes” e “canalhas”. Depois afirmou que eles deveriam ser investigados, em mais um ataque à liberdade de imprensa.

Ontem o presidente disse ter mandado a Polícia Federal tomar um novo depoimento do porteiro. O ministro Sergio Moro reforçou a pressão e ameaçou enquadrá-lo em três tipos penais: obstrução à Justiça, falso testemunho e denunciação caluniosa. O novo procurador-geral da República, Augusto Aras, também desqualificou o funcionário do condomínio. Aproveitou para arquivar a citação a Bolsonaro, que o nomeou há um mês.

No Rio, a promotora Simone Sibilio se juntou ao coro. Ela apresentou uma gravação de áudio para sustentar que Queiroz foi à casa de Lessa, não à de Bolsonaro. “Todas as pessoas que prestam falso testemunho podem ser processadas”, emendou.

O porteiro terminou o dia como vilão, mas ninguém explicou por que ele inventaria toda essa trama para atingir o presidente.

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