A pergunta do GLOBO foi pertinente. A agressão de Bolsonaro não é resposta
Bolsonaro voltou no domingo a ser o que é. Depois de dois meses cumprindo a liturgia do cargo, agrediu um repórter do GLOBO ao ser questionado, dentro das estritas prerrogativas e da missão do jornalismo profissional, sobre um assunto de interesse público — a razão de a primeira-dama Michelle ter recebido, do casal Fabrício Queiroz e Márcia Aguiar, cheques num total de R$ 89 mil.
O presidente reagiu com palavras dignas daquele personagem do “Casseta & Planeta”, o Maçaranduba, que queria resolver tudo “na porrada”. Os ares de valentão ginasiano podem pegar bem com o extremista que faz o gesto de arminha com a mão. Mas voltar a agredir a imprensa cobra um preço alto nas faixas da classe média e do eleitorado mais instruído, que voltaram a dar apoio a Bolsonaro, não por coincidência nestes pouco mais de dois meses em que mudou de tom.
A onda de críticas que recebeu nas redes sociais — uma enxurrada de perguntas sobre a razão de R$ 89 mil terem sido depositados em favor de Michelle — confirma que Bolsonaro erra ao deixar emergir sua face autoritária, incapaz de entender que, numa democracia, é papel da imprensa fazer perguntas incômodas. É hora de ele compreender que parcela relevante da sociedade não aceita esse tipo de postura. Se não quer ou não sabe responder, que se cale. É inadmissível agredir um repórter que faz seu trabalho.
Das perguntas incômodas, a dos cheques de Michelle é apenas um dos mistérios que pairam sobre a conexão entre o ex-PM Queiroz e o clã Bolsonaro. O Ministério Público fluminense ainda investiga o papel de Queiroz no esquema que é acusado de gerenciar no gabinete do ainda deputado estadual Flávio Bolsonaro na Alerj.
A investigação já identificou o repasse de R$ 2 milhões de assessores de Flávio a Queiroz, forte evidência do esquema em que pessoas de confiança são nomeadas em gabinetes de parlamentares para devolver parte do que recebem, a “rachadinha”. A presença de parentes de Queiroz e dos Bolsonaros no caso reforça as suspeitas. O intenso tráfego de dinheiro vivo na vida de Flávio completa o enredo.
Antes de tomar posse, Bolsonaro teve de responder sobre depósitos de R$ 24 mil feitos por Queiroz na conta de Michelle. Explicou que se tratava de parte do pagamento de um empréstimo, no valor total de R$ 40 mil. Podia fazer sentido na ocasião. Agora se descobre que os depósitos para Michelle somaram mais que o dobro disso — sem registro de transferência de Bolsonaro a Queiroz. O presidente continuou ontem a agredir a imprensa. Mas ainda não respondeu à pergunta do GLOBO: por que sua mulher, Michelle, recebeu R$ 89 mil do Queiroz?
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